Opinião.
A validação das assinaturas faz parte do processo normal e não existe para criar suspeitas, mas para garantir que, num mecanismo burocrático como este, os erros sejam eliminados e se garanta o número mínimo de assinaturas legalmente previsto.
![](https://lisboaparapessoas.pt/wp-content/uploads/2024/12/assinaturasreferendoal_01.jpg)
Em 2022, o Movimento Referendo pela Habitação decidiu avançar para algo inédito – realizar o primeiro referendo local por iniciativa popular da história da nossa Democracia.
Desde o início que soubemos que não ia ser fácil porque:
- o mecanismo de referendo local, legalmente previsto, é extremamente burocrático, exigindo a recolha apenas presencial (e não online) de assinaturas. Isto acarreta uma imprevisível dose de erro humano e um esforço gigante do movimento. Somos pessoas que trabalham e este método exigiu muitas horas na rua a recolher assinaturas e, portanto, muito tempo entre o início das recolhas e o momento da entrega;
- o referendo iria versar sobre o Alojamento Local, indo contra lobbies poderosos, com ligações institucionais, partidárias e jornalísticas. Desde cedo que começámos a receber ameaças nas redes sociais, numa atitude claramente antidemocrática e intimidatória. Nada disto nos deteve porque não só estamos a usar um instrumento legalmente previsto, como temos a força das milhares de pessoas que acreditam na proposta.
Neste árduo processo, recolhemos 11 000 assinaturas, das quais 6 528 seriam de eleitores de Lisboa. Tentámos sempre garantir a validade destas subscrições, explicando claramente que dados precisávamos e para quê.
Após entrega destas assinaturas na Assembleia Municipal de Lisboa (AML) a 8 de Novembro, estas seguiram, como previsto, para o Ministério da Administração Interna (MAI) para serem validadas. Sabíamos que poderiam ocorrer erros, normais num processo deste género. Do MAI foi-nos informado que das 6 528 assinaturas entregues, 4 863 eram de eleitores de Lisboa – estávamos, por isso, a 137 assinaturas do mínimo exigido por lei (5 000) para entregar uma proposta de referendo local em Lisboa
O que se passou, então, com as assinaturas não validadas? De acordo com o relatório:
- 843 são de eleitores não recenseados no município de Lisboa – com a crise habitacional, vimos centenas de pessoas a serem expulsas da cidade, e sabíamos que isso poderia comprometer algumas assinaturas – ou seja, pessoas que em tempos estiveram efetivamente recenseadas mas que entretanto tiveram de sair da cidade. É a prova de que a crise habitacional é também uma crise para a própria democracia participativa. Para além disso, apesar de questionarmos sempre as pessoas que assinavam se eram eleitoras em Lisboa, não podíamos garantir a ausência de erros neste ponto e por isso quisemos sempre entregar mais de 5 000 assinaturas, para acautelar possíveis anulações;
- 12 são de pessoas falecidas – num universo de mais de 6 500 pessoas, e tendo nós começado a recolher a 17 de dezembro de 2022, é normal que algumas pessoas tenham entretanto falecido;
- Em 570 assinaturas “não foi possível identificar os eleitores” – temos reservas neste ponto pois não sabemos quais as razões para a não validação. São questões de legibilidade que dificultam a identificação? São erros no tipo de documento introduzido? A impossibilidade de averiguar a invalidação de meio milhar de assinaturas gera dúvidas.
- 240 subscritores encontravam-se em duplicado – esta afirmação no relatório é pouco clara pois não percebemos como foram contadas estas assinaturas, uma vez que aqui se fala de subscritores e não de subscrições.
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É importante realçar que a validação das assinaturas pelo MAI faz parte do processo normal e não existe para criar suspeitas, mas para garantir que, num mecanismo burocrático como este, os erros sejam eliminados e se garanta o número mínimo de assinaturas legalmente previsto.
Posto isto, foi com alguma estupefação que vimos algumas notícias e ataques nos últimos dias. Apenas quem nunca recolheu assinaturas manualmente, ou não percebe como o processo é feito, pode achar que as falhas apontadas no relatório não são facilmente explicadas pelas razões que acima referimos.
Porém, não nos iludamos – isto é uma tentativa concertada de silenciar um processo legalmente previsto, e apoiado por mais de 11 000 pessoas. Os argumentos podem parecer risíveis, mas num país historicamente com baixa participação cívica, os riscos para a democracia participativa de uma manobra de intimidação deste género deverão deixar toda a gente alerta. Ter medo de um referendo é ter medo de uma ferramenta democrática que incentiva a participação popular.
As acusações que foram sendo feitas são um ato desesperado de quem não conseguiu vencer pela via da narrativa nem pela via política. Ainda assim, não desistimos. Por isso, em 24 horas recolhemos mais 612 assinaturas que já entregámos na AML para ultrapassar o mínimo de 5 000 assinaturas necessárias para dar continuidade ao processo.
Imensas pessoas mobilizaram-se para recolher assinaturas, para assinar ou para partilhar entre as suas redes de contactos. A onda de mobilização mostrou-nos que Lisboa está viva e que quer pronunciar-se sobre o Alojamento Local.
Em conjunto vamos continuar a lutar pelo Referendo pela Habitação. De coração cheio, um grande agradecimento a toda a gente que se envolveu, que assinou, e que manifestou a sua solidariedade nos últimos dias. Seguimos lutando. Em conjunto, pela cidade de Lisboa!
Recuperar Lisboa está nas nossas mãos!