Pedalar Sem Idade, pelo direito ao vento nos cabelos e pelo combate à solidão dos idosos

Ajuda-nos a chegar às 500 assinaturas, assina aqui.

O projecto Pedalar Sem Idade oferece passeios de bicicleta gratuitos de bicicleta a idosos e idosas, ajudando a combater a solidão e o isolamento da população mais velha, e devolvendo-lhes a cidade e o “direito ao vento nos cabelos”.

Lisboa Fotografía Para Personas

Joaquim Caldas costumava passear pela Quinta das Conchas com a mulher, mas, desde que a perdeu há três meses, deixou de ter “tanto entusiasmo”.“Fiquei muito paralisado”dice. 

Joaquim frequenta um centro de dia no Lumiar e é através dele que participa, de vez em quando, em passeios de bicicleta gratuitos, onde não tem de pedalar – só precisa de se sentar confortavelmente num sofá em forma de bicicleta e de desfrutar do sol, dos sons, da paisagem e de todo o ambiente em redor.

Os passeios da iniciativa Pedalar Sem Idade ajudam a tirar idosos de suas casas, dos centros de dia e dos lares, devolvendo-lhes a cidade e o ‘Direito ao Vento nos Cabelos’, e permitem-lhes redescobrir sítios onde deixaram de ir, por inércia ou por incapacidade física. Se Joaquim nos diz que ainda consegue andar sendo apenas “muito preguiçoso”, já Maria Helena, que o acompanhou no passeio pela Quinta das Conchas, lamenta uma menor capacidade de mobilidade. Com o Pedalar Sem Idade pode “sair de casa sentada” e em boa companhia. O marido faleceu-lhe “há pouco tempo” e, desde então, Maria tem-se sentido mais sozinha. Os passeios de bicicleta (“já é a terceira vez” na Quinta das Conchas, segundo nos conta) têm-na ajudado a combater a solidão da viuvez e a esquecer também, mesmo que temporariamente, a perda recente.

Joaquim e Maria não tinham falado antes, mas já se conheciam do Centro de Apoio a Jovens e Idosos do Lumiar (CAJIL), com o qual o Pedalar Sem Idade tem parceria. Todas as semanas, às sextas, um(a) voluntário/a do projecto vai àquele centro de dia buscar duas pessoas para um passeio pela Quinta das Conchas. Por mês, o Pedalar Sem Idade realiza entre uma centena a centena e meia de passeios, contando com “clientes” em várias instituições de terceira idade parceiras; o projecto está presente em Portugal através de duas associações: a Pedalar Sem Idade Portugal, lançada em 2020 depois de uma campaña financiación colectiva, e representada em Lisboa, Cascais, Guimarães e Castro Verde; e a Pedalar Sem Idade Porto, que começou em 2018 na cidade Invicta. As duas partilham a mesma filosofia, até porque o projecto de passear idosos em bicicletas-sofá nasceu na Dinamarca em 2012 com o nome Cycling Without Age, tendo-se expandido desde então por várias cidades e países.

Lisboa Fotografía Para Personas

Foi Ole Kassow que em 2012 criou a organização sem fins lucrativos Cycling Without Age. Numa palestra TEDx, conta que tudo começou quando se apercebeu da perda de liberdade e de mobilidade das gerações mais velhas e resolveu aparecer, num lar de idosos perto de sua casa, com uma bicicleta alugada, para oferecer passeios. A iniciativa – que Ole vê como uma acção de cidadania – foi um sucesso tal que o dinamarquês repetiu-a com o apoio da Câmara Municipal, cinco bicicletas e uma equipa de voluntários.“O que o Cycling Without Age me ensinou foi que, mesmo quando estás próximo de uma centena de anos, a vida pode e deve ser linda, e um lar de idosos deve ser um lugar de alegria e mobilidade contínua”, disse o fundador da iniciativa naquela palestra. Para Ole, o Pedalar Sem Idade é sobre “lutar pelo direito ao vento no cabelo”, mas também sobre proporcionar uma velhice mais activa e feliz. “Quando ficamos velhos, perdemos as histórias das nossas vidas e as pessoas que testemunharam essas histórias. Conseguem imaginar não ter ninguém à vossa volta que experienciou aquilo que vocês experienciaram? Conseguem imaginar não ter ninguém para rir ou chorar? E imaginar saberem que em breve todas as vossas histórias vão desaparecer?”, questionou retoricamente a audiência.

Os passeios da Pedalar Sem Idade são realizados com bicicletas especiais, as trishaws. São veículos com um assento almofadado para duas pessoas na parte da frente, acoplado a uma bicicleta eléctrica, que é guiada por um voluntário na parte de trás. As trishaws contam com uma capota que pode ser colocada caso comece a chover ou para proteger do frio. Para esses dias mais frios ainda há mantas debaixo dos assentos para os passageiros se aquecerem.

No dia do passeio de Joaquim e Maria não foram precisas mantas e os dois arriscaram até no estilo com óculos escuros, tal era o sol com que tinham sido presenteados naquele dia. Enquanto percorria a Quinta das Conchas, Joaquim ia apontando o que tinha mudado naquele jardim ao longo dos anos. Ainda se lembra dele como um sítio com má fama e da ideia de querer cortar o espaço ao meio com uma estrada. Viu o parque ser renovado e passar a ser um espaço de eleição para muitas famílias. Enquanto Joaquim contava as suas histórias, Maria ia escutando com atenção. E de vez em quando, chamavam  à atenção de Inês Costa, 37 anos, a voluntária que conduzia os dois idosos pelo parque. “De vez em quando eles querem falar connosco”, conta-nos, enquanto se debruça no guiador para interagir com os passageiros.

Inês faz do ouvir a sua profissão. É tradutora e intérprete no Parlamento Europeu, especializada em polaco, francês e inglês. No Pedalar Sem Idade, é voluntária há cerca de um ano e as histórias que escuta são outras. Para Inês, o projecto é um escape à rotina do emprego, que lhe dá a flexibilidade de que precisa para poder realizar os passeios. No total, a equipa do Pedalar Sem Idade Portugal conta com 240 voluntários e voluntárias, nas várias cidades onde está presente e com 10 trishaws. Em Lisboa, são realizados aproximadamente quatro passeios por dia, geralmente 30-45 minutos, sempre gratuitos. Mas, mesmo não cobrando pelas voltas, a associação aceita sempre donativos de quem queira apoiar o crescimento do projecto – neste momento concreto, a Pedalar Sem Idade Portugal está a realizar uma nova campanha de financiación colectiva para angariar mais uma trishaw que, entre o custo do produto e o da importação, ficará no valor de 14,6 mil euros.

Inês começou na Pedalar Sem Idade com a ajuda de Amos Pannesse. É a ele que cabe a responsabilidade de coordenar e formar a força voluntária do projecto. Também Amos começou como voluntário quando se mudou da Indonésia para Portugal em 2021, com a mulher, e trocou os barcos pelas trishaws (Amos era marinheiro). “Faz-me muito bem ao coração quando vejo as pessoas com aquele sorriso no final do passeio”, conta, detalhando que foi esse impacto positivo do projecto nas pessoas e no combate à solidão que o fez ficar. “Fiz dois a três meses como voluntário e depois ofereceram-me o contrato de trabalho. Não sou ciclista mas gosto muito de andar de bicicleta”dice. “Giro o dia-a-dia dos passeios e dos voluntários. Ajudo os voluntários a fazer os passeios e também lhes dou formação no início.”

Nesta formação, não só é importante os voluntários receberem dicas de como lidar com os passageiros, mas também sobre como manobrar as trishaws. É precisa alguma prática, como Inês e Amos contam. As curvas requerem alguma atenção e nem sempre o desenho das ciclovias foi pensado para este tipo de bicicletas de carga. Quando há obras, como acontecia naquele dia no caminho para Quinta das Conchas, Inês e Amos tiveram de ir em contra-mão e subir para o passeio porque não foi criada uma alternativa decente para a mobilidade ciclável – felizmente, não tinham passageiros a bordo. Circular em estradas com pavimento empedrado é outra dificuldade das trishaws – Inês acha desconfortável “porque tudo abana” quando não tem ninguém sentado na parte da frente.

Lisboa Fotografía Para Personas

Além dos passeios realizados nas instituições de terceira idade, o Pedalar Sem Idade está frequentemente presente em eventos e feiras a oferecer voltas a qualquer pessoa, independentemente da sua idade. Se conheceres algum idoso a precisar de sair de casa e de sentir o vento de novo nos cabelos, podes entrar em contacto com a associação. A Pedalar Sem Idade Portugal também está disponível para novas parcerias e oportunidade de financiamento. Os contactos são os seguintes:

Margarida Guedes de Quinhones (directora executiva
E-mail: margarida@pedalarsemidadelisboa.pt
Telefone: +351 931 768 300

Leonor Gameiro (coordenadora de operações)
E-mail: leonor@pedalarsemidadelisboa.pt
Telefone: +351 916 264 754

Gostaste deste artigo? Foi-te útil de alguma forma?

Considera fazer-nos um donativo:

  • IBAN: PT50 0010 0000 5341 9550 0011 3
  • MB Way: 933 140 217 (indicar “LPP”)
  • Ou clica aqui.

Podes escrever-nos para mail@lisboaparapessoas.pt.