Carta aberta: Almirante Reis, uma linha verde

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A ciclovia entrou subitamente no eixo da Almirante Reis sem ter existido uma discussรฃo tรฉcnica fundamentada nem nunca se ter envolvido a populaรงรฃo nas tomadas de decisรฃo. Retirar a ciclovia do mesmo modo seria repetir o erro.

Fotografia de Lisboa Para Pessoas

Exmo. Sr. Presidente eleito da Cรขmara Municipal de Lisboa,

Caro Carlos Moedas,

A ciclovia entrou subitamente no eixo da Almirante Reis no Verรฃo de 2020 sem ter existido uma discussรฃo tรฉcnica fundamentada nem nunca se ter envolvido a populaรงรฃo nas tomadas de decisรฃo.

Retirar a ciclovia do mesmo modo, sem fundamentaรงรฃo tรฉcnica nem envolvimento cidadรฃo, seria repetir o erro. 

Porque nรฃo faz sentido tomar essa medida antes da avaliaรงรฃo da rede de ciclovias pelo LNEC, como se comprometeu, ou por uma outra entidade independente. Seria amputar a prรณpria avaliaรงรฃo. 

Porque nรฃo รฉ prudente fazรช-lo antes de criar uma alternativa que garanta a seguranรงa e integridade fรญsicas. Compete ร  Cรขmara Municipal desenhar a cidade e criar infraestruturas tambรฉm pensadas para mulheres e crianรงas e de modo a proteger utilizadores mais vulnerรกveis, que para alรฉm das pessoas que se deslocam a pรฉ sรฃo quem circula em bicicleta, trotinete, patins, skate ou atรฉ em cadeiras de rodas. 

Porque voltar ao modelo anterior รฉ regressar a uma imagem que seguramente nรฃo partilha, a de uma cidade que privilegia o automรณvel e nรฃo as pessoas. Muitos de nรณs tambรฉm utilizamos carros. Mas Almirante Reis nรฃo poderรก voltar a ser uma via rรกpida de atravessamento de bairros residenciais. Isso nรฃo รฉ o futuro.

Porque, acima de tudo, o fenรณmeno das alteraรงรตes climรกticas constitui um problema impossรญvel de ignorar. As cidades sรฃo responsรกveis por 60% das emissรตes de gases de efeito de estufa[1] e a mobilidade e os transportes representam uma grande fatia deste total, pelo que รฉ inescapรกvel uma sรณlida estratรฉgia para a capital do paรญs. Cabe agora ao executivo que lidera a implementaรงรฃo no territรณrio sobre o qual tem mandato dos objetivos de reduรงรฃo de emissรตes de gases de efeito de estufa com que a Uniรฃo Europeia[2], Portugal[3] e Lisboa[4] se comprometeram. Sabemos que partilha esta preocupaรงรฃo: o seu programa eleitoral propรตe โ€œCriar e monitorizar o descritivo da adaptaรงรฃo ร s alteraรงรตes climรกticas em todas as polรญticas, projetos, e obras de Lisboaโ€. 

Representamos pessoas que vivem, estudam ou trabalham em Lisboa e no vale de Almirante Reis. Somos ONGs, associaรงรตes, movimentos e coletivos comprometidos com a cidadania, a democracia e o futuro, nomeadamente com a transiรงรฃo para um planeta mais sustentรกvel. 

Escrevemos-lhe porque importa agora nรฃo apenas alterar os termos da discussรฃo, desmontando a polaridade automรณveis/bicicletas, como transformรก-la na oportunidade de ouro para repensar e discutir este territรณrio.

Subscrevemos a abertura de um processo participativo que permita uma reflexรฃo sistรฉmica sobre Almirante Reis, um dos eixos mais importantes de Lisboa, porque os pontos a merecer discussรฃo sรฃo mรบltiplos: a mobilidade, por certo, mas tambรฉm a qualidade e manutenรงรฃo do espaรงo pรบblico, a falta de espaรงos verdes, o excesso de ruรญdo e a qualidade do ar, a escassez de equipamentos coletivos, nomeadamente culturais e desportivos, os edifรญcios degradados, a acessibilidade ร s colinas circundantes ou a acessibilidade pedonal. E o papel da cidade no combate ร s alteraรงรตes climรกticas.

A metodologia dos processos de tomada de decisรฃo รฉ determinante no sucesso das polรญticas pรบblicas. Por isso, nรฃo รฉ aceitรกvel que se cometam os mesmos erros do passado: nรฃo faz sentido discutir depois da decisรฃo ter jรก sido tomada e implementada.

Estรก nas mรฃos da populaรงรฃo contribuir para esse processo de participaรงรฃo e de exercรญcio da cidadania. Estรก nas suas mรฃos abraรงรก-lo, em prol da democracia e da cidade.

Subscritores:
  1. Caracol POP โ€“ Associaรงรฃo
  2. ACA-M – Associaรงรฃo de Cidadรฃos Auto-Mobilizados
  3. ANP|WWF – Associaรงรฃo Natureza Portugal, em associaรงรฃo com a WWF
  4. APSI – Associaรงรฃo para a Promoรงรฃo da Seguranรงa Infantil
  5. Associaรงรฃo de Pais e Encarregados de Educaรงรฃo da Escola Bรกsica Sampaio Garrido
  6. Associaรงรฃo de Pais e Encarregados de Educaรงรฃo da Escola Bรกsica Maria Barroso
  7. Associaรงรฃo de Pais e Encarregados de Educaรงรฃo da Escola Bรกsica e Secundรกria Passos Manuel
  8. Associaรงรฃo Desportiva e Recreativa “O Relรขmpago” (secรงรฃo Ciclismo)
  9. Associaรงรฃo do Patrimรณnio e Populaรงรฃo de Alfama
  10. Associaรงรฃo Renovar a Mouraria
  11. Bicicultura
  12. BOTA โ€“ Base Organizada da Toca das Artes
  13. Casa Independente
  14. Centro de Vida Independente
  15. CICLODA – Associaรงรฃo Oficina da Ciclomobilidade
  16. Ciclovia Almirante Reis
  17. Climรกximo
  18. Colectivo Warehouse
  19. Estrada Viva โ€“ Liga de Associaรงรตes pela Cidadania Rodoviรกria, Mobilidade Segura e Sustentรกvel
  20. Frame Colectivo
  21. GEOTA โ€“ Grupo de Estudos de Ordenamento do Territรณrio e Ambiente
  22. GRAAL
  23. Greve Climรกtica Estudantil โ€“Tejo
  24. Grupo Gente Nova
  25. Hangar โ€“ Centro de Investigaรงรฃo Artรญstica
  26. Invisible City
  27. LARGO Residรชncias (SOU LARGO, crl)
  28. Locals Approach
  29. MOVEA โ€“ Movimento Portuguรชs de Educaรงรฃo Artรญstica e Educaรงรฃo pela Arte
  30. Movimento Jardim Martim Moniz
  31. MUBi – Associaรงรฃo pela Mobilidade Urbana em Bicicleta
  32. Mulheres na Arquitectura
  33. PENHA SCO Arte Cooperativa
  34. Post Coop – Cooperativa de Aรงรฃo e Intervenรงรฃo Cultural
  35. Rizoma Cooperativa Integral
  36. Quercus
  37. Rรกdio Antecรขmara
  38. Roundabout.LX
  39. Sirigaita โ€“ Centro Cultural
  40. Trabalhar com os 99%
  41. Valsa
  42. Zero โ€“ Associaรงรฃo Sistema Terrestre Sustentรกvel
  43. Zona Franca nos Anjos

[1] https://www.un.org/en/climatechange/climate-solutions/cities-pollution

[2] A Comissรฃo Juncker, que integrou entre 2014 e 2019, foi um dos principais atores no Acordo de Paris assinado em 2015, vinculando a Europa a objetivos especรญficos para a reduรงรฃo das emissรตes de gases de efeito de estufa. A nova Lei Europeia do Clima, aprovada no Parlamento Europeu em 2021, estabelece o objetivo de reduzir as emissรตes em pelo menos 55% em 2030 face aos nรญveis de 1990.

[3] Para alcanรงar a neutralidade carbรณnica, Portugal comprometeu-se com uma reduรงรฃo de emissรตes entre 45 % e 55 % atรฉ 2030, e entre 65 % e 75 % atรฉ 2040, em relaรงรฃo aos valores de 2005, segundo a Resoluรงรฃo do Conselho de Ministros n.ยบ 53/2020.

[4] Lisboa assumiu compromissos internacionais no รขmbito do Novo Pacto dos Autarcas para o Clima e Energia e tambรฉm da Rede de Lideranรงa Climรกtica C40 Cities, entre os quais uma reduรงรฃo de 60% nas emissรตes de CO2 atรฉ 2030 (face a 2002). Mais de metade desta reduรงรฃo, 55%, รฉ suposto ter origem nos transportes.

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