A GIRA+ รฉ uma alternativa ร aplicaรงรฃo oficial da GIRA, que oferece um design e desempenho aprimorados. Foi desenvolvida por dois jovens programadores com a simples intenรงรฃo de ajudar os utilizadores e a EMEL. Mas, tal como a mGIRA, poderรก deixar de funcionar em breve.

Regressamos a Janeiro. Com o computador pousado numa doca da GIRA, em Carnide, Tiago aproveita para dar uns retoques na aplicaรงรฃo que desenvolvera com o amigo Rodrigo para o sistema de bicicletas partilhadas de Lisboa. Chamaram-lhe GIRA+. “Sรณ acedemos ao que estรก exposto, nรฃo temos nenhum hack. A nossa aplicaรงรฃo funciona igual ร aplicaรงรฃo normal da GIRA, sรณ que tem alguns benefรญcios”, explica Tiago.
A GIRA+ foi lanรงada no final do ano passado no GitHub para telemรณveis Android e estรก disponรญvel para iOS atravรฉs de convite. Tiago e Rodrigo, dois jovens de 23 anos, da รกrea de engenharia informรกtica, decidiram avanรงar para o desenvolvimento de uma app alternativa ร da GIRA por nรฃo se reverem na aplicaรงรฃo oficial, nem na alternativa feita por Afonso. Acharam que conseguiam algo melhor, nรฃo sรณ em termos de design como ao nรญvel tรฉcnico. Aproveitando a mesma janela aberta na app da GIRA โ a API que permitia aceder a todas as funcionalidades do serviรงo โ, os dois jovens criaram a GIRA+.

“Eu acho que nรฃo hรก razรฃo nenhuma para a EMEL ter um API privado ou tentar fechar este tipo de aplicaรงรตes. Estas apps nรฃo servem para prejudicar o sistema. Antes pelo contrรกrio, servem para tentar melhorรก-lo”, acredita Rodrigo. “Desde que todos os serviรงos que existem na API tenham coisas como rate limit [um mรฉtodo de controlo de trรกfego] e medidas de seguranรงa normais, nรฃo hรก problema nenhum porque as pessoas, ao usar outra aplicaรงรฃo, nรฃo conseguem fazer nada que a aplicaรงรฃo oficial nรฃo faรงam. Apenas conseguem fazรช-la com uma interface diferente”, acrescenta Tiago.
“Nรฃo acedemos a nada que esteja escondido ou que nรฃo seja suposto”
O entendimento da EMEL รฉ diferente. Josรฉ Rosa, Director de Sistemas de Informaรงรฃo da EMEL, wrote a 29 de Dezembro no GitHub โ onde todo o projecto da GIRA+ foi publicado de forma transparente โ o seguinte: “Calculo que vocรชs estejam autorizados pela EMEL a usar a APIโฆ Vai ser giro quando a EMEL trancar a coisa.” Agora, a empresa municipal de mobilidade de Lisboa decidiu contratar por 20 mil euros um estรบdio de desenvolvimento de software para bloquear os serviรงos da GIRA atrรกs de uma arquitectura protegida, o que bloquearรก o acesso de aplicaรงรตes como a GIRA+ ร API.

A EMEL nรฃo quereria, em primeira instรขncia, que a API que quer a GIRA+, quer a mGIRA estรฃo a usar fosse de acesso pรบblico, e decidiu entรฃo avanรงar com esse bloqueio. Note-se que essa API difere de outra que, essa sim, รฉ pรบblica โ estรก disponรญvel no portal de dados abertos da empresa, o EMEL Open Data, e dรก acesso apenas a alguns dados da GIRA, nรฃo ร s funcionalidades propriamente ditas da app.
Tiago e Rodrigo dizem que, segundo os termos e condiรงรตes da GIRA, o acesso ร API das funcionalidades da GIRA atravรฉs de uma aplicaรงรฃo alternativa nรฃo infringe nenhuma das regras descritas nesse documento. “Nรฃo acedemos a nada que esteja escondido ou que nรฃo seja suposto”, insiste Tiago. “Agora, eles podem adicionar aos termos e condiรงรตes que nรฃo podemos fazer isto. Isto รฉ uma questรฃo legal, nรฃo tรฉcnica. Mas nรฃo nos parece que faรงa sentido isso. Estamos a falar de dinheiro pรบblico, e faz sentido que seja para servir a populaรงรฃo. A melhor maneira รฉ ter cรณdigo pรบblico e APIs tendencialmente pรบblicos.“

Tudo o que os dois jovens desenvolveram no รขmbito do GIRA+ รฉ pรบblico, permitindo a qualquer pessoa escrutinar o respectivo cรณdigo e verificar se existem eventuais falhas de seguranรงa ou algum roubo de informaรงรฃo, por exemplo. “Qualquer pessoa pode ver o que รฉ que a nossa aplicaรงรฃo estรก a fazer”, refere Rodrigo. Tambรฉm รฉ possรญvel descarregar o cรณdigo e colocar a app a correr. “Qualquer pessoa pode dar ‘build’ da aplicaรงรฃo e assim garante que nรฃo pudemos nada extra”, diz Tiago.
De um melhor design a uma melhor performance
O ponto forte da GIRA+ รฉ o design. A aplicaรงรฃo comeรงou a ser pensada no Figma, uma aplicaรงรฃo para desenho de interfaces (que no LPP usamos para criar as imagens para as nossas redes sociais), e foi a partir daรญ transportada para cรณdigo. Tiago e Rodrigo pensaram em cada botรฃo, cada รญcone, cada tom de cor, cada sombra. Fizeram vรกrios estudos e testes atรฉ chegarem a uma interface que lhes agradasse. “Tudo o que estรก na aplicaรงรฃo em termos de iconografia foi feito por nรณs ou amigos nossos. O logo da aplicaรงรฃo, por exemplo, foi feito por uma amiga nossa”, diz Tiago. “O logo da aplicaรงรฃo foi baseado no oficial da GIRA mas รฉ original”, acrescenta o amigo.
No design da interface da GIRA+, os dois jovens procuraram nรฃo sรณ uma aplicaรงรฃo mais bonita, mas tambรฉm mais รบtil, colocando a rede de ciclovias no mapa e colocando a informaรงรฃo nos sรญtios onde esta faz sentido. “Desafio a encontrarem o vosso saldo de pontos na aplicaรงรฃo oficial”, brinca Rodrigo. A experiรชncia de ambos de utilizaรงรฃo da GIRA ajudou nesta tarefa de desenho da aplicaรงรฃo. “Como รฉ que seria a nossa experiรชncia ideal de utilizaรงรฃo da GIRA? Estamos a tentar produzir uma aplicaรงรฃo que nos dรช essa experiรชncia.” Tambรฉm hรก questรตes de gosto no design โ por exemplo, trocaram o sistema de classificaรงรฃo de viagens ร base de estrelas por emojis de caras.
Outro ponto forte da GIRA+ รฉ a capacidade de superar os silรชncios da aplicaรงรฃo oficial, quando esta demora a devolver respostas aos utilizadores ou fica bloqueado. Os dois programadores criaram um sistema que disfarรงa os pedidos falhados da aplicaรงรฃo ao servidor com programaรงรฃo adicional e algum design, para que os utilizador nem sequer se aperceba de que hรก um problema. A app oficial, por seu lado, mostra mensagens de erro, o que gera frustraรงรตes nos utilizadores. “Mostramos umas prรฉ-visualizaรงรตes do que vai aparecer no ecrรฃ antes de recebermos os dados da EMEL. Se carregarmos para ver bicicletas numa estaรงรฃo, aparecem a cinzento umas ‘bicicletas falsas’, por assim dizer, enquanto nรฃo temos a lista real das bicicletas”, exemplifica Rodrigo.

“Mas hรก outros truques que usรกmos para a aplicaรงรฃo ser mais rรกpida.” Tiago explica melhor: “Nรณs tentamos de novo os pedidos todos que falham com erro de serviรงo. Erros do servidor sรฃo bastante comuns. Hรก mesmo ‘crashes’ no servidor e quando isso acontece nรณs esperamos um bocadinho e tentamos outra vez. E isto faz com que as pessoas nรฃo tenham de tentar a mesma coisa vรกrias vezes seguida. A aplicaรงรฃo faz por eles”mentions. “Por exemplo, quando hรก falhas no desbloqueio de uma bicicleta, que acontece ร s vezes, nรณs apenas tentamos outra vez desbloquear a bicicleta pela pessoa. Quando hรก falhas em obter as bicicletas em uma estaรงรฃo, nรณs tambรฉm tentamos isso de novo. Quando hรก falhas no histรณrico, quando a palavra-passe dรก erro…”
Quem tiver Android e quiser experimentar a GIRA+ sรณ tem de descarregar o ficheiro .apk para o seu telemรณvel e instalar a aplicaรงรฃo. Os utilizadores iOS podem entrar em contacto com o Tiago atravรฉs do e-mail gira@tteles.dev or the X/Twitter. “Esta ainda รฉ a primeira versรฃo e nas versรตes seguintes vamos por ainda mais funcionalidades”, prometia Rodrigo, em Janeiro. Desde entรฃo, os dois jovens acabaram por fazer pequenas actualizaรงรตes, resolvendo bugs e melhorando a estabilidade da plataforma. Atรฉ porque nรฃo chegaram a ter o feedback que imaginavam ter da EMEL. Na verdade, ideia dos dois com o desenvolvimento da GIRA+ era ajudar nรฃo sรณ os utilizadores das bicicletas partilhadas de Lisboa, mas tambรฉm a empresa municipal que gere o sistema, propondo-lhe uma aplicaรงรฃo alternativa.
Ajudar os utilizadores e a EMEL

Enquanto que Afonso chegou a ter uma reuniรฃo com a EMEL sobre o mGIRA, Tiago e Rodrigo nรฃo tiveram qualquer contacto alรฉm da discussรฃo no GitHub. “O nosso objectivo era ter uma primeira versรฃo com o mรญnimo indispensรกvel para as pessoas conseguirem utilizar esta aplicaรงรฃo”, diz Rodrigo. “Mas o mรญnimo tinha de estar bem feito”, acrescenta Tiago. Uma das ideias do grupo era mostrar o caminho a pรฉ atรฉ ร estaรงรฃo mais prรณxima e depois, uma vez iniciada viagem, ter indicaรงรฃo do caminho de bicicleta atรฉ ร estaรงรฃo de destino โ um pouco ร semelhanรงa do que a mGIRA de Afonso faz. “Estes percursos ficariam sempre no telemรณvel das pessoas. Nรณs nunca os saberรญamos”, avisa Tiago, mostrando uma preocupaรงรฃo com a privacidade dos utilizadores. “Nรณs nรฃo temos infraestrutura nenhuma do nosso lado, sem ser o mapa da aplicaรงรฃo. O mapa, que tem as ciclovias, รฉ a รบnica coisa que รฉ infraestrutura nossa. Ou seja, o รบnico dado que nรณs recolhemos รฉ o IP das pessoas quando elas carregam o mapa. Mas nรฃo temos qualquer interesse nessa informaรงรฃo.”
Os jovens reiteram que fizeram tudo para ajudar a EMEL e os utilizadores, e nรฃo para recolherem louros ou dinheiro. “Rejeitรกmos as doaรงรตes todas”, diz Rodrigo. “Nem me sentiria bem a aceitar dinheiro com um serviรงo que รฉ meu”, acrescenta Tiago. A GIRA+, tal como a mGIRA, continuam disponรญveis para todas as pessoas que queiram aproveitar uma alternativa ร aplicaรงรฃo oficial das bicicletas partilhadas de Lisboa โ pelo menos atรฉ a EMEL o permitir.