Inconformados com a falta de lugares para sentar (sem consumo obrigatório) na principal praça da Penha de França, Marta e Francisco meteram mãos à obra e repuseram as 32 cadeiras suprimidas durante a pandemia. Mas os novos assentos não duraram muito tempo.

Em 2020, a pandemia de Covid-19 conduziu a vários exageros mediáticos por parte de autarquias. Na Penha de França, a Junta de Freguesia decidiu arrancar as mesas e cadeiras da Praça Paiva Couceiro, de modo a evitar aglomerações de pessoas. Se é verdade que outras medidas mais ligeiras poderiam ter sido tomadas naquela situação – como vedar o espaço e colocar sinalética, algo feito em tantas outras partes da cidade e do mundo –, à data a solução mais extrema parece ter sido compreendida e aceite pela população.
Três anos depois, as cadeiras e mesas retiradas não foram totalmente repostas. Segundo jornal Mensagem de Lisboa, das 48 cadeiras que existiam na Paiva Couceiro, antes da pandemia, apenas 16 foram devolvidas entretanto à praça. Face a essa situação, dois jovens, moradores da freguesia, decidiram repor os assentos em falta. Recolhendo cadeiras que foram encontrando no lixo, na rua ou que lhes foram entregues por amigos e conhecidos, Marta e Francisco colocaram 32 cadeiras na Praça Paiva Couceiro na manhã desta quarta-feira, 13 de Setembro. Decoraram os espaço com “bandeiras de arraial”. E, para contextualizar a acção, afixaram ainda um painel entre duas com a seguinte mensagem: “Pelo direito ao sentar.”

Numa página de Instagram que criaram para esta iniciativa – @infraestruturapublica –, Marta e Francisco diziam estar a “exigir que nos devolvam o que nos tiraram”, e convidavam a população a usufruir das novas cadeiras da Praça Paiva Couceiro, colocadas nos espaços ocupados pelas anteriores:
Senta-te aqui. Temos o direito a sentar. A sentar em espaços que não sejam de consumo. Queremos sentar-nos para conversar, descansar, jogar, comer, ler. Usamos o espaço público como um espaço de passagem quando também é um espaço de estar. A cidade está desenhada para maximizar o rendimento e a mobilidade. Um banco pode mudar isto. Os bancos públicos são um objeto estrutural à cidade. Mantêm comunidades.
Os nossos bancos são, com o tempo, silenciosamente substituídos por cadeiras de restauração. O espaço público, que é nosso, se não reclamado e ocupado continua a ser privatizado todos os dias. As nossas praças e ruas são ‘‘espaço público de propriedade privada’’ porque estão ocupadas com esplanadas de restaurantes, mupis publicitários, carros.
Dos novos bancos instalados pelas freguesias muitos estão a ficar sem encosto, muitos estão a transformar-se em cadeiras individuais espaçadas, muitos estão agora com apoios de braços que não são para descansarmos os nossos braços mas para não nos deitarmos neles. Os bancos que nos dão, e os que não nos dão, são hostis para pessoas com crianças, em situação de sem-abrigo, idosos, grávidas, todos nós.
@infraestruturapublica/Instagram
Os assentos improvisados estiveram na Praça durante toda a manhã de quarta-feira, mas foram retirados perto da hora de almoço pela equipa de limpeza da Junta da Penha de França, acompanhada por agentes da PSP, por terem colocadas sem autorização.

À Mensagem de Lisboa, a Junta explicou que o reforço do espaço público é um dos seus objectivos, que repôs uma parte das cadeiras e que propôs, em Dezembro de 2021, uma nova distribuição do restante mobiliário urbano à Câmara de Lisboa, aguardando desta um parecer positivo para proceder à instalação. Até lá, a Praça Paiva Couceiro continuará despida, apenas com 16 cadeiras e quatro mesas, e com uma ampla esplanada onde só será possível sentar consumindo qualquer coisa no quiosque adjacente.