Uma cooperativa de estafetas em Lisboa, porque não?

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Fotografia de Mário Rui André/Shifter

Um grupo de ciclistas juntou-se na semana passada para combinar a criação de uma cooperativa de estafetas em Lisboa, usando a plataforma da CoopCycle.

Plataformas como a Uber Eats e a Glovo massificaram novos hábitos de consumo e criaram oportunidades para a restauração expandir a sua base de clientes através de uma rede articulada de estafetas prontos a cobrir grande superfície. As empresas detentoras das plataformas digitais de gestão dos estafetas ganham com isso, os restaurantes também – embora alguns contestem as políticas do serviço – mas são os estafetas, principais protagonistas, que se vêem com condições de trabalho precárias, sem rendimentos fixos nem protecção social. Sentem-se escravos de um algoritmo que não controlam e, por isso, um grupo de ciclistas pondera agora avançar para a criação de uma cooperativa.

Um grupo juntou-se na semana passada para combinar a criação de uma cooperativa de estafetas em Lisboa, usando a plataforma da CoopCycle. A CoopCycle é uma federação que nasceu em França e que desenvolveu uma solução tecnológica que disponibiliza a cooperativas que a queiram usar localmente. O software da CoopCycle inclui um sistema de gestão de frota, uma aplicação para restaurantes receberem os pedidos de encomenda e outra para clientes através dos seus telemóveis fazerem esses pedidos; estão ainda disponíveis integrações através da API, permitindo integrar, por exemplo, a CoopCycle numa loja online WooCommerce.

Em algumas cidades francesas e espanholas, assim como em Berlim, a plataforma da CoopCycle já está a operar através do estabelecimento de cooperativas locais. Em Lisboa, poderá nascer em breve uma cooperativa para também começar a operar com o sistema CoopCycle. Mas há ainda um longo caminho pela frente. Nuno Rodrigues, 30 anos, investigador ligado à área de tecnologia, decidiu dar o primeiro passo e organizar uma reunião na passada semana perto da Cicloficina dos Anjos, a maior oficina comunitária de bicicletas em Lisboa. “Vamos criar uma cooperativa de estafetas? Uma CoopCycle em Lisboa”. O evento organizado no Facebook deixava no ar uma ideia a precisar de corpo e estrutura, e foi nisso que se começou a trabalhar nesta primeira reunião. O grande objectivo era perceber se existiam pessoas interessadas em integrar uma cooperativa e, a partir daí, organizar grupos de trabalho para passar da ideia à prática.

Fotografia de Mário Rui André/Shifter

Cerca de duas dezenas de pessoas acederam ao desafio de Nuno que assumiu a liderança do encontro por uma questão de conveniência, apesar de numa cooperativa não existir uma estrutura verticalizada. Nessa reunião, dois estafetas da Glovo partilharam as suas experiências – nada que já não se soubesse. Aquilo que se apresenta como um trabalho preencher horas e ganhar um rendimento extra tornou-se num sistema que subsiste e prolifera assente numa estrutura de trabalhadores precários – há mesmo quem diga que os estafetas ao serviço da Uber Eats e da Glovo representam a nova escravidão. Trabalham de mochila às costas, alguns de bicicleta, outros de mota e os de mota – dizem dois ciclistas da Glovo valorizam-se por conduzirem um meio de transporte mais rápido. Não têm horas nem horário mas têm de fazer os períodos de maior procura – almoços e jantares – para garantir rendimento. Não têm qualquer tipo de protecção social ou de direitos – folgas, férias, plano de saúde ou reforma. São, em grande parte, imigrantes, e para alguns este é o único trabalho que podem e conseguem ter no país. Não são empregados da Uber nem da Glovo, dos clientes nem dos restaurantes; são empregados da tecnologia, de uma aplicação, de um algoritmo.

Os dois estafetas da Glovo apontaram também como handicap, o facto de a plataforma não ser optimizada para bicicletas, ao contrário do que a CoopCycle propõe, o que faz com que recebam pedidos a 8 ou 9 quilómetros que não são tão fáceis de fazer a pedalar como são de mota, por exemplo. Falaram ainda da existência de assaltos, de ter deixado de existir um escritório da empresa que lhes dê apoio e de os estafetas de motas “acharem que estão acima” dos que se deslocam de bicicleta.

“Eles mudam a app e não nos perguntam nada”, queixou-se um dos estafetas da Glovo que participou no encontrou. Ele e o colega, ambos de nacionalidade brasileira, comentaram que souberam do encontro pelo Facebook e que conheciam mais pessoas interessadas; Nuno também já tinha colaborado com a Glovo até ter desistido. Para alguns, sendo estas aplicações a única forma de ganhar dinheiro, desistir não é uma possibilidade, mas existindo mercado para estafetas a solução, acreditam, passa por dar o controlo da plataforma aos estafetas que na prática a fazem funcionar. É essa a ideia chave da CoopCycle: permite uma relação directa entre estafetas, parceiros, como restaurantes e comerciantes locais, e consumidores, sem a intermediação de uma empresa que fique com grande parte das receitas.

Fotografia de Mário Rui André/Shifter

Na reunião convocada por Nuno, debateram-se os principais desafios. Entre eles, as questões burocráticas inerentes à estrutura formal de uma cooperativa – tendo um custo associado, vale a pena constituir agora ou opta-se por uma já existente? E quantos interessados existem? Outro ponto importante prende-se com os parceiros: como e quem cativar? Restaurantes, oferendo taxas mais baixas que a Uber Eats ou a Glovo? Pequenos negócios que se preocupem com questões de foro ambiental? Entregas só de comida ou outro tipo de estafetas? Fazer a entrega de encomendas no último quilómetro, isto é, dentro da cidade a partir de um armazém à porta da cidade?

Outras questões foram levantadas, procurando nesta nova configuração às respostas que não encontram na anterior: como garantir remuneração dignas para os estafetas? E protecção social? E seguro? Como crescer e ganhar escala? Começar com uma cooperativa mais focada em determinados serviços e horários e com menos pessoas, e ir crescendo sustentavelmente? Neste particular, a CoopCycle, enquanto federação que agrega diferentes cooperativas locais e autónomas, disponibiliza algum apoio, além da essencial plataforma tecnológica, como uma marca com notoriedade na Europa, suporte administrativo, apoio junto de instituições locais e europeias, seguro contra riscos e outros.

A CoopCycle enquanto federação é gerida por uma associação francesa com o mesmo nome que desde 2017 procura “desenvolver um modelo anti-capitalista baseado nos bens comuns”, para isso fazem não só o trabalho de criação e manutenção da aplicação, bem como trabalho de lobbying político, assessoria jurídica e coordenação global das diferentes iniciativas. As cooperativas internacionais operam numa app central – que pode ser descarrega em Android ou iOS, ou acedida através do browser —, sendo que cada cidade tem o servidor próprio gerido pela iniciativa local – em Madrid, por exemplo, é a La Pájara. No site da cooperativa pode ler-se a adesão do grupo o motto fundacional da segurança francesa, o slogan de inspiração marxista, "De chacun selon ses moyens, à chacun selon ses besoins"popularisée par Louis Blanc dans le texte Organisation du travail, publié en 1839. La structure de l'association est également visible en ligne, où l'on peut voir l'importance des distributeurs au sein de la coopérative.

En visitant le site web de La Pájara, vous pouvez en savoir plus sur le service et, d'une certaine manière, anticiper ce que pourrait être cette initiative à Lisbonne. Comme il s'agit d'un service spécialisé de vélos, les livraisons à cette coopérative sont limitées à un rayon de 3 km du restaurant et chaque livraison coûte 3,5 euros ; en plus de cette marge, comme on peut le lire sur le site web, la coopérative garde 25% de la valeur de la commande - faisant allusion au fait que les autres applications de ce type facturent généralement une marge de 30%. Outre la livraison de nourriture, La Pájara propose également un service de messagerie commun - la livraison d'objets - dont le prix peut être calculé sur le site web à l'aide d'une simple feuille de calcul hébergée sur Google Sheets - un petit exemple de la manière dont la coopérative comble les lacunes potentielles grâce à des solutions de bricolage.

Fotografia de Mário Rui André/Shifter

Il y a beaucoup de travail à faire pour rassembler les idées de cette manière, ainsi que de la recherche, en évaluant les exemples internationaux de réussite, par exemple. Ce travail est effectué par différents groupes de travail qui se réunissent en ligne par l'intermédiaire d'un site web. liste de diffusion créé dans Google Groups - si vous êtes intéressé(e) par l'adhésionIl suffit de contacter Nuno sur WhatsApp +351 912 611 396 ou par e-mail nmdrodrigues@gmail.com. Une autre réunion sera convoquée prochainement ; Vous pouvez également en savoir plus sur Facebook.

Article initialement publié sur Shifter

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