A Câmara de Oeiras e o Porto de Lisboa assinaram um acordo para gestão partilhada do Passeio Marítimo de Algés. Um dos aspectos centrais do entendimento é a consolidação da zona costeira entre Algés e a Cruz Quebrada, visando proteger a linha ferroviária e o percurso ciclopedonal, ambos cada vez mais sujeitos à força das marés.

As intempéries do início do mês de Fevereiro, associadas a uma forte actividade marítima, danificaram parte do corredor ciclopedonal do Passeio Marítimo de Algés, junto à Cruz Quebrada. Pouco depois da notícia dos estragos, a Câmara de Oeiras realizou uma limpeza, retirando as pedras e areias, para torná-lo novamente caminhável e ciclável. O percurso está, assim, utilizável, apesar de continuar com avisos e barreiras de betão e com vários buracos (que deverão ser reparados mais tarde).
A Câmara de Oeiras está consciente da fragilidade do referido troço do Passeio Marítimo de Algés por estar tão exposto à força do mar e tem previsto fazer um enchimento substancial da frente marítima, de forma não só a proteger as pessoas que por ali circulam, mas também a linha de comboio. No entanto, o Passeio Marítimo, tal como uma grande parte da frente ribeirinha e marítima de Lisboa a Cascais, não é da responsabilidade dos respectivos municípios, mas antes do Porto de Lisboa. Cabe a esta entidade, nomeadamente à sua Administração, a gestão desse território, incluindo do espaço público em redor das marinas e áreas directamente relacionadas com a actividade portuária.

Ora, as autarquias têm vindo a estabelecer protocolos de gestão partilhada com a Administração do Porto de Lisboa (APL) porque querem ter mão no seu território costeiro. Em Oeiras, essa co-gestão já existe no Passeio Marítimo que se inicia na Cruz Quebrada e percorre o concelho em direcção a Cascais, mas faltava clarificar responsabilidades no troço entre Algés e a Cruz Quebrada, mais conhecido como Passeio Marítimo de Algés. Foi com esse objectivo que Isaltino Morais, Presidente da Câmara de Oeiras, e o Presidente da APL, Carlos Correia, se juntaram na segunda-feira, 19 de Fevereiro. Numa cerimónia no topo da torre portuária do Passeio Marítimo de Algés, foi assinado um contrato para gestão partilhada da frente ribeirinha e marítima de Algés.
Os sonhos adiados ou suspensos
“Este momento é mais importante do que parece. Traduz o atenuar das tensões que muitas vezes existem entre a Câmara de Oeiras e o Porto de Lisboa, e que são naturais”, comentou Isaltino Morais, durante a assinatura do contrato, justificando essa naturalidade com o facto de os municípios terem uma dimensão territorial e populacional, tendo de agradar a essa população e de responder às suas necessidades, enquanto que os portos “têm território mas não têm população” e estão a pensar muitas vezes numa “perspectiva financeira de aumento de receitas”. Mas “estamos a conhecer um bom tempo. O Presidente do APL tem criado as condições adequadas para que a relação entre a Câmara e o Porto sejam melhores”, realçou o autarca de Oeiras, destacando a importância de existirem entendimentos entre as entidades que gerem os territórios e também entre municípios vizinhos, pois não chega a “cordialidade e bom relacionamento dos Presidentes de Câmara”.

Na zona costeiro de Algés, a Câmara liderada por Isaltino Morais quer instalar um Parque Urbano, que integre a realização de grandes eventos como o NOS Alive mas também a imensa procura pela população por aquela zona para desporto e passeios – “É provavelmente o maior pavilhão desportivo a ar livre, são milhares de pessoas todos os dias”, comentou. Quer ter uma marina na Cruz Quebrada/Dafundo, que permita às embarcações de recreio ter um ponto de ancoragem no concelho, de forma a dinamizar a actividade comercial e turística, e “eventualmente uma marina também aqui”, em Algés. “Passam por esta costa mais de 40 mil iates e barcos de recreio a caminho do Mediterrâneo e não param aqui porque não têm condições para tal. As marinas estão longe. Está tudo à espera que sejam criadas condições de acolhimento aqui”, salientou o edil [se olharmos para Lisboa, existem várias marinas ao longo da sua costa; Oeiras também tem planos para uma marina em Paço de Arcos].
Oeiras quer também requalificar a Praia de Algés, tornando-a na primeira praia urbana para quem vem de Lisboa. “A água pode não ter qualidade para banhos, mas não há como evitar que as pessoas venham para ali. Por isso, temos que criar as condições”, disse Isaltino, referindo que a praia pode servir somente para apanhar sol ou meter os pés na água. Já fora da zona de Algés, o Município pretende completar o Passeio Marítimo do concelho, ligando o troço de Algés ao percurso de Cruz Quebrada-Caxias e resolvendo também a descontinuidade entre Caxias e Paço de Arcos, onde, por seu lado, também está prevista uma marina. E pretende criar, junto ao Forte de São João da Barra, o prometido Parque das Fontainhas, uma área verde junto ao mar “para o qual a Câmara já tem um projecto pronto”. “Estas áreas de lazer não vão ser só para Oeiras ou Lisboa. Vão ser para todas as pessoas da área metropolitana de Lisboa”, destacou Isaltino. “Temos de criar condições para que esta margem do Tejo seja de facto uma margem interessante, bonita, e capaz de atrair pessoas para dela usufruírem. A qualidade de vida daqueles que residem e trabalham na área metropolitana de Lisboa depende muito daquilo que fizermos nesta margem direita do rio Tejo.”

Por seu lado, Carlos Correia, Presidente da Administração do Porto de Lisboa, destacou o projecto intermunicipal do Ocean Campus, em que se pretende integrar em 64 hectares da costa ocidental de Lisboa e da frente marítima de Algés/Cruz Quebrada um pólo de empresas e inovação ligada ao mar. É objectivo que este Ocean Campus seja um motor de regeneração urbana. Do lado de Lisboa, Carlos Moedas, Presidente da Câmara, está a avançar com o projecto do Hub Azul na Doca de Pedrouços, mesmo ao lado da Fundação Champalimaund. Será tema para outro artigo.
Voltando ao protocolo assinado entre a Câmara de Oeiras e a Administração do Porto de Lisboa: o documento conta com uma terceira entidade, a Parques Tejo, a empresa municipal de mobilidade do concelho que, à semelhança da sua homóloga EMEL, tem vindo a ganhar uma dimensão de gestão do espaço público. “A Parques Tejo executa a estratégia que o Executivo municipal tem para o território”, explicou Rui Rei, Presidente da empresa, na cerimónia. “Esperamos que até Junho/Julho, toda esta frente tenha uma outra apresentação e disponibilidade de infraestruturas para os munícipes, a par de regulação do estacionamento para todos os que vivem e trabalham.”

Resolver a ciclovia marítima e não só
O principal papel da Parques Tejo nesta relação a três será a da reorganização do estacionamento e respectiva tarifação, numa área que, por ser costeira e por estar a ganhar uma centralidade ao nível do comércio, serviços e emprego, tem sido muito procurada e onde é necessário haver regulação. Após a cerimónia, Isaltino Morais esclareceu aos jornalistas que existe “uma grande pressão” de estacionamento, não só pela presença da Fundação Champalimaund, “mesmo aqui ao lado”, mas também pela existência do terminal rodoviário e pela oferta alargada de comércio e restauração da baixa de Algés. “É fundamental ampliar a capacidade de estacionamento deste lado [da linha de comboio, naturalmente articulando bem o transporte individual com o colectivo”, declarou. Por outro lado, “há cada vez mais pessoas a estacionarem durante o dia inteiro, mas o estacionamento deveria ser rotativo”, pelo que o aumento da capacidade será “feito sobretudo pela racionalização desse estacionamento”, apontou o autarca. “Mas o protocolo não é só estacionamento.”
Um dos pontos centrais é, segundo Isaltino, o enchimento da zona costeira entre a Cruz Quebrada e Algés para, de certo modo, prolongar o terrapleno que já existe onde se realiza anualmente o festival NOS Alive. “Neste momento, quando há marés vivas aqui na Cruz Quebrada, já é atingido o caminho de ferro. Com as alterações climáticas e a ocorrência de mais fenómenos extremos, não estamos livres de que haja uma maior violência ao nível das marés vivas, que possa, de alguma forma, fazer colapsar o caminho-de-ferro”, adiantou o Presidente da Câmara de Oeiras.





O preenchimento do terrapleno de Algés à Cruz Quebrada está previsto no âmbito do Ocean Campus, sendo que o Município já está a trabalhar na primeira fase dessa empreitada. “Numa primeira fase, a ideia é encher mais ou menos até meio do esporão e depois, numa segunda fase, estamos a procurar articular isso com o estudo do Ocean Campus”, explicou o edil. “A Câmara Municipal, em conjunto com o Porto de Lisboa, já tem um parecer favorável da APA [Agência Portuguesa do Ambiente] para fazer algum enchimento do fundo e repor aquilo que ao longo de décadas foi sendo retirada”, até porque, segundo Isaltino, “desde as cheias de 1983 – penso que mais ou menos nessa altura – nunca mais foi reparado” o esporão da Cruz Quebrada (estrutura que tem a função de proteger o litoral e contrariar o recuo da linha de costa). “Portanto, esse facto faz com que vá saindo areia e que toda esta zona tenha ficado desprotegida.”
Mas, enquanto essa reparação não é feita, nem o consequente enchimento da zona costeira, é tempo de fazer “arranjos mais imediatos, paliativos, que proporcionem a circulação no espaço pedociclável” do Passeio Marítimo de Algés – o que “vai ser salvaguardado naturalmente pelo Município de Oeiras, como, aliás, o é todos os anos”, acrescentou a Vereadora da Mobilidade e Obras Municipais, Joana Baptista. Quanto à terraplanagem, “nós neste momento estamos em fases de estudos, juntamente com a Administração do Porto de Lisboa, não só em relação ao canal pedociclável, que as marés vivas danificaram, mas também, e mais importante ainda, no que respeita a uma linha ferroviária que pode ser danificada, colocando em causa a segurança de pessoas e bens se não houver obras de contenção nesta periferia entre a Cruz Quebrada/Dafundo e Algés”, reforçou a responsável, explicando que ainda não há prazos para a concretização dessas obras e sublinhando a dificuldade para “concretizar” quando que é preciso colocar em diálogo diferentes entidades, como a APL, a APA e ainda a CCDR-LVT (Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional de Lisboa e Vale do Tejo).
No prolongamento da linha de costa entre Algés e Cruz Quebrada, o Município de Oeiras “não quer construção nenhuma. O que se pretende é que esta zona desde onde se realiza o Alive até a Cruz Quebrada seja um espaço destinado a equipamentos de lazer e desportivos”, como campos de voleibol ou cestos de basquetebol. As construções no âmbito do Ocean Campus serão entre a Fundação Champalimaund, em Lisboa, e o Passeio Marítimo de Algés, onde acontece o NOS Alive.

Um penso rápido
Para Isaltino Morais, o protocolo agora firmado entre a Câmara e a APL é uma espécie de penso rápido, até que não fiquem clarificadas as competências de cada parte no que diz respeito ao território costeiro, “que vai daqui até ao Jamor”. “Saiu a lei da descentralização, onde se define que as zonas de gestão portuária sem interesse portuário passariam a ser geridas pelos municípios”, mas o Ministério das Infraestruturas “demorou muito tempo a elaborar o despacho que cria o grupo de trabalho (finalmente foi criado) que, por seu lado, vai definir as condições em que aqui em Oeiras essa transferência vai ser feita, como já aconteceu em Lisboa”. “As praias, por exemplo, já estão sob gestão do Município. Os equipamentos de apoio balnear também já transitaram. Mas, no que diz respeito à gestão do território propriamente dito, ainda falta definir”, esclareceu o Presidente da Câmara.
“É óbvio que essa transferência tem de ser rápida, porque na realidade há um conjunto de obras que são condicionantes de tudo o que possa acontecer aqui. Por exemplo, a regularização da Ribeira de Algés”, que depende de três municípios – Amadora, Oeiras e Lisboa; “a foz da ribeira já é em Lisboa” – e também do Governo, através da APA. “A regularização da Ribeira vai ser determinante, por exemplo, para a instalação da NOVA IMS”, faculdade de estatística e análise de dados da Universidade Nova de Lisboa. “É uma instituição de grande prestígio, que tem três ou quatro mil alunos já e que vai mudar-se para ali. Mas para mudar-se para ali é preciso regularizar o curso de água.”
Isaltino diz que até pode ser a Câmara de Oeiras a fazer as obras necessárias na foz da ribeira de Algés, que já fica no município vizinho, “se porventura as Câmaras de Lisboa e Oeiras e a APA se entenderem e determinarem que o responsável pela obra é a Câmara de Oeiras, mas que pagam todos”. “A definição e a regularização daquela ribeira é determinante para tudo o que vai acontecer a jusante. Tal como o enchimento aqui do terrapleno até lá abaixo. Sem isso, não é possível fazer o que quer que seja”, concluiu, em declarações aos jornalistas.