Lisboa quer implementar um sistema de acesso diferenciado nos ascensores, elevadores e eléctrico 28 para priorizar os residentes e trabalhadores locais face à pressão turística. A medida vai ser testada no Funicular da Graça, que irá passar da EMEL para a Carris.

Lisboa, particularmente no seu centro histórico, conta com diversos ascensores e ascensores que tornam mais fácil subir as suas colinas íngremes. O Ascensor Glória, por exemplo, é uma das melhores opções para chegar ao Bairro Alto ou ao Príncipe Real a partir da Praça dos Restauradores. Para quem viaja na Linha Azul do Metro, basta sair na estação dos Restauradores e, a poucos metros, apanhar o elevador. O Ascensor Lavra cumpre a mesma função na colina oposta, ligando os Restauradores a Campo Mártires da Pátria com rapidez e sem esforço. Já o Ascensor Santa Justa é a escolha mais cómoda para subir desde o casco central da Baixa ao topo do Largo do Carmo y el Chiado.
Todos estes elevadores seriam muito úteis à população não fosse o facto de se terem tornado atracções turísticas. Quem vive, estuda ou trabalha em Lisboa não consegue fazer uso destes meios de transporte público sem ficar em longas filas de turistas que não querem perder a oportunidade de andar em veículos icónicos da nossa cidade e de tirar fotografias durante as viagens. No entanto, os ascensores e elevadores da Carris continuam a fazer parte do sistema de transporte público de Lisboa, e devem continuar acessíveis aos locais. Uma situação semelhante acontece no eléctrico 28, também muito popular entre os turistas, apesar de haver eléctricos destinados ao serviço turístico – as filas no Martim Moniz para o 28 são constantes.

A Carris está a preparar um sistema de acesso diferenciado aos meios de transporte mais procurados pelos turistas, segundo avança o jornal Público citando a empresa municipal. Essa diferenciação entre turistas e residentes locais será feita nos ascensores e elevadores operados pela empresa, mas também no eléctrico 28, ou seja, nos equipamentos de elevada pressão turística. O Funicular da Graça, que vai passar da EMEL para a Carris em Abril ou Maio, será a infraestrutura escolhida para estrear e testar esse acesso diferenciado, cumprindo uma proposta apresentada pelo Cidadãos Por Lisboa e subscrita pelo Vice-Presidente.
Duas filas, uma para quem tem Navegante e outra para quem não tem
Según Carris, el implementação desta medida será “bastante complexa” e ainda não está fechado o modelo. O mais certo é fazer-se como em Veneza, onde o transporte público fluvial também sofre com a pressão turística; na cidade italiana, existem duas filas: uma para quem tem passe (e, por isso, supõe-se que é residente) e outra para quem não tem (visitante).
Em Lisboa, a aplicação poderá ser semelhante: duas filas, uma para portadores do Navegante e outra para quem tenha bilhetes pré-comprados ou vá comprar o bilhete de bordo. Contudo, há dúvidas de que este modelo possa prejudicar residentes que sejam utilizadores ocasionais do transporte público; por outro lado, pode também ser mais um incentivo à aquisição do passe, além do acesso gratuito às bicicletas GIRA ou à rede de BiciParks.

Certo é que o objectivo é garantir que os utilizadores quotidianos não deixem de ter lugar neles devido à procura dos visitantes. A ideia é que a Carris cumpra o papel de “servir a sua população de forma a garantir que a pressão turística afecte o menos possível a mobilidade e facilidade de utilização de transportes públicos de residentes e trabalhadores da cidade”. Isto mesmo pode ser lido numa proposta apresentada na Câmara de Lisboa pelo grupo político Cidadãos Por Lisboa (CPL), eleito na lista do PS. No geral, a referida proposta, que acabou por ser subscrita pelo Vice-Presidente da autarquia, Filipe Anacoreta Correia, foi aprovada por maioria, com a abstenção do Livre e os votos contra dos dois vereadores do PCP.
“O objectivo desta proposta é encontrar uma forma legal e prática de assegurar o uso dos transportes públicos por parte da população. Ela não pode ser prejudicada pela enorme procura turística sentida em alguns equipamentos”, explica Rui Franco, vereador do CPL, ao jornal Público. Para o autarca, a criação da entrada alternada nos meios de transporte, com recurso a duas filas, para diferentes tipos de bilhetes “não é assim uma invenção tão grande”, pois já existiu nos autocarros da Carris. “Houve, durante anos, uma espécie de guarda metálica à entrada, separando os que tinham passe dos que compravam bilhete a bordo”dice.
A proposta aprovada do Cidadãos Por Lisboa prevê ainda um aumento tarifário dos bilhetes ocasionais dos ascensores, elevadores, funiculares e eléctricos com “elevada pressão turística”. Actualmente, uma viagem nos ascensores custa 4,20 €, nos eléctricos 3,20 € e no Elevador de Santa Justa 6,10 €. O Funicular da Graça terá uma tarifa próxima, ainda não definida. Note-se que estes são os valores para compra a bordo ou por sin contacto; pré-comprando as viagens através dos cartões ocasionais do Navegante, podem ficar a 1,85 € (bilhete simples que dá para toda a rede da Carris durante 1 hora e também fazer uma utilização do Metro de Lisboa) ou a 1,66 € (no caso de saldo zapping, sendo esse o custo para 1 viagem).
Funicular da Graça abaixo das expectativas. Vai passar para a Carris

A proposta do CPL alterava uma proposta do Vice-Presidente que era somente sobre a passagem do Funicular da Graça para a Carris. A discussão deste tema ocorreu na reunião da câmara do passado dia 22 de Janeiro, e o assunto terá ainda de ser passar pela Assembleia Municipal, mas deverá ter nesta instância o mesmo desfecho: o da aprovação por maioria.
O Funicular da Graça foi inaugurado em Março de 2024. Resultou de uma obra da EMEL de 5,3 milhões de euros e seria esta empresa de mobilidade a gerir o equipamento, sendo que a partir de Maio de 2024 estava previsto o início da cobrança de bilhetes a quem não tivesse passe Navegante. No entanto, tal nunca chegou a acontecer e o Funicular da Graça, que estabelece a ligação entre o largo com esse nome e a Mouraria/Martim Moniz, mantém-se gratuito.
Depois de alguma curiosidade inicial, o Funicular da Graça não ganhou a popularidade entre turistas que os outros equipamentos do género, como o LPP tem testemunhado no local. O facto de o funicular tem uma frequência de 10 em 10 minutos – que nem sempre é cumprida –, muitos turistas acabam por escolher descer a pé pela escadaria lateral, porque não querem ficar à espera.

Outros visitantes acabam por não compreender o funcionamento deste equipamento, uma vez que em nenhuma das entradas existe informação clara e acessível sobre esse mesmo funcionamento, como indicação de que sobe/desce a cada 10 minutos, que é preciso esperar esse tempo ou que a utilização é inteiramente gratuita.
Por outro lado, funcionários e passageiros frequentes dizem que houve um pico de procura inicial mas que baixou após os primeiros meses, e que mesmo na época de Verão o Funicular da Graça não ganhou a sua graça. O facto de ser imprevisível, sem horário, ao contrário dos ascensores e elevadores geridos pela Carris, tornará também o Funicular da Graça pouco útil para residentes, que dizem que também nunca sabem quando é que o funicular funciona. Reportam ainda que já o apanharam avariado ou com um exagerado tempo de espera.
Para turistas, o Funicular da Graça pode passar despercebido, uma vez que um dos acessos está escondido no meio da Mouraria (e não visível numa grande praça como os Restauradores) e porque não está sequer mapeado em plataformas como o Google Maps.Segundo a Câmara de Lisboa, após a aprovação da proposta de passagem do Funicular da Graça para a Carris pela Assembleia Municipal, “a Carris e a EMEL irão operacionalizar a mudança da tutela. Será previsível que, em Abril ou Maio, o funicular já esteja a funcionar sob alçada da Carris”, indicou a autarquia. Por seu lado, a Carris não quis adiantar datas, referindo que tudo “depende de um conjunto de procedimentos formais que estão ainda em curso”.