A Estratégia Nacional para a Mobilidade Activa Pedonal propõe aumentar a quota modal das deslocações pedonais para 35% até 2030 e apresenta várias medidas. No entanto, sem meios financeiros, este e outros objectivos poderão ficar comprometidos.

Foi publicada, em Diário da República, a versão final da Estrategia Nacional de Movilidad Activa de los Peatones 2030 – um documento que define a estratégia do país para, até 2030, aumentar a quota modal das deslocações pedonais para 35%, aumentar em 50% o espaço pedonal acessível a todas as pessoas, e diminuir em 15% o sedentarismo.
Aumentar as deslocações a pé, transformar o espaço público para ser acessível a todas as pessoas e promover estilos de vida menos sedentários são os três grandes objectivos da estratégia agora publicada, que pretende fazer de Portugal “um país onde andar a pé seja uma opção de mobilidade quotidiana atractiva e segura”.
Meta | Actual | 2026 | 2030 |
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Quota modal das deslocações pedonais | 15,7% (INE, 2021) | 25% | 35% |
Transformar o espaço pedonal acessível a todos | ? [*] | Incremento em 30% | Incremento em 50% |
Diminuir o sedentarismo | 46,4% (DGS, 2020) [**] | Diminuição em 10% | Diminuição em 15% |
“Andar a pé é o acto mais óbvio que a humanidade pratica para se deslocar, mas nem sempre é uma opção atractiva ou possível por força, entre outras, das barreiras urbanísticas e arquitetónicas, do sentimento de insegurança rodoviária e da ausência de iluminação noturna, o que desmotiva o acto mais democrático de mobilidade das pessoas: andar a pé”, pode ler-se no documento (que podes consultar na íntegra em baixo). “O peão deverá tornar-se o elemento central na definição das políticas públicas, contribuindo para a inversão da pirâmide da mobilidade, posicionando o ato de andar a pé e o deslocar (no caso dos cidadãos com deficiência motora) no topo, enquanto condição de acesso universal.”
A estratégia propõe várias medidas, como:
- a criação de redes pedonais coerentes nos centros urbanos, incorporando passeios, praças e ruas pedonais ou de coexistência, de forma contínua, segura e confortável, ausente de barreiras arquitetónicas e urbanísticas, acompanhada por medidas de amenização de temperaturas e do espaço urbano, contemplando mobiliário que promova a estadia e o descanso principalmente para crianças e idosos;
- a implementação de medidas de acalmia de tráfego que destaquem a via pública não somente enquanto espaço dedicado à função de circulação rodoviária, mas também como espaço de fruição e convivência;
- o desenvolvimento de um manual de desenho de espaço público, que possa ser adoptado pelas autarquias e constituir-se como parte integrante dos regulamentos municipais no âmbito da urbanização/edificação;
- o incremento de zonas exclusivamente pedonais nos centros históricos, servidas por transportes públicos e dotadas de estacionamento em número adequado na envolvente;
- a criação de programas de mobilidade escolar pedonal, como “comboios pedonais” e ruas escolares sem carros, e o estimular da investigação académica na mobilidade pedonal;
- a promoção de caminhos pedonais e trilhos rurais para fins de lazer e turismo, bem como o reforço de espaços urbanos verdes e azuis;
- a formação específica de técnicos municipais, urbanistas e profissionais da saúde para a promoção do andar a pé, e a realização de campanhas de comunicação para promover as deslocações pedonais;
- a fiscalização sobre a utilização do espaço público e ocupação de passeios por automóvel;
- a articulação do andar a pé com os sistemas de transporte público, com zonas de embarque e desembarque seguras, práticas, autónomas e acessíveis;
- a possibilidade de transferir parcialmente os impostos arrecadados com a aquisição e circulação de veículos automóveis para a promoção da mobilidade activa, e a criação de incentivos fiscais para quem se desloque a pé.
A Estratégia Nacional para a Mobilidade Activa Pedonal (ENMAP) 2030 passou por um processo de consulta pública, em que cidadãos, associações e outras entidades puderam apresentar os seus contributos. Um dos participantes foi Mário Alves, secretário-geral da Federação Internacional de Peões e presidente do movimento Estrada Viva; ouvido pelo Público, o especialista em mobilidade pedonal referiu que nem todos os países europeus têm a preocupação de desenhar uma estratégia para a mobilidade pedonal, mas que é importante haver recursos humanos e dinheiro para a sua execução.
Na verdade, o documento estratégico agora publicado define a visão, as metas e estabelece as medidas, mas não quantifica nem especifica o financiamento necessário para a sua execução. Diz apenas que a estratégia deverá ser concretizada “através de uma adequada e crescente disponibilização de meios financeiros, técnicos e humanos” e também dos orçamentos de Estado, municipais e intermunicipais, bem como de fundos comunitários. Ou seja, a concretização da Estrategia Nacional de Movilidad Activa de los Peatones 2030 dependerá não só da Administração Central, mas também de cada um dos municípios e das respectivas Comunidades Intermunicipais/Áreas Metropolitanas.
“As práticas internacionais demonstram que o valor investido na promoção efetiva da mobilidade pedonal tem retorno em todos os múltiplos fatores com que esta interfere tais como saúde pública, economia e emprego, turismo, ambiente, qualidade da interação social e sensação de segurança”, é reconhecido no documento.
A publicação da Estrategia Nacional de Movilidad Activa de los Peatones 2030 em Diário da República surge um mês depois de esta ter sido aprovada em Conselho de Ministros (foi no dia 1 de Junho). A ENMAP vai ser gerida por um grupo de trabalho com um coordenador e dois elementos, podendo admitir um terceiro membro se necessário, que tem um milhão de euros para gerir ao longo deste ano. Esse grupo, que está integrado no IMT – Instituto da Mobilidade e Transportes, é o mesmo que está a trabalhar já na Estratégia Nacional para a Mobilidade Ciclável (ENMAC) 2020-2030; as duas estratégias (a pedonal e a ciclável) deverão ser integradas num único documento até ao final deste ano.