Comboios de bicicletas crescem na área metropolitana de Lisboa e chegam a Almada

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Em Almada também já há “comboios de bicicleta” a levar crianças à escola. Depois do sucesso em Lisboa, os CicloExpressos atravessaram o Tejo e circulam quarto vezes por semana no concelho vizinho.

CicloExpresso na Costa da Caparica (fotografia LPP)

Depois do sucesso em Lisboa, os “comboios de bicicleta” atravessaram o Tejo e já circulam no concelho de Almada. Numa primeira fase, o projecto está disponível em três escolas, com quatro circulações semanais no total – duas em Almada e duas na Costa da Caparica. Pretende-se experimentar esta ideia, mas, dada a elevada adesão que está a ter, pelo menos, na Costa, podemos arriscar e dizer que os “comboios” vieram para ficar.

Os “comboios de bicicleta” ou CicloExpressos consistem em viagens de bicicleta para a escola, em que as crianças (“passageiros”) pedalam em grupo, acompanhadas por adultos (“maquinistas”) que receberam formação específica para esta actividade. Nos “comboios” podem também participar pais, professores e outros membros da comunidade escolar. Funcionam como um serviço de transporte, tendo, como um comboio normal, paragens e horários definidos onde os passageiros apanham o comboio com a sua própria bicicleta.

Fotografia LPP

No concelho de Almada, os “comboios de bicicletas” já circulam para a EB nº 2 da Costa da Caparica, às terças e quintas na Costa da Caparica, e para a EB1 Cataventos da Paz e EB 2,3 D. António da Costa, às quartas na cidade de Almada. Este projecto é promovido pela Câmara de Almada e operacionalizado pela cooperativa Bicicultura, responsável pelo projecto dos CicloExpressos em várias cidades, incluindo Lisboa. As circulações são asseguradas por “maquinistas” adultos, com formação especializada, sendo que a Bicicultura está a aceitar candidaturas espontâneas para esta posição (que é remunerada).

Para inscrever uma criança no comboio, basta fazê-lo neste formulário.

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“Depois de bastante experiência acumulada com o caso de Lisboa – é importante explicar que Lisboa foi quem deu uma aposta grande quando o CicloExpresso ainda não era um conceito estabilizado como se calhar já é hoje –, decidimos que fazia sentido testar esta implementação noutros sítios. Achávamos que tínhamos todas as condições para o fazer, mas para ser mais simples candidatámos a uma linha de financiamento do Fundo +PLUS da Casa do Impacto, da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa”, explica Luís Vieira, principal coordenador do projecto CicloExpressos na Bicicultura. Do Fundo +PLUS, receberam cerca de 40 mil euros para lançar 10 linhas de comboios em cinco outras localidades, para além de Lisboa. “Estamos a conseguir alcançar os pressupostos a que nos dispusemos”

Um ano depois de lançado o desafio de expansão, os “comboios de bicicleta” já circulam em Braga, em Leiria e, em breve, também em Matosinhos; e, na área metropolitana de Lisboa (amL), chegaram à Amadora, a Loures e agora a Almada. [Também há CicloExpressos em Aveiro, dinamizados por uma associação local, a Ciclaveiro.] “Estes 40 mil euros de financiamento da Casa do Impacto têm-nos permitido oferecer aos municípios a implementação do projecto a um valor mais baixo, cativando-as desta forma a testarem os CicloExpressos nas suas localidades.” Na Amadora, a linha existente funciona em Alfragide, abrangendo quatro escolas: EB1 Alfragide, EB1 Alto do Moinho, EB2,3 Almeida Garrett e EB1 Quinta Grande. “Esta linha foi uma reactivação de um comboio informal, o CicloExpresso de Alfragide, que acontecia pela vontade de uma mãe e que tinha deixado de funcionar.” Em Loures, funciona às quintas-feiras uma linha para a EB da Bobadela. “É um projecto particular, porque foi implementado não por uma Câmara Municipal, mas directamente por uma Junta de Freguesia”, a da União de Freguesias de Santa Iria de Azóia, São João da Talha e Bobadela.

Fotografia LPP

“O nosso grande desafio passa pela capacitação dos elementos locais”, conta Luís, explicando que a Bicicultura já tinha uma equipa em Lisboa capaz de fazer CicloExpressos mas que agora precisam de levar esse conhecimento acumulado para as novas geografias. “Estamos a desenvolver um processo cada vez mais focado na contratação e capacitação de pessoas das várias localidades, que já conhecem o território e que estão por dentro das dinâmicas locais.” Luís detalha que há diferenças claras ao nível da operação dos “comboios” de que a Bicicultura se está a aperceber à medida que sai de Lisboa. “O contexto não é o mesmo que nós temos normalmente em Lisboa; há circunstâncias diferentes às quais nós temos de nos adaptar. Por exemplo, em Leiria, estamos a fazer pela primeira vez comboios de bicicleta num ambiente rural, algo que nunca tinha sido implementado por nós. Temos vindo a conseguir aprender com todos estes contextos e acho que o sucesso tem sido generalizado.” Mais há um denominador comum: “Praticamente todos os contextos em que estamos são de maturidade baixa de mobilidade ciclável, ou seja, são contextos em que a percentagem de crianças que vão para a escola de bicicleta por si só é bastante reduzida.”

O primeiro “comboio de bicicleta” foi criado em 2015 por um pai, que decidiu começar a levar o seu filho e os filhos de amigos para a escola de bicicleta, no Parque das Nações, em Lisboa. A ideia pegou de tal forma – logo no primeiro dia foram transportadas 12 crianças – que a Câmara de Lisboa decidiu adoptá-la. Desde o ano lectivo 2020/21 que os “comboios de bicicleta” ou CicloExpressos são um programa municipal de mobilidade escolar em Lisboa. Em 2020/21, foram lançados “comboios” em 11 escolas; actualmente estão presentes em 25 estabelecimentos de ensino. Em cada um deles, existe geralmente uma circulação por semana, uma vez que a ideia é que a deslocação de bicicleta para a escola seja percepcionada pelas crianças como algo excepcional – e, por isso, apetecível – e não rotineiro – e, por isso, aborrecido. No ano lectivo 2021/22, realizaram-se em Lisboa 220 circulações de comboios (802 km) e foram transportadas 1465 crianças.

Os “comboios de bicicleta” têm provado o seu sucesso em especial entre o 1º Ciclo. É nas linhas dirigidas a essas faixas etárias que se regista maior adesão por parte das crianças e dos seus pais. “Temos algumas ideias do porquê. É onde este tipo de actividade se enquadra melhor do ponto de vista da adequação do nível de dificuldade, ao grau de autonomia que estas crianças já têm e às vontades e logísticas familiares”, esclarece Luís. Duas das três linhas lançadas no concelho de Almada são dirigidas ao 1º Ciclo. É o caso da da EB nº 2 da Costa da Caparica, que circula às terças e quintas e que, no dia de estreia, registou cerca de 20 participações – mesmo com uma véspera chuvosa. O sucesso surpreendeu Inês de Medeiros, Presidente da Câmara de Almada, que recebeu o CicloExpresso à chegada à escola.

Inês de Medeiros, Presidente da Câmara de Almada (fotografia LPP)

Para Medeiros, este género de iniciativas “relembram às pessoas que, quando nós apelamos a uma mobilidade mais suave, a que as pessoas andem mais a pé ou de bicicleta, isso não é nada de muito extravagante. É só que retomem hábitos que já todos nós tivemos há uns tempos atrás, quando havia menos carros. Para a autarca almadense, na base deste projecto estão “preocupações ambientais e de saúde pública”, mas os CicloExpressos são também um exemplo de que podemos recuperar o controlo sob as nossas vidas e “criar tempos de transição, para não ser apenas esta transição às vezes muito brusca e violenta entre a casa e a escola ou entre a casa e o trabalho”. A luta climática é “é uma luta também por uma qualidade de vida que acho que todos nós temos que conseguir reencontrar ou construir de raiz”.

Luís Vieira vai mais longe: os CicloExpressos para a escola querem funcionar como um “agente motivador e capacitador” para mais crianças começarem a ir para a escola de bicicleta de forma autónomo. “O que nós pretendemos é dar o impulso, ou seja, criar aqui uma acção que promove a reflexão por parte das crianças e principalmente por parte das famílias”, explica. “Temos vindo a receber ao longo destes anos histórias de crianças que pegaram pela primeira vez na bicicleta que estava na garagem ou de filhos que pediram aos pais para aprender a andar de bicicleta porque a colega da escola vai de bicicleta.”

Luís Vieira, coordenador dos CicloExpressos (fotografia LPP)

O engenheiro civil de 30 anos que se tornou especialista em mobilidade acredita nos “efeitos indirectos” destas viagens de crianças em grupo para a escola: “Nos outros dias da semana, em que não há comboio, as crianças e os pais têm mais tendência para começar a usar a bicicleta como forma de mobilidade, a pensar na bicicleta para além de uma possibilidade de lazer – nada contra, mas o lazer não inclui todo o potencial que a bicicleta pode ter.”

“Para além disso, nós também percebemos que isto é uma acção também para as pessoas que estão na rua, para começarem a ver bicicletas na rua e crianças na rua”, aponta. “As crianças e as famílias poderem ir de forma autónoma e segura para a escola em função dos seus ritmos, mas nós sabemos que para chegar lá há aqui factores importantes que têm que ser desbloqueados. E um dos principais motivadores de segurança é o número: quanto mais pessoas usarem esta forma de mobilidade, mais previsível é que haja pessoas a usar esta forma de mobilidade, pelo que todos os utentes do espaço público estarão preparados e vão negociar sem tantos imprevistos.”

Fotografia LPP

Em Almada, os “comboios de bicicleta” vão circular até ao final do presente ano lectivo e regressarão no início do próximo. A Presidente da Câmara de Almada discutiu com os elementos da Bicicultura algumas ideias para o futuro da iniciativa no concelho, como a sinalização das paragens e dos locais de passagem, até para esses elementos servirem de sensibilização aos automobilistas. Na primeira circulação do CicloExpresso na Costa da Caparica não se registaram imprevistos, mas a passagem das crianças foi causando alguma estranheza ainda na cidade. Será uma questão de tempo, até porque os CicloExpressos em Almada parecem ter chegado para ficar.

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