Xullaji é um nome incontornável no panorama do hip-hop português, autor de clássicos que lhe garantiram um lugar na história do música. Mas o seu trabalho e a sua influência vão muito além das fronteiras do género; com uma consciência política aguçada, uma curiosidade ávida e um sentido apurado de justiça social, a vida e obra do rapper é marcada por projectos de proximidade, junto dos seus, e pelo exercício de resistência e reivindicação.
Entrevista realizada em parceria com o Shifter. Uma versão alargada desta entrevista será publicada em shifter.pt dentro de um mês.
A meio de uma tarde como tantas outras e contrariando o fluxo habitual de pessoas em direção aos seus trabalhos, saímos de Lisboa e fizemos a travessia do Tejo a bordo do Fertagus até à estação de Foros da Amora. Dali, partimos em direção à morada combinada, que numa pré-visualização rápida no Google Maps, nos parecia indicar um prédio como tantos outros. Chegados a antes da hora combinada, não foi preciso sequer a porta se abrir para começamos a perceber que o pouco que se percebia en ligne se multiplicava no terreno. Um olhar através do vidro permitia ver instrumentos musicais, elementos decorativos de cultura africana e livros, revistas e outros materiais de difusão do conhecimento. Com isso, ganhava força a certeza de que não nos tínhamos enganado na procura pelo encontro com Xullaji.
A loja no rés-do-chão do prédio habitacional, uma arquitectura tão típica dos bairros na margem sul do Tejo, e que passa despercebida aos desatentos, é nada mais, nada menos que a Tabanka Sul, o epicentro das criações de Xullaji e daqueles que o têm rodeado. E assim que a porta se abriu, e o anfitrião nos mostrou os cantos à sala, rapidamente percebemos como o espaço se transforma ao serviço da comunidade que o habita. A Tabanka é sala de ensaios de Xullaji, mas é muito mais do que isso, é um espaço de portas abertas, pronto a receber aqueles que por ali passavam e se deixam arrebatar seja pelos beats de hip-hop, pelas referências pan-africanas em diversos formatos, ou pelas leituras do colectivo Peles Negras, Máscaras Negras. Nuno – nome de registo de Xullaji – conta-nos que todo o pessoal da zona pode usar aquele espaço para produzir ou ensaiar, e que só impõe uma condição: manter a porta aberta. E com o desenrolar da conversa percebemos não é só a porta que ali se quer sempre aberta, como também as mentes.