Todo o eixo da Almirante Reis vai ser requalificado num “projecto integrado”, que envolverá um processo participativo. Resultados concretos só no início de 2025, com obras a avançarem só num mandato seguinte.

O tema da ciclovia está mais que encerrado. Mas o da Almirante Reis não e vai continuar na agenda mediática ao longo dos próximos anos. A Câmara de Lisboa está agora a trabalhar num “projecto integrado” não só para a avenida, mas para todo o seu eixo, o que inclui parte da envolvente. O objectivo será fazer uma requalificação profunda da Avenida Almirante Reis e Rua da Palma, envolvendo “todos os espaços públicos directamente ligados ao eixo” – ou seja, a Alameda (não toda, mas “uma área alargada”), a Praça João do Rio, a Praça do Chile, o Largo da Igreja dos Anjos, o Largo do Chafariz do Intendente e “todos os cruzamentos com as ruas adjacentes”.
Ao todo, a intervenção abrangerá uma área com cerca de 2,7 km de comprimento entre o Areeiro e o Martim Moniz, cuja Praça será alvo de uma intervenção à parte com o lançamento de um concurso de ideias (já foram divulgados os detalhes). O início das obras de requalificação só está previsto para lá de 2025; até lá, o processo ainda será longo, envolvendo campanhas de comunicação e diferentes etapas de participação pública, que ajudarão a definir o futuro do eixo da Almirante Reis.
O primeiro passo nesse processo foi dado esta quarta-feira, 9 de Novembro, com a aprovação em reunião de Câmara da metodologia do referido “projecto integrado”. Os vereadores dos Nuevos tiempos, do PS e do Livre deram luz verde ao documento que partilhamos em cima e que acabou por ter várias alterações sugeridas pelo Livre; estas mudanças, descritas na proposta de alteração que partilhamos em baixo, foi aprovada por maioria com a abstenção do BE e PCP.
O “projecto integrado” para a Almirante Reis “tem como objectivos principais promover a melhoria da qualidade ambiental do eixo, melhoria da saúde física e psicológica dos seus utilizadores, garantir a segurança e a acessibilidade pedonal universal, e melhorar a articulação entre os diversos modos do sistema de mobilidade do eixo e das áreas envolventes”, segundo a autarquia. Nesta fase, ainda só está feito um diagnóstico geral do eixo e definidos os quatro grande pilares para a futura intervenção: acessibilidade pedonal, segurança, mobilidade, e ambiente.
O processo participativo vai arrancar com uma campanha informativa junto da população e com uma conferência inaugural, com alguns especialistas de diferentes áreas. A partir daqui, será feita uma auscultação pública através de diferentes ferramentas e orientada pelos quatro pilares; serão promovidos encontros físicos usando a metodologia “World Café”, recolhidos contributos anónimos em pontos estratégicos do eixo, promovidos focus group com forças vivas, e feita uma maratona de ideias com as escolas locais, entre outras actividades.
Os resultados serão posteriormente concretizados num programa de intervenção para o eixo, que será apresentado à população até ao final de 2023, antes de ser finalizado para o lançamento do concurso público. Este concurso deverá ocupar o ano de 2024 e permitirá encontrar quem desenvolva o projecto de execução. Está prevista uma apresentação e exposição pública deste projecto o mais tardar em Janeiro de 2025, sendo a obra, portanto, empurrada para um mandato seguinte.
O tema da requalificação da Almirante Reis cruza vários domínios da Câmara de Lisboa, do Urbanismo à Mobilidade, da Acessibilidade à Comunicação. Os serviços da autarquia têm estado a realizar um diagnóstico de todo o eixo, abrangendo uma área de cerca de 278 hectares. De seguida, partilham-se alguns detalhes deste trabalho.
Pré-diagnóstico
Positivo | Negativo |
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– Um eixo que fervilha de vida; – Diverso e inclusivo nas suas gentes; – Eixo com uma dinâmica cultural e artística muito expressiva; – Forte convergência de múltiplas culturas; – Eixo fundamental ao nível da mobilidade viária e pedonal; – Com relevante dinâmica comercial; – Liga a cidade a pé, do Parque da Bela Vista ao Tejo; – Atravessa a cidade de norte a sul; – Ligação com a menor inclinação entre a parte baixa e alta da cidade, ao nível dos modos suaves; – Atravessa a história de Lisboa desde o séc. XVI aos dias de hoje; – Articula e relaciona diversas colinas (S. Vicente, Mouraria, Sant’Ana, Castelo…); – Possui equipamentos de dimensão relevante capazes de criar novas dinâmicas de bairro (ex: antigos Hospitais do Desterro e de Arroios e Mercado de Arroios). | – Considerado um eixo periférico ao nível da cidade; – Com múltiplos conflitos rodoviários, inseguro e poluído que promovem a insegurança dos seus utilizadores; – Uma população descontente com os problemas da mobilidade, segurança e higiene urbana; – Problemas de poluição sonora, poluição atmosférica e onda de calor; – Espaço público descontínuo e fragmentado com apropriação informal e desorganizada, com muitos obstáculos no passeio, pouco confortável e acessível; – Ensombramento deficiente devido a arborização descontínua; – Eixo comercial desorganizado ao nível da imagem geral e das cargas e descargas. |
Objectivos gerais
Acessibilidade Pedonal
- Melhorar o espaço do peão;
- Criar percursos confortáveis, contínuos, sombreados e livres de obstáculos;
- Promover as condições de acessibilidade às habitações, equipamentos, serviços e comércio local a partir da rua e transporte público;
- Garantir uma melhor articulação pedonal com as áreas vizinhas do eixo;
- Diminuir a distância entre passadeiras, melhorando os atravessamentos transversais da avenida com segurança;
- Promover a unidade e continuidade do espaço público ao longo de todo o eixo.
Problemas diagnosticados: acessibilidade pedonal universal não está garantida; passadeiras muito distantes entre si; existência de obstáculos à circulação pedonal contínua.
Segurança
- Contribuir para a diminuição da sensação de insegurança;
- Implantar um sistema de iluminação pública mais seguro e confortável para o peão;
- Promover a dinâmica cultural na comunidade.
Problemas diagnosticados: sensação de insegurança pessoal durante o dia e a noite; iluminação pública pouco eficiente e insegura para os peões.
Mobilidade
- Reduzir os níveis de sinistralidade e aumentar o nível da segurança pedonal, clicável e viária; o Atenuar o impacte da circulação rodoviária;
- Reordenar o espaço dedicado ao estacionamento e às cargas e descargas;
- Melhorar a eficiência e sustentabilidade do sistema de transportes públicos.
Problemas diagnosticados: elevado nível de sinistralidade rodoviária (com acidentes e atropelamentos, tanto para os peões como para os ciclistas); conflito entre os diversos modos de circulação e as necessidades logísticas.
Ambiente
- Contribuir para a melhoria da qualidade do ar;
- Reduzir os níveis de ruído;
- Mitigar os efeitos da ilha de calor;
- Consolidar a ligação da estrutura verde entre o Martim Moniz e o Parque da Bela Vista, através de um eixo arborizado contínuo.
Problemas diagnosticados: níveis de poluição do ar elevados; níveis de ruído elevados; temperaturas elevadas (efeito “ilha de calor”); reduzido número de árvores; existência de espécies desadequadas.
Proposta do PCP chumbada
A metodologia para o projecto integrado de requalificação do eixo da Almirante Reis foi a reunião de Câmara através de uma proposta assinada pela Vereadora do Urbanismo, Joana Almeida, e pelo Vereador da Mobilidade e Estrutura Verde, Ângelo Pereira. O documento, aprovado como já referido, foi votado em alternativa a uma proposta do PCP.
Os comunistas propunham um Plano Urbano da Almirante Reis (PU), a formação de um Gabinete Técnico Local na Avenida, ligando directamente os serviços da Câmara às organizações locais e população, e também um processo participativo com vista à requalificação futura não só da Avenida, mas de todo o eixo, incluindo uma série de praças e de outros espaços públicos. Numa nota enviada às redacções, os vereadores do PCP entendem que a sua proposta tinha um “âmbito sectorial e territorial mais vasto” e incorporava “uma vertente social” ausente do trabalho dos vereadores de Moedas.
“O projecto PSD/CDS tem apenas participação inicial, segue uma metodologia que aposta numa ‘campanha de informação’ à população, seguida de dois meses de ‘participação’ que correspondem mais à amostragem aleatória do que ao envolvimento efectivo da população. Este projecto remete a resolução dos problemas para o desenho urbano apenas do canal da Avenida”, explicam os comunistas. “Já o Plano proposto pelo PCP tem a visão de que os problemas da Almirante Reis não se resolvem numa intervenção limitada à Avenida e, por isso, propõe um conjunto de projectos ou unidades de execução coerentemente com a transformação da zona de intervenção mais abrangente, que inclui o tratamento de vários espaços públicos como a Praça do Chile ou o Jardim Constantino, entre outros.”
A proposta do PCP foi votada em alternativa à dos vereadores de Moedas, o que significa que o resultado da votação determinaria que proposta avançaria: se a do PCP, se a de Moedas. O “plano urbano” dos vereadores comunistas recolheu cinco votos (dos do PCP, um do Livre e um do Cidadãos Por Lisboa), enquanto que o “projecto integrado” dos vereadores dos Novos Tempos teve 13 votos, conforme referido anteriormente.