Orçamento Participativo de Lisboa suspenso desde 2021. Proposta para relançamento adiada

Sem novas edições desde 2021, o Orçamento Participativo (OP) de Lisboa continua sem data para regressar. A proposta do Executivo de Carlos Moedas para relançar o programa acabou por ser retirada da votação por falta de consenso. A oposição discorda das alterações propostas ao modelo do OP e a liderança de Moedas não quis aceitar as sugestões da oposição.

Jardim do Caracol da Penha, um dos últimos projectos OP concretizados em Lisboa (fotografia LPP)

Durante o mandato de Carlos Moedas não foi lançada uma única edição do Orçamento Participativo (OP) de Lisboa. O Vereador Diogo Moura (CDS), que detém a pasta da participação, tinha referido que era preciso repensar o modelo do OP, para que, por exemplo, os projectos vencedores não fiquem por executar como tem acontecido. Essa reflexão está concluída e, por isso, numa reunião camarária recente, a liderança de Moedas apresentou uma proposta para relançar o OP. However, não houve consenso com os partidos de oposição, que sugeriram alterações, a votação ficou adiada e o Orçamento Participativo vai continuar sem data.

“Em véspera de eleições, e depois de mais de três anos sem qualquer nova edição, os Novos Tempos propuseram-se a retomar o Orçamento Participativo (OP), mas com um novo regulamento que – a ser aprovado – desvirtuaria os princípios e o próprio espírito subjacente à iniciativa”, entendem os vereadores socialistas, segundo uma nota enviada à comunicação social. “A proposta acabou por ser adiada, por iniciativa do Vereador responsável pelo OP, que recusou aceitar as propostas de alteração feitas pelo PS, Livre, BE e CPL”, acrescentam.

Um novo modelo de OP

A proposta apresentada pelo Executivo de Carlos Moedas reduziria a verba do Orçamento Participativo de 2,5 para dois milhões e impunha um máximo de 16 projectos vencedores por edição (antes, ganhavam tantos projetos quantos a verba permitisse). Neste novo modelo do OP, o orçamento máximo de cada projecto baixava também, para os 125 mil euros; em 2021, os projectos que envolvessem obras no espaço público podiam ir aos 150 mil euros, enquanto que os projectos que abrangessem a aquisição de bens e serviços tinham um limite máximo de 75 mil euros.

O Vereador Diogo Moura propunha também restringir a apresentação de propostas a residentes, trabalhadores, estudantes e proprietários de empresas sediadas em Lisboa – ao invés de permitir a participação de qualquer pessoa –, bem como retirar o poder de avaliação às juntas de freguesia, que passariam a ser meros executantes dos projectos vencedores, através dos Contratos de Delegação de Competências (CDCs) que já são estabelecidos entre cada uma das 24 juntas e a Câmara de Lisboa para aquelas obras e intervenções de maior proximidade. Na proposta do Executivo de Moedas, uma eventual decisão de não implementar os projectos vencedores (de “veto”) passava das juntas para o Vereador com o pelouro da participação (e do OP).

Vê aqui um quadro-resumo das principais alterações propostas pelo Executivo de Moedas ao modelo do Orçamento Participativo:

OP 2021OP 2025
Verba total2,5 milhões de €, disponível até esgotar a verba:
– até 150 mil € por projecto que envolva empreitada/obra;
– até 75 mil € por projecto que envolva aquisição de bens ou serviços. 
2,0 milhões de €, disponível para um máximo de 16 projectos:
– até 125 mil € por projecto, independentemente de ser empreitada ou aquisição de bens ou serviços.
(projectos de obras de arte e estátuas passam a ser não elegíveis)
Público-alvoAlargada a todos os cidadãos, nacionais e estrangeirosSegmenta para residentes, trabalhadores, estudantes, proprietários de empresas sediadas em Lisboa 
Papel das juntas de freguesiaAvaliação dos projectos com parecer vinculativo    Execução através dos Contratos de Delegação de Competências (CDCs) com a Câmara de Lisboa
Financiamento dos projectosPode haver patrocínio, podendo os projectos ser executados de forma parcial ou na totalidade por organizações do sector privadoVedada a obtenção de qualquer outro financiamento público, privilegiando-se a execução pelos serviços municipais
VotaçãoCada utilizador pode fazer dois votos, em dois projectos diferentesCada utilizador pode fazer dois votos, um voto negativo (não gosto) e outro positivo (gosto)
Vereador com a pasta do OPIntervenção inexistentePode decidir a não implementação do projecto vencedor em qualquer uma das fases de execução

Reavaliar o OP

“Desde o início do presente mandato, foi feita uma análise profunda aos constrangimentos que determinaram os atrasos na implementação dos projetos OP ainda não concretizados e resultantes de diversas edições”, refere a proposta assinada por Diogo Moura, onde se acrescenta que foi “prioridade” do actual Executivo “a concretização do maior número possível de projectos e a preparação de um conjunto de normas para a nova edição, nas quais se tentou evitar que os mesmos constrangimentos se verifiquem”.

No entanto, dados recolhidos pelo Gabinete do Livre na Câmara de Lisboa dão conta de que a média de projectos OP concluídos durante o mandato de Carlos Moedas (18 projectos) está abaixo da média de projectos OP concluídos nos três mandatos socialistas anteriores (20); e que, a este ritmo, são precisos três mandatos para concluir todos os projectos pendentes.

Conclusão dos projectos OP por mandato (gráfico via Livre/DR)

Entre 2022 e 2024 foram apresentados 18 projectos de OP, enquanto que entre 2019 e 2020 tinham sido concluídos 31. Destas contas do Livre, feitas a partir dos dados públicos, ficaram de fora os anos eleitorais por serem anos de transição: tanto 2021, ano em que foram fechadas 12 iniciativas do OP, como 2017, em que foram terminados 13 projectos.

Discordando de algumas das mudanças apresentadas ao formato do OP, o Livre apresentou uma proposta de alteração, que acabou por ser subscrita também pelos vereadores do PS, BE e CPL (Cidadãos Por Lisboa) – PCP ficou de fora No entanto, estas sugestões não convenceram o Vereador Diogo Moura e o Executivo de Carlos Moedas, que discordou das mesmas e optou por retirar a sua proposta de votação, deixando o assunto suspenso. Em concreto, os vereadores da oposição estavam a propor:

  • voltar a aumentar a dotação do OP de dois para 2,5 milhões de euros;
  • voltar a incluir as juntas de freguesia na avaliação das propostas candidatadas;
  • eliminar o poder de “veto” do Vereador com o pelouro do OP; 
  • eliminar o voto popular negativo, mantendo-se os dois votos positivos por utilizador;
  • retirar a limitação a 16 projectos, devendo ser admitidos projectos enquanto exista dotação no programa.

De acordo com Patrícia Gonçalves, Vereadora do Livre, a proposta de alteração apresentada pretendia “salvar um instrumento de participação cidadã que a Câmara Municipal de Lisboa deixou morrer durante todo este corrente mandato, ou seja, há quase quatro anos”, disse citada pela agência Lusa. A autarca do Livre acrescentou que “a ideia-chave das alterações que propusemos era recuperar e não deixar desvirtuar este instrumento essencial de participação cidadã, diversificá-la e dinamizá-la, através da realização de um ciclo itinerante de oficinas de cocriação a realizar nas freguesias e bairros com menor participação histórica no OP”mentioned.

Lisboa vai continuar sem OP

O Orçamento Participativo foi lançado durante a primeira presidência de António Costa da Câmara de Lisboa, tendo sido inédito tanto a nível nacional como também no contexto europeu. “O OP, que em 2008 tornou Lisboa a 1ª capital europeia a realizar um orçamento deste tipo, teve 12 edições entre 2008 e 2021, que receberam quase sete mil propostas de cidadãos e resultaram em 162 projectos para Lisboa, envolvendo mais de 36 milhões de investimento. Graças a ele, Lisboa tem hoje obras que resultaram de propostas e vontade popular e que melhoraram a vida em comunidade, uma dinâmica de participação cívica que esteve interrompida durante mais de três anos e meio", lembra a actual vereação socialista na Câmara de Lisboa.

Por seu lado, o Cidadãos Por Lisboa (CPL) diz que o OP “era, sem dúvida, uma das marcas distintivas do processo participativo na gestão da cidade”, e lamenta que, “já com sabor a eleições no ar”, tenha sido apresentado um regulamento “que diminui as verbas, cria um voto negativo e limita o âmbito das ideias dos munícipes”. “Mas diante das críticas e sugestões de alteração da oposição, a reação foi retirar a proposta. E mais uma vez o OP não avança”he adds.

Já o BE também lamentou a apresentação da proposta a seis meses do final do mandato e disse tratar-se de “um simulacro de orçamento participativo“, referindo que o modelo de OP apresentado pelo PSD/CDS é “mais pequeno, menos democrático e menos útil para a cidade”, e criticando ainda a “postura não democrática” com o adiamento da votação.

Para Diogo Moura, contudo, a proposta apresentada era “exequível, clarificadora e mais transparente quanto à participação dos cidadãos”, e reflectia uma análise às edições anteriores pelos serviços municipais – disse numa resposta escrita enviada à Lusa.

“Parte da oposição optou por apresentar alterações que entendemos como um retrocesso e um contributo para manter a situação em que encontrámos o OP no início do mandato: projetos inexequíveis, mais de 70 projetos vencedores por concretizar e falta de compromisso de execução com os lisboetas”, adiantou o Vereador responsável pelo pelouro do OP, acrescentando, na mesma nota, que, face a uma falta de abertura da oposição para um consenso em matérias estruturais, foi decidido adiar a votação “para clarificação e para garantir, acima de tudo, que o OP é um instrumento que honra a participação dos cidadãos”.

Gostaste deste artigo? Foi-te útil de alguma forma?

Considera fazer-nos um donativo pontual.

IBAN: PT50 0010 0000 5341 9550 0011 3

MB Way: 933 140 217 (indicar “LPP”)

Ou clica aqui.

Podes escrever-nos para mail@lisboaparapessoas.pt.

PUB

Join the LPP Community

The newsletter is the meeting place for almost 3,000 people.