Estratégia de mobilidade em Lisboa para os próximos 10-15 anos nasce sem grande alarido

De forma muito, muito discreta, a Câmara de Lisboa começou a elaborar o seu Plano de Mobilidade Urbana Sustentável (PMUS), documento que irá orientar a estratégia de mobilidade da cidade até 2030-2040. Há um inquérito online e sessões participativas a decorrer, mas a divulgação pública tem sido praticamente nula.

Eléctrico 28 preso no trânsito da Baixa (fotografia LPP)

Desde 2022 que se aguarda a elaboração de um Plano de Mobilidade Urbana Sustentável (PMUS), apresentado como essencial para decisões estratégicas, como a criação de uma ZER no centro histórico. Mas o tempo passou, e o PMUS não chegou a ser feito. O processo de elaboração daquela que deverá ser a grande estratégia de mobilidade de Lisboa para os próximos 10 anos só agora foi iniciado… mas de forma muito discreta. 

workshops a decorrer por convite e sem se perceber muito bem o seu calendário; e há um inquérito online, que, apesar de estar disponível há duas semanas e de terminar em breve, tem tido muito pouca divulgação. O pouco alarido da Câmara de Lisboa em torno da elaboração do PMUS contrasta com a força de comunicação que a autarquia coloca noutros temas, como o Conselho de Cidadãos ou o reperfilamento da Avenida Almirante Reis.

Afinal, o que é o PMUS e porque importa?

O Plano de Mobilidade Urbana Sustentável será um documento onde a Câmara de Lisboa terá definida toda a sua estratégia de mobilidadecon metas para 2030 e 2040. Incluirá um plano de acção com medidas concretas, indicando a entidade responsável por cada medida, valores de investimento necessário, possíveis impactos sociais, ambientais e na mobilidade, e indicação de possíveis fontes de financiamento nacionais e europeias.

O PMUS irá basear-se num diagnóstico da mobilidade na cidade, utilizando os dados existentes, e incluirá a construção de cenários para análise e de uma matriz SWOT que identificará os principais constrangimentos e oportunidades. Além do documento ou conjunto de documentos que constituirá o PMUS, será desenvolvida uma ferramenta digital onde os técnicos do Município poderão carregar os dados de mobilidade mais actuais para fazer análises, bem como monitorizar a implementação do plano e a evolução das metas definidas.

Imagem do PMUS de Lisboa (via CML)

Apesar das promessas do Executivo de Carlos Moedas em relação à elaboração do PMUS – inclusive com timings anunciados de que o instrumento estaria feito em Dezembro de 2022 –, a verdade é que em 2022 foi apenas preparado o concurso público para adjudicar a uma entidade externa a elaboração do grande plano de mobilidade de Lisboa. O procedimento foi aprovado e lançado um ano depois, no último trimestre de 2023. A adjudicação, contudo, acabou a ser feita só em Fevereiro de 2025 a um dos dois concorrentes, a conhecida consultora TIS – Transportes, Inovação e Sistemas. O contrato, assinado no início de Fevereiro e publicado no portal Base, prevê uma transferência de 345 mil euros do Município para a TIS e um prazo de execução de 10 meses, ou seja, até Dezembro deste ano deverá haver PMUS.

O desenvolvimento do PMUS será estruturado em quatro fases. Depois de uma fase inicial de preparação e arranque dos trabalhos, segue-se uma primeira fase dedicada a reuniões preliminares, recolha de dados e realização de trabalhos de campo. Posteriormente, será feito um diagnóstico da situação actual e das tendências futuras, permitindo a definição de cenários, objectivos e estratégias. Na última fase, será realizada a formulação de propostas, acompanhada da definição de indicadores e da estimativa de impactos. 

Participação pública… sem comunicação

Ciclovia ribeirinha de Lisboa (fotografia LPP)

A elaboração do Plano de Mobilidade Urbana Sustentável (PMUS) está a ser realizada sem qualquer transparência. O portal de informação da Câmara de Lisboa dava conta, a 24 de Fevereiro, do início de desenvolvimento do PMUS falando num “fase de participação activa com sessões que juntam especialistas, agentes territoriais e munícipes”, e noticiava a realização de um segundo workshop. A 20 de Março, a autarquia informava já se ter realizado o “oitavo workshop”, referindo que “os encontros no âmbito do Plano Municipal de Mobilidade Urbana Sustentável para a cidade de Lisboa apelam, ainda, à participação pública”.

Embora se fale em participação pública dos munícipes, estes workshops não têm sido divulgados abertamente; em vez disso, os convites são direcionados a associações e entidades específicas com actuação na cidade. Não há problema em serem promovidos eventos por convite, direccionados a audiências específicas. No entanto, causa estranheza a ausência de um calendário claro para a participação pública no âmbito deste PMUS, deixando incerta a forma como os munícipes poderão envolver-se e contribuir para o processo.

Não é preciso ir muito longe para descobrir um óptimo exemplo. A Área Metropolitana de Lisboa, que agrega os 18 municípios da região da capital, está a desenvolver também um PMUS. Designado de Plano Metropolitano de Mobilidade Urbana Sustentável (PMMUS), a elaboração deste documento não foi iniciada sem um anúncio prévio – divulgado também junto da comunicação social –, e sem o lançamento de um site específico, onde qualquer pessoa pode consultar a metodologia de elaboração do plano, as equipas envolvidas neste processo, todo o calendário de acções de participação previstas e ainda alguns resultados preliminares. É ainda possível assinar uma boletín para receber as novidades por e-mail.

O bom exemplo do site do PMMUS, feito pela AML/TML (captura de ecrã e GIF por LPP)

Este é um excelente exemplo de transparência. Mesmo que exista trabalho à porta fechada, a população consegue escrutinar o que está a ser feito.

Para perceber quem está a desenvolver o PMUS e quais os detalhes deste futuro plano, é preciso consultar o escondido caderno de encargos, associado ao concurso público promovido. Este documento, acessível através de um link no portal Base que permite descarregar um ZIP das “peças de procedimento”, detalha que o plano está a ser desenvolvido prevê um trabalho de colaboração entre a Direcção Municipal de Mobilidade e a consultora contratada, a TIS, com a segunda a desenvolver o trabalho técnico para a primeira, que assume a coordenação do projecto. Cabe à TIS desenvolver e redigir o plano, além de coordenar o processo de participação pública.

No referido caderno de encargos, pode perceber-se que uma componente fundamental do PMUS é a participação pública. De acordo com o caderno de encargos, “a elaboração do PMUS encontra-se sujeita à obrigação de publicitar o início do procedimento e, bem assim, de disponibilizar a todos os interessados a informação necessária ao acompanhamento do seu procedimento de formação nas suas diferentes fases de elaboração”. O caderno de encargos é claro: a participação pública deve “envolver os cidadãos ao longo de todo o processo”.

A participação dos cidadãos está prevista através de inquéritos, tanto en línea e presenciais, nos quais se pretende obter uma “amostra significativa e diversificada”, bem como por meio de entrevistas, focus groups e workshops que juntem “representantes de diferentes grupos de stakeholders”, e ainda de eventos ou exposições que sirvam de “veículo de disseminação e comunicação dos resultados do projecto/cenarização”.

Neste momento, a única forma de participação verdadeiramente pública é um inquérito en línea, que foi lançado a 26 de Fevereiro e que só na última semana começou a ser partilhado nas redes sociais da autarquia e de juntas de freguesia. O prazo de respostas termina a 31 de Março, ou seja, dentro de pouco mais que uma semana, à data deste artigo.

O inquérito em curso para o PMUS (captura de ecrã por LPP)
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