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O que é um Metrobus e o que está prometido para Lisboa, Oeiras, Amadora e Loures?

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Um “metro com rodas”. Foi assim que Carlos Moedas o descreveu num debate televisivo, mas, na verdade, o que é um Metrobus? É apenas um metro com rodas? E que promessas estão a ser feitas para Lisboa, Oeiras, Amadora e Loures?

Metrobus em funcionamento em Coimbra (fotografia LPP)

O meme saiu directamente de um debate televisivo, protagonizado por Alexandra Leitão e Carlos Moedas, candidatos à presidência da Câmara de Lisboa. Leitão pediu a Moedas para esclarecer o termo “metrobus”:

— Carlos Moedas, diga às pessoas o que é um metrobus.
— É uma via segregada…
— Diga o que é.
— O metrobus é um metro ligeiro com rodas.
— Um metro com rodas?… (tom irónico) É um autocarro! O termo do “metrobus” é mesmo para enganar as pessoas.

Um “metro com rodas”?

O Metrobus é um sistema semelhante ao metro ligeiro de superfície, mas, em vez de eléctricos em carris, temos autocarros articulados (e eléctricos) a circular em vias segregadas do trânsito automóvel. Também conhecido como BRT (Bus Rapid Transit), resolve dois dos maiores problemas do transporte rodoviário colectivo: a lentidão que por vezes se verifica e a imprevisibilidade.

Ao operar em corredores exclusivos, com prioridade nos cruzamentos, ganha velocidade face ao automóvel. Além disso, faz menos paragens que um autocarro convencional, e essas paragens funcionam quase como estações de metro, com validadores de bilhetes e painéis digitais de informação.

The Promise & Danger of BRTs
The Bus vs Rail Debate is Stupid
The Absolute Best Transportation for Cities (trams)

O objectivo do Metrobus/BRT é combinar a flexibilidade do autocarro com a eficiência do metro, oferecendo viagens rápidas, frequentes e regulares. Em cidades onde foi implementado, este sistema ajudou a atrair novos passageiros para o transporte público. Mas esse eventual sucesso vai depender, no entanto, da qualidade da infraestrutura: se houver vias verdadeiramente exclusivas, prioridade nos semáforos e estações bem equipadas, o sistema consegue aproximar-se da experiência de um metro à superfície, mas a custos muito mais baixos.

Aliás, a questão do custo é uma das maiores vantagens do Metrobus. Pelo menos a curto prazo, um BRT é significativamente mais barato de implementar, já que pode aproveitar infraestruturas rodoviárias existentes, convertendo faixas de circulação automóvel em corredores exclusivos de transporte público (apesar de não ser isso que se tem feito em Portugal).

Também a aquisição de autocarros articulados representa um investimento inicial muito inferior ao de veículos de um metro ligeiro. No entanto, a longo prazo, o desgaste natural do pavimento rodoviário e a menor durabilidade dos autocarros face a veículos eléctricos (LRT) podem aumentar a fatura da opção pelo Metrobus.

Como funciona o Metrobus em Coimbra?

O Metro Mondego está em operação desde o Verão deste ano num percurso experimental, reduzido (fotografia LPP)

Em Lisboa, o Metrobus é tema recente mas, noutros municípios do país, há muito que é assunto de debate. É preciso ir a Coimbra para encontrar em funcionamento o primeiro Metrobus português.

Chama-se Metro Mondego e resulta de uma longa história, que podemos resumir desta forma: o comboio que ligava Coimbra à Lousã foi retirado em 2010, com a promessa de construção de um metro ligeiro de superfície; a obra chegou a avançar e alguns carris foram arrancados, mas ficou suspensa com a crise da Troika; milhões gastos depois e com uma população sem transporte, o Governo de António Costa decidiu retomar a ideia do Metro Mondego só que com autocarros. O sistema vai ter duas linhas e liga vários pontos de relevância da cidade de Coimbra como a universidade, o hospital e o estádio, mas também retomar uma ligação rápida entre Coimbra, Miranda do Corvo e Lousã.

Rede final do Metro Mondego (via MM)

Até ao final deste ano, o Metro Mondego está a circular num troço de cinco quilómetros entre a Portagem e o Vale das Flores, sendo gratuito. Tanto agora como no futuro, o Metrobus vai circular num canal completamente segregado e vai ter prioridade em todas intersecções, isto é, os semáforos fecham no vermelho para os restantes veículos para que o autocarro possa passar. Isso dá-lhe rapidez. As frequências são, por agora, de 15 em 15 minutos, e são cumpridas.

Os veículos são autocarros eléctricos articulados com as rodas semi-escondidas. O interior é semelhante ao de um autocarro mas existem mais apoios para as pessoas se segurarem. Os passageiros podem entrar por qualquer porta. Sendo veículos eléctricos, são muito silenciosos, o que tem impacto tanto durante a viagem como na cidade em si. Como são autocarros, soluçam um pouco – nada de mais, mas não é uma viagem com o conforto total da de um eléctrico. Há ar condicionado, portas USB e painéis digitais no interior dos autocarros; estes últimos indicam o trajecto e anunciam em viva voz a próxima paragem. Infelizmente, o transporte de bicicletas não é possível.

Estação de São José, em Coimbra (fotografia LPP)

A velocidade é constante e alterada de forma suave, ou seja, não existem acelerações ou travagens bruscas como as que podem existir num autocarro tradicional que circula na estrada com outros veículos. Neste campo, o autocarro assemelha-se a um metro de superfície. Onde também todo o Metro Mondego faz lembrar um verdadeiro metro é nas estações, onde existem painéis com indicação da passagem dos próximos Metrobus, validadores e máquinas para compra de bilhetes. As estações acompanham o traçado da antiga linha férrea, mas foram acrescentadas mais paragens do que as que existiam e introduzidos alguns desvios para aproximar o BRT das populações e de pontos de interesse.

O Metrobus de Coimbra é pioneiro a nível nacional. E levanta várias questões pertinentes: a longo prazo, não teria sido um melhor investimento repor o antigo comboio ou avançar com o metro ligeiro de superfície? Se é certo que a região de Coimbra ganha com o BRT uma solução para a mobilidade que lhe foi retirada há duas décadas, qual o custo real deste sistema a longo prazo? Será que a transição modal com o Metrobus vai ser significativa ou está a perder-se uma oportunidade para retirar pessoas do automóvel com esta opção?

O Metro Mondego conta com autocarros eléctricos articulados (fotografia LPP)

Certo é que, independentemente destas dúvidas, outras cidades portuguesas estão a fazer um caminho com o BRT. Na cidade Invicta, o Metro do Porto está a lançar uma linha de Metrobus entre a Casa da Música, Serralves e Matosinhos – uma obra polémica, seja pelo abate de árvores, seja pelo troço onde o BRT estará a circular no meio dos carros, seja pela pouca ambição na requalificação da Avenida da Boavista, que mantém um perfil muito centrado no automóvel e de onde foi eliminada a parca ciclovia que existia.

E Braga está a olhar para o Metrobus como uma solução para criar um transporte previsível e estruturante numa cidade que se afirma cada vez mais como uma das principais áreas urbanas do país (e, talvez, motor de uma futura área metropolitana).

Lisboa quer ligar-se a Oeiras e à Amadora por Metrobus

O eléctrico 15 em Alcântara (fotografia LPP)

A ideia de um Metrobus em Lisboa surge a partir de um downgrade, como aconteceu em Coimbra. Estávamos em 2021 quando os municípios de Lisboa, Oeiras e Loures se juntaram para anunciar um projecto estruturante de mobilidade intermunicipal, o LIOS – Linha Intermodal Sustentável. O projecto consistia em duas linhas, o LIOS Ocidental, que ligaria Alcântara a Oeiras; e o LIOS Oriental, que conectaria Santa Apolónia a Sacavém. As duas linhas estariam ligadas pelo eléctrico 15, que percorre a frente ribeirinha de Lisboa, e também à rede do Metro de Lisboa, quer em Alcântara, onde deverá chegar a Linha Vermelha, quer em Santa Apolónia, onde termina a Linha Azul.

Quando foi apresentado em 2020, ainda no mandato anterior do socialista Fernando Medina, existia para o LIOS apenas um estudo preliminar de traçado. Não havia datas, nem perspectivas de financiamento para este projecto, que não foi sequer considerado no âmbito do PRR. Por outras palavras: foi anunciado para ser feito um dia, quando houvesse dinheiro (e vontade).

Em Lisboa, o Executivo de Carlos Moedas, que entrou em funções em Outubro de 2021, não pareceu ter muito interesse no LIOS e, apesar de algumas referências aqui e ali ao projecto, deixou-o para segundo plano; mas, em Oeiras, a equipa de Isaltino Morais não deixou cair a ideia, falou do LIOS diversas vezes ao longo destes anos, e mostrou vontade de a levar para a frente – com ou sem Lisboa no projecto. E começou a desenhar um traçado que melhor servisse o concelho e que o ligasse à Amadora, cumprindo, desta forma, uma prioridade antiga dos planos metropolitanos: a ligação vertical entre Algés e a Reboleira. É que a Câmara de Oeiras cedo discordou do percurso que inicialmente fora pensado para o LIOS (também Loures, mas já iremos aí).

É a 3 de Julho deste ano que Lisboa volta a falar do LIOS para anunciar a alteração do projecto para um sistema de Metrobus. A notícia não era propriamente nova: em diversos momentos públicos, a Câmara de Oeiras e a sua empresa municipal de mobilidade, a Parques Tejo, já tinham trocado a palavra “eléctrico” pela sigla “BRT”. Lisboa apenas confirmou que, afinal, o LIOS seria feito em autocarros. O projecto foi apresentado nas sede da Carris em Linda-a-Velha, Oeiras, pelo actual Vice-Presidente da Câmara de Lisboa, Filipe Anacoreta Correia, que está fora da corrida autárquica, e por Joana Baptista, Vereadora da Mobilidade de Oeiras e agora número três nas listas de Moedas.

Proposta actual do Metrobus Lisboa-Oeiras (via CML)

O projecto foi rebatizado para TR Ocidental, sendo o “TR” sigla para “Transporte Rápido”. (Na campanha, Carlos Moedas tem-se referido à ideia como “Metrobus Lisboa-Oeiras”.) Estão propostas 29 paragens ao longo de um percurso de 21 quilómetros, com passagem por Alcântara, pelo Pólo Universitário da Ajuda, pelo Restelo, por Algés, por Miraflores, por Linda-a-Velha, pela Outurela, por Alfragide, pelo Estádio Pina Manique, pelas Portas de Benfica e pelo Colégio Militar. Vai ligar, assim, as estações de Metro de Alcântara e do Colégio Militar, bem como as estações de comboio de Algés e de Benfica. O sistema funcionará com 16 autocarros eléctricos.

Propõe-se 24 minutos de viagem entre Algés e o Colégio Militar (em vez dos actuais 37 minutos em transporte público), e uma redução do tempo de deslocação entre Linda-a-Velha e Alcântara dos actuais 35 minutos em transporte público para 22 minutos em BRT. Estima-se que Metrobus sirva directamente 90 mil pessoas, tenha uma procura de 22 mil passageiros/dia, sendo 27% novos utilizadores de transporte público. Prevê-se também que retire quatro mil veículos/dia quando estiver em pleno funcionamento em 2029, e reduza um total de 38,7mil toneladas de CO2e em 30 anos.

Segundo a apresentação feita em Julho, entre 2023 e 2024 foram realizados os estudos prévios, de procura e de viabilidade económica, estando concluído este ano o programa base que define o projecto em detalhe. O financiamento, no valor de 93,5 milhões de euros, está assegurado pelo programa Sustentável 2030 do Governo, e aponta-se para um benefício estimado de 155 milhões. Em 2026 está prevista a avaliação de impacto ambiental, seguida da contratação e execução do projecto, de modo a que a empreitada possa arrancar no ano seguinte. As obras deverão decorrer entre 2027 e 2028, com as autarquias de Lisboa e Oeiras a apontarem para a entrada em funcionamento do Metrobus ainda nesse último ano – apesar de ser mais certo que a operação em pleno aconteça só em 2029, que será um novo ano eleitoral.

BRT de Loures, a estranha solução que fica do LIOS

Loures vai ter um BRT a na zona oriental do concelho (via CML)

Enquanto que o LIOS Ocidental foi transformado numa solução exclusivamente de BRT, o LIOS Oriental passou a ser um sistema misto: por um lado, um eléctrico da Carris, o 16E, vai ligar o Terreiro do Paço ao Parque Tejo, junto ao rio Trancão e a Sacavém, passando por Santa Apolónia e por toda a frente ribeirinha do Beato e de Marvila; por outro lado, um BRT irá continuar o percurso a partir do Parque Tejo para norte (em direcção à Bobadela) ou para sul (para a Portela).

O BRT de Loures e o 16E integram o projecto do “TR Oriental”, o substituto do LIOS que foi anunciado em Abril deste ano. Sobre o primeiro, as informações são vagas no site da Câmara de Loures, mas a autarquia liderada pelo socialista Ricardo Leão passou-as ao jornal Público. O sistema terá 17 paragens e atravessará três freguesias da zona oriental de Loures: Moscavide-Portela, Sacavém e Bobadela. Serão oito quilómetros, um tempo de viagem de 25 minutos e seis autocarros eléctricos (três simples e três articulados), que irão circular em canal dedicado, o que significa que será um verdadeiro sistema de BRT.

O BRT vai ligar Moscavide à Bobadela, passado por Sacavém (via CML)

O investimento estimado é de 51 milhões de euros, financiados por fundos europeus. Desse bolo, 36 milhões para a infraestrutura e 15 milhões para os autocarros. A operação deverá arrancar em 2029, estimando-se uma procura diária de 7 700 passageiros. Ainda não se sabe quem vai gerir ou operar este Metrobus, estando ainda a ser estudada esta matéria.

Ricardo Leão, o socialista que sucedeu em 2021 ao comunista Bernardino Soares na presidência da Câmara de Loures, discordou do traçado do LIOS, que o seu antecessor tinha apresentado ao lado de Lisboa e de Oeiras. E passou o mandato a dizê-lo, revelando estar a autarquia a trabalhar numa nova proposta que, segundo Leão, servisse melhor as pessoas. A actual proposta “é mais versátil e adaptável a diferentes níveis de procura, permitindo uma implementação mais eficaz”, disse a Câmara de Loures ao jornal Público. “A solução inicialmente prevista, em 2021, pelo anterior executivo municipal, revelou-se impraticável, o que motivou a redefinição do projecto”, explica ainda a autarquia.

Traçado do BRT de Loures (via CML)

Referiu ainda que o novo traçado foi desenhado com base nas “densidades populacionais actuais e projectadas”, abrangendo cerca de 90 mil habitantes, e acredita que o sistema de BRT “terá um impacto relevante na mobilidade urbana, contribuindo para a redução dos tempos de deslocação e incentivando a transição do transporte individual para o transporte colectivo”.

Segundo a Câmara de Loures, um dos objectivos do projecto do TR Oriental é assegurar “uma melhor articulação entre os transportes públicos existentes em cada um dos municípios, criando sinergias com as principais infraestruturas de mobilidade regional, de forma a garantir maior eficiência e eficácia do serviço público de transporte de passageiros”. No caso da zona oriental do concelho, “o território apresenta um tecido urbano altamente consolidado, com problemas já bem identificados de mobilidade pedonal e rodoviária”.

O BRT de Loures vai ligar-se ao 16E no Parque Tejo, onde os passageiros do eléctrico poderão apanhar os autocarros para seguir viagem: ou para norte, no sentido da Bobadela, ou para sul, no sentido da Portela e de Moscavide. O percurso do Metrobus começa na estação de Metro de Moscavide, segue pela Praça José Queirós até à Portela. Continua pela Avenida dos Descobrimentos, até Sacavém, fazendo paragens no Real Forte, na Praça da República e na estação de comboios. Atravessando o Trancão, partirá em direcção à Bobadela, com quatro paragens, a última das quais na Quinta dos Remédios.

Com os projectos do TR Oriental e TR Ocidental, fica na gaveta o LIOS. A apresentação tinha ocorrido em Julho de 2020 pelas câmaras de Lisboa, Oeiras e Loures, e chegou a haver um protocolo de colaboração envolvendo a Carris e o Metro de Lisboa. O LIOS teria duas linhas e 24,4 quilómetros de extensão. A linha Ocidental ligaria Alcântara, Ajuda, Belém, Algés, Linda-a-Velha e Cruz Quebrada/Dafundo; o percurso não subia até à Amadora, como se propõe agora. O LIOS Oriental iria partir de Santa Apolónia (onde chegaria o 15E) e ligar esta estação de comboio à Gare do Oriente e daqui até Moscavide, Portela e Sacavém, no concelho de Loures; não ia à Bobadela, como agora se projecta.

O eléctrico 16 não vai sair de Lisboa (via CML)

A coligação Viver Lisboa, encabeçada pela socialista Alexandra Leitão, que junta o PS ao Livre, BE e PAN, propõe retomar a construção de um metro ligeiro de superfície entre Lisboa e Oeiras e entre Lisboa e Loures, abandonado a ideia do BRT. Na Amadora, o socialista Vítor Ferreira, actual Presidente da Câmara, propõe que o corredor de eléctrico ou Metrobus tenha oito paragens no concelho: IKEA, Alto do Moinho, Estrada do Zambujal, Estrada Maior da Força Aérea, Avenida da República, Cova da Moura, Damaia e Reboleira. Na proposta apresentada do TR Ocidental, o Metrobus circunda Monsanto e não vai à Reboleira.

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