Um grupo de pessoas que vive nas periferias de Lisboa quebrou o silêncio a que parece estar historicamente condenado e criou um movimento inédito para se fazer ouvir: o Vida Justa. Já saíram à rua em protesto, mas é sobretudo através das redes sociais que, de uma forma inovadora, com mini-documentários e inquéritos, têm denunciado as dificuldades que enfrentam diariamente. Nos transportes e na habitação, sobretudo. Querem continuar a crescer nos bairros limítrofes e mostrar que todos podem ter voz e “um lugar”.
É um dia útil de Agosto. Passa pouco das cinco horas e na estação de comboios de Agualva-Cacém, em Sintra, dezenas de passageiros correm da plataforma da linha ferroviária para o terminal de autocarros ou chegam a pé dos bairros circundantes. Várias carreiras anunciam o “início do serviço”. A maioria são mulheres, quase todas empregadas de limpeza, que esperam pacientemente por autocarros que as vão levar a Oeiras, Cascais, outras zonas de Sintra e também a Loures. Para muitas esta é a rotina há mais de duas décadas e sempre com críticas.
“As carreiras nunca são certas. Se o motorista estiver de férias ou de folga, há um horário que não faz. Acontece várias vezes. Já telefonei para a Carris Metropolitana para saber o que se passa e dizem-me que o motorista está destacado para fazer a carreira, mas pelos vistos não aparece”, conta Paula Rosa, 49 anos, funcionária num supermercado, em São Domingos de Rana, Cascais. Começa a trabalhar às sete horas e, todos os dias, tem de apanhar o autocarro 1622 às 5h35 horas para não chegar atrasada, trajeto que faz há 20 anos. “Sempre houve problemas, mas não tantos como agora”se lamente-t-il.