A ciclovia que liga Cacilhas à Cova da Piedade, ao longo da Avenida Aliança Povo MFA, foi melhorada no início do ano. A autarquia colocou pilaretes e pintou as intersecções, mas quem utiliza a bicicleta como meio de transporte gostaria de ter visto uma obra mais ambiciosa.

Entre muito perto do terminal de transportes de Cacilhas e a malha urbana da Cova da Piedade/Centro Sul, existe uma ciclovia que ora se assume enquanto tal, ao nível da estrada, ora existe no passeio, num regime de partilha com peões. O percurso foi criado há mais de duas décadas e um troço do mesmo foi recentemente requalificado pela Câmara de Almada, na sequência de um Orçamento Participativo.
O troço renovado insere-se na Avenida Aliança Povo MFA, onde a pista ciclável se desenvolve ao nível da estrada através de dois canais unidireccionais. Aqui, a Câmara de Almada colocou pilaretes de borracha para segregar o tráfego ciclável da restante circulação rodoviária (antes essa separação era feita apenas com uma linha branca). Foram ainda pintados pictogramas de bicicleta foram pintados ao longo do percurso e os atravessamentos cicláveis passaram a ter a cor verde (Almada decidiu alinhar a cor da infraestrutura ciclável com Lisboa, onde as ciclovias também são verdes).
Uma proposta do Orçamento Participativo
A segurança ao pedalar na Avenida Aliança Povo MFA terá sido reforçada com a recente intervenção. Por um lado, a implementação de balizadores para delimitar a ciclovia deverá contribuir significativamente para reduzir a velocidade de carros e autocarros, que passaram a ter um canal viário mais reduzido dado que deixam de conseguir tão facilmente “pisar” a ciclovia. Esta acalmia será benéfica para quem também pedala. A cor verde nos atravessamentos também ajudará a destacar o canal ciclável no espaço rodoviário. No entanto, quem utiliza a bicicleta como meio de transporte em Almada – e também esta ciclovia em particular – gostaria de ver mais ambição por parte da Câmara – até porque foi isso mesmo que foi pedido numa proposta vencedora da primeira (e, até agora, única) edição do Orçamento Participativo do concelho, que se realizou em 2021.
Para Margarida Carvalho, autora da proposta, uma das cinco seleccionadas, é fundamental melhorar a circulação de bicicletas entre Cacilhas e a Cova da Piedade/Centro Sul, “dois pólos importantes de transportes públicos”, com os quais as duas rodas podem dialogar e ser um complemento. “É preciso melhorar radicalmente as condições de segurança desse percurso, que no presente momento não existem”, aponta ao LPP. “Essa foi a razão da proposta do Orçamento Participativo.”




Na ideia apresentada (e seleccionada), Margarida pedia a reabilitação do eixo ciclável entre Cacilhas e o Centro Sul, passando pela Avenida Aliança Povo MFA, mas também pelos troços onde a ciclovia é assumida no passeio em partilha (e conflito) com peões. Sugeria-se um piso novo, diferenciado e elevado da estrada para que não se confundisse com esta e permitisse um escoamento eficiente de água. “Permitirá uma utilização da bicicleta, para pessoas de todas as idades poderem pedalar em segurança e com conforto entre as zonas residenciais da Cova da Piedade, para além de melhorar a oferta de turismo no concelho”, escrevia Margarida no texto da proposta.
Ao LPP, a jovem de 30 anos acredita que “uma mobilidade sustentável é uma condição para atractividade e sucesso de qualquer município” e não tem dúvidas que que um corredor seguro entre Cacilhas e o Centro Sul, que é uma zona plana, “motivará um elevado número de futuros praticantes”. “A procura por mobilidade sustentável tem tido noutros concelhos um maior apoio, visível com a adaptação das vias existentes a estas novas formas de mobilidade ligeira. No entanto tal não se verifica em Almada, por conseguinte não é visível”se lamente-t-il.
Sem ligação a Cacilhas e sem resolver os problemas na malha urbana da Cova da Piedade

A requalificação realizada na Avenida Aliança Povo MFA responde a alguns objectivos do Orçamento Participativo e foi enquadrada neste âmbito, com um orçamento dedicado de cerca de 50 mil euros; mas não deixa de ser uma obra menos ambiciosa que a proposta original de estabelecer um corredor contínuo e coerente ao longo de uma zona central do concelho almadense. Para alguns utilizadores de bicicleta, ouvidos pelo LPP, o troço reabilitado “não chega nem à interface de transportes de Cacilhas, nem ao centro urbano da Cova da Piedade e muito menos, ao Centro Sul”.
E dizem: “É uma infraestrutura que se torna insegura por não ligar nada a nada.” Criticam não ter sido feito nada para resolver um dos problemas antigos da infraestrutura: as deficiências ao nível de escoamento de água das chuvas. Quando chove, a ciclovia é a única parte dessa avenida que fica alagada, dificultando a circulação de bicicletas mesmo nos dias soalheiros seguintes. “O melhoramento da ciclovia devia ter em conta este aspecto, pois no Inverno é frequente os ciclistas circularem pela estrada pelo alagamento da ciclovia”, apontam. Mas há pontos positivos. “Uma das melhorias que se nota é que com a instalação dos pilaretes parece induzir uma percepção de menor largura da via e, pelo menos, os autocarros andam a velocidade mais reduzida sem ser 60/70kmh”, notam.
Uma das críticas mais substanciais é não ter sido feita, aquando da requalificação do Largo de Cacilhas, concluído em 2023, uma ligação ciclável directa ao terminal fluvial e rodoviário. Em 2020, quando a obra foi anunciada, um grupo de ciclistas urbanos de Almada enviou à Câmara recomendações nesse sentido, não tendo recebido da autarquia qualquer resposta.
Na malha urbana da Cova da Piedade, também há problemas, como a Estrada do Brejo, onde o estacionamento abusivo de automóveis em cima de um contra-fluxo ciclável ditou, na prática, a desactivação da conectividade entre Cacilhas e a Cova da Piedade/Parque da Paz/Centro Sul. “É necessário sensibilizar e trabalhar soluções com os moradores e os negócios locais (oficina automóvel, restauração e supermercado) e sobretudo fiscalizar o estacionamento indevido”, apontam os utilizadores. “Aliás, por toda a cidade de Almada, a WeMob deveria intensificar e alargar o horário de fiscalização, para que os passeios não estejam sempre ocupados por automóveis.”




E as metas?
Quem utiliza a bicicleta para se deslocar no concelho de Almada, fazendo-o ou não em conjunto com o transporte público, gostaria de sentir o Município comprometido com as metas nacionais em relação à mobilidade ciclável, que estão estabelecidas na Estratégia Nacional para a Mobilidade Ativa Ciclável (ENMAC). Não têm dúvidas de que “não alcançará as metas da ENMAC, que prevê que em 2025 haja uma quota de 4% de viagens em bicicleta na cidade de Almada e de 10% até 2030”.
“Almada não tem um plano de mobilidade, e não se percebe qual a visão e as medidas que se pretendem tomar neste âmbito”, concluem. Ainda assim, a intervenção realizada nesta ciclovia insere-se num plano da Câmara de Almada para recuperar os antigos corredores cicláveis do concelho. Em Setembro de 2023, no contexto da Semana Europeia da Mobilidade, o Município iniciou a revisão do seu plano de ciclovias de 2005, que nunca chegou a ser concluído, mas vai ao mesmo tempo reabilitar o eixo entre a Trafaria e a Costa da Caparica, actualmente bastante degradado, bem como o eixo entre Cacilhas, o Parque da Paz e Corroios, no qual se insere este troço da Avenida Aliança Povo MFA.