Artigo de Opinião.
Na Linha Verde, poderia experimentar-se intercalar um comboio de seis carruagens entre comboios de três carruagens – por exemplo, três comboios de três carruagens seguidos de um comboio de seis.

Como antigo funcionário que participou na colocação em serviço das ampliações para Campo Grande, para Cais do Sodré, para a Gare do Oriente, para Telheiras, para Amadora, para Odivelas e para Santa Apolónia, acompanho com muito interesse e preocupação o actual momento do Metro de Lisboa. Discordo por motivos técnicos do actual plano de expansão – sem pôr em causa a competência e o brio profissionais dos colegas que nele participam, porque têm de cumprir um plano decidido por decreto em 2009, em incumprimento do PROT AML (Plano Regional de Organização do Território da Área Metropolitana de Lisboa) e sem discussão pública alargada.

Sendo inevitáveis as perturbações das obras, parecerá inglório estar a prejudicar as pessoas nas suas deslocações futuras casa-trabalho – por exemplo, a intervenção junto da estação do Cais do Sodré deveria ter sido evitada dada a natureza dos terrenos e a complexidade da obra que a encarece. Em vez disso, a mobilidade das pessoas teria sido melhor garantida com o prolongamento da Linha Vermelha, não como agora está previsto para junto de Alcântara Terramais para Alcântara Mar – com correspondência em viaduto com a Linha de Cascais, dispensando a futura e cara ligação da linha de Cascais à Linha de Cintura.
Mas vamos ao dia-a-dia de quem usa o Metro hoje em dia.
1 – As perturbações das obras
Por razões de segurança – para evitar que, no caso de uma falha na travagem, um comboio lance tensão na zona de trabalhos –, justifica-se os comboios que vão a Campo Grande terem apenas três carruagens. Informou o Presidente do Metro que antes circulavam na Linha Verde comboios de seis carruagens com intervalos de cerca de 4,5 minutos. A capacidade oferecida, considerando uma lotação de 800 passageiros (ocupação de 4 pessoas/m2) e 60/4,5 = 13 comboios por hora e sentido, seria de 13×800 = 10 200 passageiros/hora e sentido (nº de comboios/hora = 60 minutos/intervalo entre comboios em minutos).

Com as restrições das actuais obras, que deverão durar até 20 de Junho, no máximo, com comboios de três carruagens com capacidade para 400 passageiros, conseguindo-se um intervalo à volta de três minutos e meio, conforme prometido pelo Presidente do Metro, teremos 60/3,3 = 18 comboios/hora e 18×400 = 7.200 passageiros/hora.
Não se prevendo autocarros de “vai-e-vem” entre a estação de Alvalade e o Campo Grande, não seria mau este valor, desde que se conseguisse manter o intervalo de 3,5 minutos (a sinalização permite ir até 2,5 minutos, mas isso exigiria mais pessoal e material circulante) . Porém, comboios de três carruagens geram grandes atrasos nas estações por rapidamente encherem. Então, poderiam experimentar-se duas hipóteses:
- um comboio de três carruagens pararia nas estações pares e o comboio de três carruagens seguinte pararia nas estações ímpares. Isso permitiria aumentar a velocidade comercial reduzindo o tempo de percurso e reduzir a três minutos o intervalo entre comboios e aumentar a capacidade da linha (intervalo entre comboios = comprimento do percurso de ida e volta incluindo os términos/(nº de comboios na linha x velocidade) ). Para três minutos de intervalo teríamos 20 comboios/h e capacidade de 8.000 passageiros/h
- intercalar um comboio de seis carruagens entre comboios de três carruagens – por exemplo, três comboios de três carruagens seguidos de um comboio de seis. Os comboios de três carruagens seguiriam até Campo Grande, e o de seis carruagens faria a inversão em Alvalade, na 2ª via. Isso permitiria reduzir o tempo de paragem nas estações, embora a capacidade no troço Alvalade-Campo Grande fosse mais reduzida (6 000 passageiros/h para três minutos de intervalo) mas maior entre Cais do Sodré e Alvalade (10 000 passageiros/h para três minutos de intervalo).

2 – ainda a questão da linha em Laço
Em reunião com a Junta de Freguesia do Lumiar no início de Maio, o Ministro do Ambiente, Duarte Cordeiro, “tranquilizou-a” assumindo, segundo um comunicado da Junta, que a opção da Linha Circular em detrimento da linha em laço não está ainda fechada, deixando a garantia que a obra em curso permite vir a optar por qualquer uma das duas soluções, ainda em avaliação. Num comunicado emitido posteriormente, o gabinete de Duarte Cordeiro disse que as actuais obras visam a criação da Linha Circular “sem colocar em causa a possibilidade de outros tipos de operação, como o funcionamento habitualmente designado pela expressão ‘em laço’ ou a combinação destes tipos de funcionamento”, sendo que uma “decisão sobre o modelo de operação, simples ou combinado, será definida, a seu tempo, pela Metro de Lisboa, suportada pelos estudos de procura e de operação que o fundamentarão”.

É surpreendente. Trata-se de um assunto a esclarecer; a opção pela linha em laço ou em espiral – como a antiga linha circular do metro de Londres passou a ser em 2009 – dispensaria os complexos trabalhos de construção e ligação aos pré-existentes dos novos viadutos. É o retomar da posição do antigo secretário de Estado José Mendes, que “garantia” que os comboios vindos da linha de Odivelas podiam “entrar” na Linha Circular.
A informação de que disponho – que repito, convém esclarecer – é a de que foram instalados nos viadutos existentes, com todos os inconvenientes para a manutenção e para a comodidade dos passageiros, oito aparelhos de mudança de via que serão deixados na posição de desvio para os novos viadutos, com as lanças fixadas mecanicamente por tirafundos (parafusos) e fora do controle do sistema de sinalização (a eventual inclusão no sistema terá sobrecustos). Se for assim, os comboios circularão ou somente na linha circular ou somente na linha de Odivelas, sendo necessário lá ir tirar os tirafundos e mudar a posição das lanças por não haver comando pelo sistema de sinalização. Não é uma situação muito ortodoxa, mas repito, será a confirmar ou infirmar.
Correcção
Os aparelhos de mudança de via não estarão encravados mecanicamente. O que está adjudicado como sistema de sinalização é o encravamento (“interlocking”) controlar os oito aparelhos de via que estão a ser instalados, para itinerários automáticos apenas para exploração da linha lircular (por exemplo, vindo da Cidade Universitária seguir pela via desviada para Campo Grande/Alvalade), sendo possível itinerários de manobra (velocidade reduzida, exigindo intervenção humana no painel de controle para fazer o itinerário de cada vez) para seguir em frente pela via directa (por exemplo, vindo da Cidade Universitária, seguir para Campo Grande/Odivelas).
Para podermos ter itinerários automáticos na linha em laço, isto é, sem necessidade de intervenção do operador de cada vez que o comboio se aproxima, terá se fazer um investimento adicional para alteração do encravamento, coisa que estimo em 10 milhões, mas posso estar a ser pessimista. No entanto, ter em atenção que por razões de segurança (o itinerário da Cidade Universitária para Campo Grande-Alvalade da linha circular cruza com o itinerário Odivelas-Campo Grande-Cidade Universitária da linha em laço) não deverá misturar-se a exploração da linha circular com a linha em laço, isto é, com a alteração do encravamento poderá explorar-se num determinado período de tempo a linha circular (aparelhos na posição desviada) e depois noutro período a linha em laço (aparelhos na posição directa).
3 – a Linha Violeta
Sobre a Linha Violeta – não de Metro, mas de LRT (Light Rail Transit). Os decisores deixam-se influenciar muito pelo argumento de menores custos, ignorando a sabedoria popular que diz que o barato sai caro, e orgulhosamente apregoam agora a nova linha a que chamam de metro ligeiro que irá do Hospital Beatriz Ângelo em Loures ao Infantado passando por Odivelas.

Dispenso-me de repetir os argumentos que inseri na consulta pública e que certamente serão ignorados, mas noto que o principal inconveniente de um LRT ou “tramway” é o de ter um velocidade comercial baixa para evitar as consequências de um acidente dada a permanente conflitualidade com o tráfego automóvel e pedonal. Temos a experiência do LRT a sul do Tejo. Poderíamos aumentar a velocidade com o recurso a viadutos, mas também acham caro. Se desprezarmos o valor da hora dos passageiros (já dizia a Thatcher, se andas de transporte colectivo é porque és um falhado) e a contabilização das horas perdidas comparativamente com um metro a sério, então sim, é mais barato o LRT.
Só que, entre Odivelas e o Hospital Beatriz Ângelo, num percurso de cerca de 5 km, estão previstos túneis numa extensão de cerca de 3,5 km, o que se compreende dada a orografia do terreno e densidade de construção (estarão a pensar em retomar o método TBM, mais rentável?). Mas então, porque não se prolonga o metro de Odivelas para o Hospital, onde se construiria um parque de estacionamento dissuasor para quem vem da zona de Mafra, Malveira e A8? Seria uma medida de contenção da entrada de automóveis em Lisboa muito mais eficaz do que a pequena linha circular proposta (por curiosidade, a implantação de quatro linhas circulares de Lisboa cabem no interior da linha circular de Madrid).

5 – e o prolongamento da Linha Amarela
A curva incrível a seguir à Praça São Francisco de Assis. Também com muito orgulho (e com o intuito de calar os protestos dos moradores de Telheiras e de reforçar o apoio eleitoral à Junta de Benfica), tem sido propagandeada a proposta extensão de Telheiras a Benfica.
É uma pena que os decisores não tenham um mínimo de experiência na operação ou na manutenção de linhas de metro, e deem ouvidos a quem não a tem. No Metro ainda há técnicos que podiam esclarecer que curvas apertadas desgastam o material, rodados e carril, aumentam o consumo de energia (sim, a tutela do Metro é o Ministério do Ambiente), o tempo de percurso e a incomodidade dos passageiros. A expansão da Linha Amarela é mais uma linha fora de um conjunto coerente em termos de poupança de tempo e energia.

Concluindo… Será um malefício que vem da origem do Metro, em que a “linha da avenida da Liberdade” virava para a avenida Almirante Reis. Depois, a Linha Vermelha, para ir ao Aeroporto, virou também para trás. A Linha Violeta vai fazer um U apertado em Odivelas. E a Linha Amarela/Verde/Circular vai virar do Rato para o Cais do Sodré, em vez de ir à periferia (leia-se: em direcção a Alcântara-Mar, como esteve previsto) buscar pessoas.
Era isso que dizia a Lei n.º 2/2020 – a Lei do Orçamento de Estado de 2020: ir à parte ocidental, ir a Loures. Não foi o que Governo e Metro fizeram, e o Tribunal de Contas ainda em 2020 apôs o seu visto ao primeiro contrato da Linha Circular.

Uns disseram que essa Lei, mais concretamente o seu Artigo 282º, que a Assembleia da República tinha aprovado não era lei, era uma recomendação; e outros disseram que era um cavaleiro aproveitador sobre a lei que a prática jurídica rejeitava… Ou de como é diferente em Portugal o funcionamento regular das instituições… que Júlio Dantas me perdoe (“como é diferente o amor em Portugal”, frase retirada de A Ceia dos Cardeais, 1902, de Júlio Dantas). Mas aguardemos, a esperança custa a fenecer, pode ser que o PROT AML seja actualizado, e dos municípios surjam PMUS (Planos de Mobilidade Sustentável).