Opinion.
A bicicleta ainda nรฃo รฉ incentivada na “Cidade do Rock”, mas poderia ser uma forma de descongestionar os autocarros, servindo como meio de transporte para o รบltimo quilรณmetro atรฉ ao recinto.

Quando o Sporting joga em casa, รฉ habitual as estaรงรตes GIRA junto ao Estรกdio de Alvalade ficarem cheias, dificultando para quem chega mais prรณximo do inรญcio do jogo encontrar uma doca livre. Por vezes, existem equipas da EMEL a fazerem o chamado balanceamento da rede: pegam nas bicicletas que estรฃo nas estaรงรตes cheias e transportam-nas, em carrinhas, para estaรงรตes mais vazias e afastadas. Mas nem sempre isso acontece, o que tambรฉm nรฃo รฉ mau de todo porque no final do jogo hรก bicicletas para ir para casa, pelo menos para os primeiros que saรญrem do estรกdio.
O Estรกdio Josรฉ Alvalade รฉ o estรกdio portuguรชs melhor servido por um sistema de bicicletas partilhadas. Nas imediaรงรตes, encontramos quatro a oito estaรงรตes, dependendo do quanto queiramos andar a pรฉ (nunca mais que 10 minutos). Situaรงรฃo bem diferente encontramos no Estรกdio da Luz, onde existem apenas duas estaรงรตes GIRA na proximidade, num total de 34 docas (em Alvalade, com as oito estaรงรตes temos 134 docas).
ร claro que estes nรบmeros sรฃo pequenos quando estamos a falar de estรกdios com capacidade para 50 ou 65 mil pessoas, e de jogos que atraem muitas vezes a capacidade mรกxima. Mas รฉ interessante olharmos para a GIRA num contexto mais amplo โ como uma peรงa importante no complexo puzzle que รฉ a mobilidade de uma cidade em dia de um grande evento. Ter GIRA junto a um grande evento deve importar, como importa ter outras opรงรตes de mobilidade suave partilhada (nomeadamente trotinetas e bicicletas privadas), transporte pรบblico com frequรชncia e capacidade, e tambรฉm algumas opรงรตes de estacionamento conjugadas com as primeiras duas.
Vem esta (longa) introduรงรฃo a propรณsito do Rock In Rio, que decorreu em Lisboa no passado fim-de-semana e que vai continuar no prรณximo. A EMEL decidiu fechar as trรชs estaรงรตes GIRA mais prรณximas do recinto, num total de 53 docas. Se รฉ certo que, tal como num estรกdio de futebol, 53 docas de bicicletas partilhadas รฉ pouco para um evento de 80 mil pessoas por dia, essas 53 docas poderiam ser multiplicadas por quatro, cinco ou atรฉ mais com um contรญnuo balanceamento do sistema, colocando carrinhas a transportar as bicicletas das estaรงรตes cheias para as mais vazias. Junto ร s estaรงรตes, poderiam estar monitores a auxiliar os utilizadores e inclusive a guardar as bicicletas que nรฃo coubessem nas estaรงรตes por estas estarem todas as docas cheias.


Havendo ciclovias directas, contรญnuas e segregadas para a “Cidade do Rock” a bicicleta poderia ser utilizada como meio de transporte, no รบltimo quilรณmetro a partir da Gare do Oriente. E, quando falamos de bicicleta, nรฃo falamos apenas das partilhadas, mas das bicicletas individuais. No Primavera Sound no Porto, uma cidade com menor maturidade ciclรกvel que Lisboa, existe, dentro do recinto, um grande estacionamento para as bicicletas dos festivaleiros. O Rock In Rio, apesar de se afirmar dentro dos vectores da sustentabilidade, ainda nรฃo abraรงou a bicicleta na sua estratรฉgia de mobilidade, ficando-se por parceiras com os mais diversos operadores de transporte. Se รฉ certo que um metro, um comboio ou atรฉ um autocarro tรชm capacidade de mover mais pessoas que um sistema de bicicletas partilhado, este pode ser uma alternativa que ajuda a descongestionar o transporte pรบblico.

Afinal de contas, no primeiro fim-de-semana de Rock In Rio โ e com todas as restriรงรตes ร circulaรงรฃo rodoviรกria nas imediaรงรตes do recinto (uma medida acertada) โ, os shuttles em autocarros da Carris e da Carris Metropolitana, entre a Gare do Oriente e o festival, provaram ser insuficientes para toda a procura. Com autocarros de hora a hora a chegar ร estaรงรฃo de comboio mais prรณxima, a de Sacavรฉm, muitas pessoas optaram por ir a pรฉ, outras nas opรงรตes partilhadas da Lime e Bolt.
A EMEL e o Rock In Rio perderam uma oportunidade de se mobilizarem na promoรงรฃo da bicicleta como mais uma opรงรฃo de mobilidade, a juntar a todas as outras, aproveitando a infraestruturas da cidade. De qualquer modo, mesmo sem uma parceria, o encerramento das estaรงรตes GIRA mais prรณximas da “Cidade do Rock” deixaram os festivaleiros com menos uma opรงรฃo de mobilidade, e viraram-nos para os operadores privados de trotinetas e bicicletas.
Jรก temos visto a GIRA associar-se a eventos como a Comic-Con ou a Feira do Livro. Foi tambรฉm o “transporte oficial” da Velocity, uma grande conferรชncia sobre mobilidade ciclรกvel que aconteceu em 2021 em Lisboa e onde teve, inclusive, uma estaรงรฃo pop-up, de capacidade teoricamente ilimitada, onde os utilizadores podiam deixar as suas bicicletas, terminar as suas viagens e seguir caminho โ essas bicicletas eram depois colocadas em estaรงรตes “oficiais”.