Uma escola nos Olivais e duas no Lumiar vão receber o projecto-piloto de transporte escolar operado pela Carris a partir de Outubro. Por seu lado, os Comboios de Bicicleta ainda não têm regresso definido.

É no início do ano lectivo que muitos pais e mães estabelecem as rotinas que perdurarão nos meses seguintes. Mas no que toca a mobilidade escolar o regresso às aulas está a começar tremido. O projecto-piloto de um novo serviço de transporte escolar, que será operado pela Carris, vai arrancar só em Outubro mas em três escolas da cidade – uma nos Olivais e duas no Lumiar. Quanto aos Comboios de Bicicleta ainda não existem informações sobre o seu regresso. Já o transporte escolar Alfacinhas está suspenso.
O novo serviço de transporte escolar resulta de uma proposta apresentada pelos vereadores do PCP na Câmara de Lisboa em Fevereiro e que foi aprovada por unanimidade. A proposta previa um piloto em pelo menos dois agrupamentos da cidade em Setembro. “Há um ligeiro atraso”, disse o Vereador comunista João Ferreira aos jornalistas, à saída da reunião privada de Câmara desta quarta-feira, “mas temos indicação de que arrancará em Outubro e em três escolas da cidade”. Essas escolas são a EB 1 Paulinho Montez, nos Olivais, a EB 2,3 Telheiras, no Lumiar, e a EB 2,3 Prof. Lindley Cintra, também na freguesia do Lumiar.
Para João Ferreira, que partilha a vereação do PCP na CML com Ana Jara, este é “um primeiro passo para a generalização a toda a cidade de um serviço de transporte escolar dedicado” que levar a que “muitas famílias abdiquem do transporte individual, que hoje tem um peso grande neste tipo de deslocação casa-escola e escola-casa”. O que vai arrancar é um projecto-piloto, “que depois terá de ser avaliado e que pode ou não admitir alterações numa fase de implementação mais alargada ao conjunto da cidade”, acrescentou João Ferreira. “Esperamos que seja desde já dada informação às famílias e comunidades educativas destes estabelecimentos de ensino.”
Note-se que em Abril o partido Livre apresentou na Câmara de Lisboa uma proposta também ela de transporte escolar, intitulada Os Amarelinhos, na sequência de uma promessa que constava do programa eleitoral conjunto do Livre com o PS (coligação Mais Lisboa). A iniciativa do Livre, semelhante na ideia-base à do PCP, foi aprovada também por unanimidade em reunião de Câmara. O partido propunha um sistema de transporte escolar em Lisboa, algo quase inexistente na cidade, e mandatava o Presidente da Câmara a criar um conceito ecológico de carrinhas e mini-autocarros eléctricos gratuitos que permita o transporte de crianças, em segurança, das suas casas para as creches e escolas.
Este novo sistema de recolha ponto-a-ponto não se limitaria a crianças e jovens, e seria desdobrado, em outros horários, para os cidadãos seniores ou de mobilidade reduzida. O Livre lançava também o desafio à comunidade académica e de desenvolvimento de logiciel para a criação de uma plataforma de transporte a pedido que pudesse ser associada a’Os Amarelinhos.
Lumiar é a freguesia onde se vai mais de carro para a escola
Dados do inquérito Mãos Ao Ar! 2021, a mais completa radiografia de como as crianças e jovens vão para a escola em Lisboa, dão conta de que 48,2% dos estudantes se deslocam de carro, 25,8% a pé e 14,% de autocarro. Focando nas duas freguesias do futuro projecto-piloto, verifica-se que as idas para a escola de carro ocupam uma fatia substancial da distribuição modal: 67,6% no Lumiar, onde só 14,1% das crianças e jovens responderam que vão a pé e 8,4% de autocarro; 53,4% nos Olivais, onde, apesar de tudo, 26,9% vai a pé e 14,1% de autocarro. A freguesia do Lumiar é, aliás, aquele que mais deslocações escolares de carro regista, sendo seguida do Parque das Nações com 62,4% de quota modal escolar para este meio de transporte individual e de São Domingos de Benfica com 61,2%. O relatório pode ser descarregado aqui.


Na sessão de apresentação dos resultados do Mãos Ao Ar! 2021, que decorreu em Maio, o Vereador Ângelo Pereira (PSD), que tem a pasta da Mobilidade, mostrou-se comprometido com uma mudança de paradigma. O responsável disse, na altura, ter “a certeza de que os resultados deste ano de 2022 vão ser bem diferentes. Acho que vai conseguir diminuir a utilização do automóvel, até pelas medidas que estamos a implementar”, avançando três grandes prioridades: os transportes gratuitos para estudantes até aos 23/24 anos, o novo serviço de transporte escolar da Carris e os Comboios de Bicicletas.
Comboios de Bicicletas sem data
No ano lectivo 2021/22, o projecto dos Comboios de Bicicletas arrancou mais tarde devido a questões processuais e orçamentais, em parte por ter existido um período eleitoral e novas pessoas a ocupar o executivo camarário. O projecto só retomou no final de Março, mas, apesar do regresso tardio, foi neste ano lectivo que cresceu e se consolidou com Comboios em 15 escolas e a superação da marca das mil viagens acumuladas.
Les Trains-bicyclettes são um programa da Câmara de Lisboa de promoção da utilização da bicicleta como meio de deslocação para a escola e de estimulação também da autonomia futura das novas gerações na cidade. Um Comboio de Bicicletas consiste numa fila de crianças a pedalar para a escola, acompanhados por monitores; podem ser as escolas ou os próprios encarregados de educação a pedir para existir um Comboio de Bicicletas num determinado agrupamento escolar. Em alguns casos, os Comboios surgem mesmo por iniciativa de um grupo de pais e mães voluntários. O projecto tem sido operacionalizado no terreno pela cooperativa Bicicultura, cabendo a coordenação geral ao município.
Dado o sucesso e o compromisso político, o regresso dos Comboios de Bicicletas parecia certo logo no início do novo ano lectivo, mas tal não aconteceu e ainda não existe para já qualquer informação sobre como e quando os Comboios vão regressar, devendo, no entanto, esse regresso estar a ser ainda preparado. Pela reunião de Câmara desta quarta-feira, no entanto, passou uma proposta para formalizar um apoio financeiro repartido entre a Bicicultura e a associação Cicloda para a operacionalização de um outro projecto, o Escolas Com Pedalada nas freguesias de Benfica e de São Domingos de Benfica.

O Escolas Com Pedalada resulta de uma ideia apresentada e votada em Orçamento Participativo de 2021 e que na sua essência é igual à dos Comboios de Bicicleta – ou seja, os Comboios deverão chegar este ano a Benfica e São Domingos de Benfica com um nome diferente. As escolas abrangidas serão a EB 2,3 Professor Delfim Santos, o Externato Fernão Mendes Pinto, a Cooperativa de Ensino de Benfica e a EB 1,2,3 Pedro de Santarém. A iniciativa, que inicialmente esteve planeada para o ano lectivo passado, abrange também “acções de formação para uso da bicicleta em contexto fechado e na cidade, estacionamento em segurança, e capacitação para resolução de questões mecânicas” e “acções de sensibilização à comunidade escolar para adoção de comportamentos seguros no estacionamento automóvel e circulação na envolvente escolar”.
No entanto, a apreciação e votação das duas propostas relativas ao Escolas Com Pedalada, que consolidavam a transferência de fundos para a Bicicultura e Cicloda, foram adiadas, colocando também um ponto de interrogação sobre quando este projecto poderá arrancar no terreno neste ano lectivo.
Alfacinhas suspensos
O ano lectivo 2022/23 está a começar também sem o serviço de transporte escolar mais antigo da cidade, o Alfacinhas. A denúncia foi feita pela Vereação do PS através das redes sociais. “O ano lectivo começou com centenas de crianças impedidas de usar o serviço de transporte escolar, os Alfacinhas. É a primeira vez, desde 2009, que o serviço não está a funcionar, lesando centenas de crianças do 1º ciclo, impedidas de usar um serviço seguro e de proximidade”, escreveram os socialistas.
O Alfacinhas é um serviço de transporte escolar gratuito destinado aos alunos do 1º ciclo, que residam a mais de 12 minutos a pé do estabelecimento escolar onde estão matriculados, desde que dentro da área de influência do respectivo agrupamento de escolas. As paragens são definidas em função da residência de cada criança e o serviço é disponibilizado de manhã, para a escola, e ao final da tarde, para casa. No último ano lectivo (2021/22), abrangeu cinco agrupamentos de escolas.
A operação do Alfacinhas era atribuída a uma empresa privada, por intermédio de concurso público. Desde 2016, era a Barraqueiro a desempenhar o serviço por períodos de três anos lectivos. O último contrato, no valor de 2,6 milhões de euros, datava de 2019 e terminou no passado ano lectivo. O contrato assinado em 2016 tinha sido mais barato, no valor de 2,2 milhões. O PS acusa o executivo de Carlos Moedas de “incompetência” parce que “ignorou a realidade dos agentes económicos, mantendo os preços do concurso quando os custos dispararam. Nenhuma empresa esteve interessada, claro, e centenas de crianças estão sem transporte”, referem os socialistas da CML.
Não se sabe se o município pretende municipalizar o Alfacinhas, integrando-o futuramente no novo serviço de transporte escolar da Carris, por agora em piloto.
O Lisboa Para Pessoas enviou várias questões de esclarecimento à Câmara Municipal de Lisboa e, em particular ao Gabinete do Vereador Ângelo Pereira, mas não existiu até ao momento disponibilidade para resposta. Este artigo será actualizado se essas respostas chegarem.
Actualização a 19/09/2022: depois da notícia do Lisboa Para Pessoas na sexta-feira, a CML anunciou discretamente que as inscrições para os Comboios de Bicicleta abrem esta semana, no dia 22 de Setembro. Autarquia não respondeu, no entanto, às questões por nós colocadas.