A ‘Oli’ terminou o primeiro túnel de drenagem de Lisboa

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Está escavado o grande túnel de drenagem de Lisboa, que ajudará a evitar inundações na cidade. A tuneladora “Oli”, que saiu de Campolide há um ano e meio, chegou a Santa Apolónia, depois de atravessar o subsolo da cidade, passando por debaixo de locais como a Avenida da Liberdade e a Almirante Reis.

A entrada do túnel de drenagem em Campolide (fotografia LPP)

Está concluído o primeiro grande túnel do Plano Geral de Drenagem de Lisboa (PGDL). A escavação tinha começado em Campolide em Dezembro de 2023, percorreu o subsolo da cidade, passando por debaixo das avenidas da Liberdade e Almirante Reis, e terminou agora em Santa Apolónia. O momento foi assinalado na terça-feira 22 de Julho, numa cerimónia com a presença de Carlos Moedas, Presidente da Câmara de Lisboa. “Hoje é um dia muito feliz para Lisboa”said the mayor. “Confesso a minha emoção não só como Presidente da Câmara mas também como engenheiro hidráulico que sou.”

O túnel de drenagem entre Campolide e Santa Apolónia é o primeiro de dois túneis que vão ser feitos na cidade de Lisboa para controlar as cheias. Com uma extensão de 4,4 quilómetros, um diâmetro de 5,5 metros e uma profundidade média de 30-40 metros, este primeiro túnel é o maior e deverá entrar em funcionamento no inverno do próximo ano, adiantou aos jornalistas José Silva Ferreira, coordenador do Plano Geral de Drenagem de Lisboa. “Não vai haver cheias em Alcântara, não vai haver cheias na Baixa de Lisboa. Porquê? Porque nós impedimos que águas a mais passem para as zonas baixas”, reforçou.

O túnel não vai captar as águas da chuva apenas em Campolide, mas ao longo de todo o percurso, nomeadamente na Avenida da Liberdade, em Santa Marta e na Avenida Almirante Reis, evitando que cheguem às partes baixas da cidade e provoquem inundações. “O projecto está dimensionado para conseguirmos conter as chuvadas que aparecem uma vez em cada 100 anos.”

O dia 22 de julho foi um bom dia para Silva Ferreira. “É uma grande alegria e sentido de dever cumprido. É um sonho que começou há praticamente 15 anos. Há 15 anos que ando nesta luta e conseguimos”, disse aos jornalistas. “Não está tudo pronto, mas está a parte principal, que é a escavação deste túnel maior, que a brincar a brincar é um túnel de cinco quilómetros. Agora vamos tirar a máquina e levá-la para o Beato, para começar o segundo túnel no princípio de 2026. De Janeiro a Abril."

De Santa Apolónia para o Beato

A máquina a que Silva Ferreira se refere é a tuneladora H2OLisboa – ou “Oli” – que chegou à capital portuguesa, vinda da China, em setembro de 2022. Quando montada, assemelha-se a um comboio com várias carruagens e mede cerca de 130 metros de comprimento. Entre Campolide e Santa Apolónia, trabalhou praticamente todos os dias, com equipas a bordo que comiam e dormiam debaixo de terra, garantindo o avanço contínuo dos trabalhos.

Maquete da tuneladora H2OLisboa (fotografia LPP)

A tuneladora escavava o subsolo com uma broca gigante, extraía as terras para o exterior e instalava anéis de betão de grandes dimensões, que davam forma e estrutura ao túnel. Avançava entre “seis a oito anéis por dia” – cada um com 1,80 metros de largura — o que permitia um progresso diário de cerca de 10 a 14 metros, explica Silva Ferreira. O responsável adianta outra curiosidade: “O total de terras que retirámos da escavação foi cerca de meio milhão de metros cúbicos. São cerca de 13 vezes o volume do edifício dos Paços do Concelho.”

Vai ser em Agosto que a máquina vai sair de Santa Apolónia e ser transportada para o Beato. É nesse estaleiro, mais pequeno, que vai voltar a ser montada para perfurar um novo túnel: mais pequeno, com apenas um quilómetro, entre o Beato e Chelas. “Porque é que não fazemos o túnel de Chelas para o Beato? Porque levar a máquina lá para cima era muito complicado”, refere Silva Ferreira. O transporte será feito durante a noite pela Avenida Infante D. Henrique.

O desafio maior será lidar com o peso da tuneladora: “Só a broca, ou seja, a cabeça que vocês veem ali, pesa 70 toneladas. O corpo, que é onde estão os motores e a parte principal do mecanismo, são 410 toneladas. O resto é relativamente simples; parecem contentores”, explica o engenheiro. “Toda a preparação e montagem no Beato serão dois, três meses. O estimado é começar a escavar em Janeiro. Mas é possível até que nos antecipemos.”

Obra vai continuar em Santa Apolónia

Em Santa Apolónia, a obra ainda não está acabada (fotografia LPP)

Enquanto no Beato se vai avançar com o segundo túnel, em Santa Apolónia será preciso concluir este primeiro. A parte do túnel a cargo da Oli está feita, mas a obra prosseguirá com a junção do túnel escavado pela tuneladora ao troço final, construído à superfície através de um corte aberto. Esta última secção abre-se numa grande boca virada para o Tejo, criada para abrandar o fluxo de água antes de chegar ao rio, evitando perturbações na navegação fluvial, como explica Silva Ferreira. “Estes túneis estão dimensionados para transportar a água de chuvas que possam ocorrer uma vez em cada 100 anos. Tem capacidade para isso: 175 metros públicos por segundo”, esclarece. Se o túnel em si tem 5,5 metros de diâmetro, junto ao Tejo alarga para um canal com 30 metros de largura. “Para quê? Para que a água acalme e vá a uma velocidade inferior à enchente ou à vazante, ou seja, 2 metros por segundo”, ao chegar ao rio. “Ou seja, não vai incomodar os navios que estão aqui.”

O túnel de drenagem vai passar muito perto do túnel do Metro de Lisboa, o que obrigará ao encerramento temporário da Linha Azul entre o Terreiro do Paço e Santa Apolónia durante alguns meses. “Nós vamos atravessar por cima o túnel do Metro e vamos ter de fazer um reforço interior desse túnel”, adianta Silva Ferreira. Essa intervenção deverá começar em Setembro e durar “sete a oito meses”, e não estava prevista inicialmente. “Percebemos que os solos que estão à volta do túnel do Metro não eram tão bons quanto nós pensávamos”he said.

Havia duas soluções: “ou se ia por fora do túnel para se segurar o que lá está dentro, ou íamos por dentro para segurar o que lá está fora”. Optou-se por fazer um reforço interno. “Vamos pôr umas argolas dentro do túnel para aguentar a nossa passagem. Para isso, temos que parar a circulação no túnel e retirar todas as infraestruturas – os cabos e tubos que vemos quando andamos de metro. Temos que os retirar, pôr umas ‘costeletas’, chamamos-lhe assim, e depois repor outra vez as infraestruturas, e terminar a obra.”

José Silva Ferreira no estaleiro de Campolide (fotografia LPP)

Tudo isto vai implicar a suspensão da circulação da Linha Azul entre Setembro e Abril/Maio de 2025. “Há de ser anunciado previamente quando é que será a data, para as pessoas estarem devidamente avisadas e saberem que há transportes alternativos entre Santa Apolónia e o Terreiro do Paço. E a Câmara, com certeza, vai colaborar e ajudar o Metro a resolver essa situação.”

Muito mais que um túnel

Apesar de a construção do túnel ser invisível, a obra da drenagem foi tendo impactos em várias partes da cidade, principalmente por causa de três vórtices que estão a ser construídos para captar as águas ao longo do percurso. “Dos três vórtices, dois estão completamente feitos – o da Avenida da Liberdade e do Almirante Reis. Estamos a meio do terceiro, em Santa Marta”, notou Silva Ferreira.

Enquanto a Oli foi perfurando o grande túnel, vários homens foram trabalhando na construção dos vórtices, estruturas verticais que vão acalmar as águas antes da chegada ao túnel, colocando-as a percorrer uma espécie de redemoinho. Silva Ferreira explica melhor: “O túnel está aqui embaixo e os colectores em cima. Ora, nós temos de mandar a água a mais, que iria inundar as zonas baixas da cidade, para o nosso túnel, que está a uma diferença de 20 metros de profundidade em média. Mas a água não pode cair 20 metros cá para baixo, senão rebentava tudo. Então, temos um vórtice para a água ficar tonta. Reduz a energia, cai numa almofada de água e depois é conduzida para o túnel.”

Entretanto, em Campolide, no maior e mais importante dos estaleiros da obra – com dimensões equivalentes às de um campo de futebol –, está a ser feita a ligação entre o novo túnel e o antigo Caneiro de Alcântara, por onde escoa uma mistura de águas da Ribeira de Alcântara, esgotos domésticos e águas pluviais, com destino à ETAR de Alcântara. Para evitar a poluição do Tejo, foi construída em Campolide, no início dos dois túneis, uma bacia de anti-poluição com capacidade para 17 mil metros cúbicos, onde vão ficar retidas as primeiras chuvas – “as primeiras chuvas são poluídas porque lavam os pavimentos”, que estão muitas vezes sujos com óleos dos carros, explica Silva Ferreira.

"Se repararem, quando vão na estrada, até vêem uma espécie de sabão, uma espuma branca.“ Essas águas são decantadas e depois seguem para tratamento na ETAR. Se chover muito, a bacia anti-poluição pode funcionar como uma ETAR, filtrando outros resíduos “que ficam a flutuar”, como “plásticos, esferovites, pensos das senhoras”. Mas, a partir de certo caudal, a água segue directamente: como já choveu muito, “a água só é água. Já está tudo lavado”, adianta o engenheiro.

O PDGL além dos túneis

José Silva Ferreira aponta a conclusão de toda a obra dos túneis “até ao final de 2026”, admitindo que esse o prazo pode “resvalar um bocadinho para o primeiro trimestre de 2027”. De qualquer modo, o túnel Campolide-Santa Apolónia deverá entrar em funcionamento já no Inverno de 2026. O segundo só depois disso, pois há “alguns problemas para resolver na sua chegada em Chelas” devido a uma melhoria no projecto.

A conclusão dos dois túneis não significa o fim do Plano Geral de Drenagem de Lisboa (PGDL), que decorre entre 2016 e 2030 e tem como objectivo proteger a cidade de cheias causadas por chuvas extremas. “O plano ainda tem coisas para fazer, e vamos ter mais três a quatro anos para fazer essas pequenas coisas”, lembra Silva Ferreira. Nem o plano começou com estes dois túneis, apesar de os mesmos serem as peças principais.

O interior do túnel de drenagem (fotografia LPP)

Desde 2015, quando José Silva Ferreira assumiu a coordenação da equipa do PGDL, foram criadas bacias de retenção importantes na Ameixoeira e no Pólo Universitário da Ajuda, para conter águas “na origem”, resolvendo as inundações que ocorriam com relativa frequência na Calçada de Carriche ou na zona do Rio Seco. “Fizemos também um microtúnel na Avenida Infante D. Henrique e resolvemos o problema de algumas inundações na Avenida de Berlim e no Parque das Nações”, explicou Silva Ferreira. “Portanto, já fizemos também pequenas coisas dentro da cidade. Tudo isso é Plano Geral de Drenagem.”

”A maior obra em curso na Europa Ocidental”

Para Carlos Moedas, os túneis são a componente mais importante do PGDL e “a maior obra em curso na Europa Ocidental” – uma obra que “nos prepara para um futuro em que haverá muito mais dificuldades com a água devido às alterações climáticas”. “É uma obra invisível. É muitas vezes no invisível que está o mais importante”, salientou o Presidente da Câmara de Lisboa. “Os lisboetas vão lembrar-se dela quando já não tiverem cheias na cidade.”

“Quero agradecer ao engenheiro Silva Ferreira. Sofreu tantos anos a ver esta obra não avançar, mas os dois fizemos um pacto que seria desta”, disse ainda Moedas, numa cerimónia que contou com a visita da Comissária Europeia Jessica Roswall, responsável pelas áreas do Ambiente, Resiliência Hídrica e Economia Circular Competitiva, e também da Ministra do Ambiente, Maria da Graça Carvalho. O autarca agradeceu também a Carmona Rodrigues, que tinha sido o último Presidente de Câmara de Lisboa do PSD, com um mandato entre 2005 e 2007. “Devemos este projecto ao professor Carmona Rodrigues, para quem gostava de pedir uma salva de palmas”, disse o Presidente social-democrata.

Apesar de ter sido no mandato de Carmona Rodrigues o lançamento da primeira versão do Plano Geral de Drenagem de Lisboa, foi com Fernando Medina (PS), antecessor de Moedas, que o plano conheceu avanços importantes. Medina encontrou financiamento junto do Banco Europeu de Investimento (BEI) financiamento para a construção dos dois túneis e lançou, em 2019, o concurso público que viria a ser adjudicado em Dezembro do ano seguinte ao consórcio Mota Engil/SPIE Batignolles Internacion pelo valor de 132,9 milhões de euros. Moedas apenas assinou os contratos e avançou com a obra.

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