Oeiras quer ter menos carros e mais pessoas nas “Portas de Algés”

A Câmara de Oeiras apresentou um ambicioso projecto de requalificação da Avenida dos Bombeiros Voluntários e da baixa de Algés. A autarquia está a ouvir a população antes de tomar decisões definitivas.

Imagem ilustrativa do que pode ser a Avenida dos Bombeiros Voluntários (via CMO)

Portas de Algés. É com esta “marca” que a Câmara de Oeiras se lança num ambicioso desafio de repensar uma das entradas do concelho e, em particular, uma avenida – a Avenida dos Bombeiros Voluntários, entre Miraflores a Algés. A autarquia quer reperfilar este eixo, hoje dominado pelo automóvel, integrando nele o futuro metro ligeiro de superfície LIOS e também uma linha de Metrobus para a Reboleira. Ao mesmo tempo, quer revitalizar a baixa de Algés como um pólo de comércio, cultura e encontros, e solucionar de vez a situação da ribeira de Algés, que se encontra subterrada com uma infraestrutura subdimensionada.

O projecto “Portas de Algés” tem todos esses objectivos, procurando, acima de tudo, estabelecer uma nova centralidade no concelho de Oeiras e na área metropolitana de Lisboa. A ambição já vem sendo trabalhada desde o início de 2020, quando a Câmara de Oeiras convidou especialistas de diferentes áreas, do urbanismo à sociologia, para recolher propostas e inputs para a requalificação zona. A pandemia terá, entretanto, atrasado os planos e só agora está a ser dada continuidade ao projecto.

LPP Photographie

Comme ceci, na passada quinta-feira, 29 de Junho, ao final do dia, a autarquia apresentou à população as ideias preliminares que tem, no sentido de recolher novos contributos, desta vez, das pessoas que vivem quotidianamente a zona de Algés. A sessão, que decorreu no Palácio dos Anjos, contou com a presença e participação do Presidente da Câmara, Isaltino Morais. A população pôde intervir depois de os técnicos municipais responsáveis pelo projecto – Luís Serpa, Luís Batista Fernandes, Pedro Carrilho e Fátima Rabuge – apresentarem um diagnóstico da zona e algumas das primeiras propostas que têm. O evento foi acompanhado por uma exposição, permitindo à população ler e ver com mais calma algumas das ideias; e teve também transmissão en ligne, permitindo não só o acesso remoto à informação mostrada, bem como a existência de um arquivo de tudo o que foi dito – uma prática importante de transparência que, infelizmente, não é seguida por todos os municípios.

Reperfilar a Avenida dos Bombeiros Voluntários e criar uma nova praça em Algés

A necessidade de reperfilar a Avenida dos Bombeiros Voluntários, entre Miraflores e Algés, dando-lhe um carácter mais urbano, foi o ponto de partida para a Câmara de Oeiras reflectir sobre toda a área em redor. A avenida em questão é hoje um eixo rodoviário onde o automóvel tem uma enorme presença. Duas vias em cada sentido servem todos os condutores que querem usar a CRIL, bem como várias carreiras de autocarro, incluindo a 750 da Carris. Há estacionamento em espinha a ladear a avenida dos dois lados e também no corredor central, além de várias pequenas bolsas onde também encontramos carros estacionados. Existe arborização mas é inconstante e sem o um alinhamento regular, e os trajectos pedonais são também inconsistentes. Não há qualquer infraestrutura ciclável.

Proposta preliminar da Câmara de Oeiras para a Avenida dos Bombeiros Voluntários (via CMO)

A proposta preliminar da Câmara de Oeiras, mostrada na sessão pública, passa por retirar uma via de circulação por sentido à avenida, substituindo-a por um corredor de transportes públicos de duplo sentido que pode servir tanto o LIOS, como a linha de BRT prevista para ligar Algés à Reboleira, como todas as restantes carreiras de autocarro que atravessam a zona. Na via que sobra para a circulação rodoviária, a proposta passa por limitar a velocidade a 30 km/h de modo a permitir a convivência entre o tráfego automóvel e as bicicletas, estabelecendo um eixo ciclável contínuo entre o Parque Urbano de Miraflores (onde já há ciclovia) e Algés e a interface de transportes de Algés, o rio Tejo e Lisboa.

Desaparecem os lugares de estacionamento no corredor central da avenida, mantendo-se apenas os das laterais, em espinha – na prática, prevê-se numa redução significativa da oferta de estacionamento à superfície, com o município a prever alternativas subterrâneas ou em altura. Os técnicos municipais propõem também reforçar a arborização da avenida, oferecendo um alinhamento uniforme e contínuo, bem como aumentar e regularizar a área pedonal, com novo mobiliário urbano e melhor iluminação.

Avenida dos Bombeiros Voluntários, hoje (fotografia LPP)

Para dar esta dinâmica mais urbana e de “alameda” à Avenida dos Bombeiros Voluntários, a Câmara de Oeiras diz que precisa de resolver dois nós de saída da CRIL, que ficaram por fazer desde a construção desta infraestrutura rodoviária e que, segundo a autarquia, vão retirar muitos dos carros que hoje circulam pela referida avenida – tráfego de atravessamento, de condutores que usariam a CRIL se tivessem os acessos em falta. Com menos carros a passar na avenida, a autarquia espera reduzir o ruído e a poluição junto à malha muito densa de urbanizações que existe em redor daquele eixo.

Já na zona perto do terminal rodoviário e da estação de comboios, a Câmara de Oeiras pretende prolongar a Avenida dos Bombeiros Voluntários, que hoje termina pouco antes do Mercado de Algés, até à frente ribeirinha, com o corredor dedicado ao LIOS e ao BRT. Neste troço, a avenida afasta-se dos prédios e vai para debaixo do viaduto da CRIL, deixando uma “barriga” junto ao Mercado. No desenho partilhado na sessão, vê-se um parque de estacionamento – é um parque que existe hoje e que, segundo o município, é provisório –, mas a ideia é ter aqui, pelo menos, uma praça ampla que se ligue com o Mercado. O que essa praça poderá ter não se sabe. Falou-se num anfiteatro ao ar livre, num jardim e também numa biblioteca moderna, que, mais que um espaço de leitura, possa ser um agregador cultural e social. Enfim, a praça poderá ter todas estas coisas, inclusive.

Projecto preliminar para a envolvente do Mercado de Algés; o parque de estacionamento que se vê no desenho é temporário e deverá dar lugar a uma praça (via CMO)

Há um ponto que parece ser mais consensual: retirar os carros da frente do Mercado de Algés em favor da mobilidade pedonal e também da ciclável. Poderá haver, no entanto, um acesso local para cargas e descargas e para veículos de emergência, como, aliás, mostra o desenho, mas a “barriga” que a Avenida dos Bombeiros Voluntários pode formar nesta zona é precisamente para afastar a circulação mais pesada do pólo comercial.

Envolvente do Mercado de Algés, hoje (fotografia LPP)

Para permitir a revitalização de toda a área agora conhecida como “Portas de Algés”, a Câmara de Oeiras procedeu à aquisição de terrenos e de imóveis, fez nove realojamentos e a realizou algumas demolições, num investimento global de 2,6 milhões de euros. E enquanto o projecto não avança no terreno, construiu um segundo parque de estacionamento provisório junto ao Mercado. O intuito do município é manter oferta de estacionamento público nesta zona, mas numa estrutura em altura ou enterrado; esse futuro parque irá substituir os provisórios agora criados, de modo a servir não só a população da Avenida dos Bombeiros Voluntários (uma zona de prédios altos sem garagens), mas também a interface de transportes e o comércio da baixa de Algés. Nesta área, onde proliferam lojas e restaurantes, a autarquia já tem feito algum trabalho ao nível da requalificação do espaço urbano, mas quer ir mais longe e pedonalizar mais ruas (como é hoje a Rua Major Afonso Palla).

Zona da intervenção (fotografia aérea via CMO)

Resolver a ribeira de Algés

A Câmara de Oeiras diz que não pode intervir na Avenida dos Bombeiros de Algés e nas “Portas de Algés” sem resolver a questão da ribeira de Algés. Este curso de água encontra-se encanado, isto é, escondido debaixo de solo, desde a parte inicial da avenida e a sua foz no rio Tejo. O colector subterrâneo por onde a ribeira passa está subdimensionado, excepto na zona da CRIL, onde a infraestrutura foi alargada aquando da construção desse viaduto em 2002. O facto de o canal da ribeira ser demasiado pequeno nos quase 700 metros antes e nos 350 metros depois desse troço – mas principalmente antes – leva a que, perante uma situação de chuva mais intensa e de um caudal consequentemente maior, haja uma sobrecarga que leve a transbordos e a cheias. Foi isso que aconteceu nas intempéries de Dezembro passado.

Os diferentes troços da Ribeira de Algés; a amarelo o único que está resolvido (via CMO)

A autarquia diz-se consciente do problema mas queixa-se da indisponibilidade da Agência Portuguesa do Ambiente (APA) para o resolver, isto é, para aumentar a capacidade dos colectores que transportam a ribeira até ao rio. No topo norte da Avenida dos Bombeiros Voluntários há uma zona onde é possível apreciar a ribeira de Algés a descoberto; a Câmara fez aqui um trabalho de regularização das margens, num investimento de 520 mil euros, tendo aberto, em 2022, um pequeno espaço verde junto à ribeira – chama-se o Quintelão e oferece espaços de estadia e hortas urbanas; integrará o no futuro Parque Urbano de Algés, um projecto ainda sem área de intervenção estabilizada.

No Quintelão é possível observar a ribeira de Algés (fotografia LPP)

Sobre se a ribeira de Algés terá outras partes renaturalizadas – isto é, trazidas para a superfície do espaço urbano –, ainda não se sabe, mas há pelo menos uma ideia de o fazer entre a linha de comboio e o rio Tejo, onde o curso desagua.

Participação pública

A Câmara de Oeiras tem disponível o endereço de e-mail [email protected] para as pessoas interessadas enviarem os seus contributos sobre o projecto das Portas de Algés. “Queremos ouvir contributos positivos que possam influenciar as decisões da Câmara Municipal”, disse Isaltino Morais durante a sessão que decorreu na semana passada – um repto que poderá ser estendido à participação agora por e-mail. “A Câmara Municipal garante que não tomou ainda decisão nenhuma. Vamos ouvir as pessoas. Não me digam é que não se pode lá fazer nada, porque alguma coisa tem de ser feita.”

As Portas de Algés estão a ser pensadas num contexto urbano alargado, que importa referir. O Parque Florestal de Monsanto está mesmo ali ao lado, podendo ser prolongado através de um corredor verde na Avenida dos Bombeiros Voluntários ou na proximidade desta até ao rio (aliás, falou-se disto na sessão pública). A proximidade com a Fundação Champalimound, a zona monumental de Belém, a existência de parques urbanos na proximidade e o planeamento de outros, toda a área desportiva e de lazer Jamor, e todo o investimento previsto no âmbito do Ocean Campus (que inclui o designado Passeio Marítimo de Algés, palco de vários eventos) são outras mais valias para o projecto agora em discussão.

Zona do Mercado de Algés (fotografia aérea via CMO)

O projecto não entra na frente ribeirinha, mas a Câmara de Oeiras quer requalificar o terminal rodoviário e também, com o Porto de Lisboa, encontrar soluções para o Passeio Marítimo. O município também revelou a sua ambição em relação à estação de comboios. Durante a sessão, falou-se precisamente do potencial desaproveitado da interface de transportes daquela zona, mas também sobre a opção tomada de criar parques de estacionamento provisórios em vez de se prolongar provisoriamente a Avenida dos Bombeiros Voluntários em direcção ao rio, sobre a importância de haver mais oferta cultural na zona, como sessões de cinema, sobre se poder criar “superquarteirões” na baixa de Algés, ser colocada uma ciclovia segregada na avenida em vez de marcações 30+bici, a relação de Algés com o rio Tejo e sobre se criar uma escultura ou um edifício icónico que marque as Portas de Algés como tal.

“Devo dizer-vos que a própria ideia das Portas de Algés foi uma ideia completamente espontânea. Na altura em que a máquina estava a demolir aqueles edifícios eu fiz uma gravação para um vídeo da Câmara Municipal e ocorreu-me na altura as antigas Portas de Algés”, comentou Isaltino Morais no evento de apresentação pública do projecto. “As Portas de Benfica ainda têm lá um símbolo. Mas aqui desapareceu tudo. Antigamente havia uma ponte na ribeira de Algés, um pouco abaixo da antiga praça de touros [local mesmo em frente ao actual Mercado de Algés, onde hoje está um dos dois parques de estacionamento provisórios], e até ao século 19 era cobrada uma espécie de dízima para os produtos que iam ser vendidos no Campo das Cebolas, em Lisboa”, contou o Presidente da Câmara.

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