Carlos Moedas parece estar a guardar os trunfos para as autárquicas do próximo ano. A proposta de Orçamento Municipal para 2025 surge como um fechar de ciclo, sem novos projectos ou ideias, mas focada na continuidade do trabalho desenvolvido e no reforço do investimento.
Foi apresentada, esta semana, a proposta de Orçamento Municipal (OM) de Lisboa para 2025. Ao contrário do que aconteceu em anos anteriores, o documento orçamental do próximo e último ano de mandato não apresenta novas ideias – em vez disso, é um fechar de ciclo, em que o Executivo liderado por Carlos Moedas já prepara as autárquicas, não querendo gastar já eventuais trunfos eleitorais.
A apresentação da proposta de OM para 2025 foi feita com muitas comparações entre o actual mandato e o de Medina (PS). Mais 258 milhões de euros de investimento se tirarmos os financiamentos europeus como o PRR, mais 393 milhões para habitação, mais 49% para direitos sociais, mais 67% para higiene urbana, mais 22% para as juntas de freguesia, mais 43 milhões para renovação da frota da Carris, mais 1200 bicicletas eléctricas GIRA no mandato… Filipe Anacoreta Correia, Vice-Presidente e Vereador das Finanças, quis mostrar que o Executivo em funções “é um Executivo que faz”, que aumentou o investimento, respondendo aos “apelos da cidade” e mantendo as “contas equilibradas”.
O Orçamento para 2025 é de quase 1,4 mil milhões de euros, estando previsto que as receitas correntes ultrapassem pela primeira vez os mil milhões, com a despesas correntes a situarem-se nos 918 milhões. O investimento previsto para o próximo ano é de 441 milhões; olhando para todo o mandato, Anacoreta Correia disse que o Executivo investiu 1,225 milhões de euros, mais 459 milhões que no mandato socialista. “Não é só o PRR que está a fazer este aumento de investimento”, ressalvou, mostrando que, subtraindo o financiamento europeu, continua a existir um acréscimo de 258 milhões no investimento.
Habitação, direitos sociais, higiene urbana, mobilidade, juntas de freguesia, educação e desporto são os principais destaques do OM do próximo ano. Na habitação, estão previstos 154 milhões de euros, sendo que, neste momento, estão a ser construídas ou reabilitadas mais de 5 mil casas e apoiadas 3165 famílias, seja com a entrega de chaves, seja nos programas de apoio à renda. Para apoiar pessoas em situação de sem abrigo, o Orçamento prevê 12 milhões de euros, um “crescimento muito grande de 33% em relação a 2024”; estão ainda reservados 2 milhões para o Hotel Social de Lisboa.
A higiene urbana foi um dos temas reforçados durante a apresentação do Orçamento Municipal do próximo ano, com a equipa de Moedas a tentar antecipar uma das questões que deverá marcar a campanha do próximo ano e que tem sido tema recorrente dos partidos na oposição, nomeadamente do PS. Neste campo, está prevista uma despesa de 38 milhões com a higiene urbana em 2025, mais 65% do que no ano actual. O Executivo promete ainda investir 15 milhões de euros em viaturas e abrir um concurso de 100 vagas para reforço humano. No total do mandato de Moedas, a higiene urbana representou 150 milhões, mais 90 milhões do que no mandato de Medina – ou seja, mais 67%.
A mobilidade é uma área sem grandes novidades. Estão previstos 311 milhões de euros, 188 milhões através da Carris, 80 pela EMEL e 43 pela Câmara. Sobre a Carris, o Vice-Presidente destacou a renovação da frota, que tem vindo a ser feita nos últimos anos e que no próximo ano terá continuidade com 34 milhões de euros e 96 novas viaturas. Na EMEL, foram destacados investimentos na rede ciclável com as já anunciadas novas 56 ciclovias/ligações, que representarão um acréscimo de 90 quilómetros à rede, bem como a continuação da expansão da GIRA. “Esperamos que 2024 possa ser ainda o ano em que todas as freguesias têm GIRA. Faltam apenas duas”, disse Anacoreta Correia, referindo-se a Santa Clara e à Ajuda. Na cultura, foi apresentado “o maior orçamento de sempre” com 64 milhões, mais 19% em comparação com 2024; a abertura da Biblioteca Lobo Antunes, em Benfica, e do Museu Julião Sarmento, em Belém, deverão ser os principais marcos culturais na cidade no próximo ano, pelo menos no que toca à cultura de responsabilidade municipal.
O Plano Geral de Drenagem teve uma menção na apresentação orçamental do ano que vem, com o Vice-Presidente a adiantar que o túnel de Santa Apolónia, que tem ponto de partida em Campolide, deverá ficar concluído no terceiro trimestre de 2025 e que actualmente 50% desse túnel está construído. Só depois poderá iniciar-se a escavação do segundo túnel, entre Chelas e o Beato. É um calendário que acrescenta algum atraso ao projecto, mas Anacoreta Correia destacou que se trata de “uma obra difícil, muito exigente e com um grande impacto na vida dos lisboetas”, nomeadamente com impactos na mobilidade quer na Avenida da Liberdade, quer em Santa Apolónia. O autarca lembrou que a construção destes dois túneis contribuirá para uma cidade mais resiliente às alterações climáticas e a fenómenos extremos como os que foram registados há dias em Valência.
As juntas de freguesia também vão ter novidades em 2025, com a Câmara a colocar já no orçamento inicial as verbas a transferir para as 24 juntas da cidade, para que possam executar os seus projectos no âmbito dos contratos de delegação de competências. No total, serão 126 milhões de euros para as freguesias, mais 22% do que em 2024. Ao este valor estar inscrito já nesta proposta de Orçamento Municipal, as juntas poderão contar com ele já no início do ano que vem, evitando-se atrasos de pagamentos como terá acontecido com a Junta de Freguesia de Benfica, liderada pelo PS. “Há outro aspeto que é a ligação da Câmara às juntas de freguesia e os respectivos pagamentos. O PS é naturalmente vulnerável a esta questão porque está na condução do maior número de freguesias. Portanto, se não for por mais nada, a minha expectativa é que pelo menos por isto o orçamento seja viabilizado”, disse Anacoreta Correia durante a apresentação do documento.
A viabilização do Orçamento Municipal para 2025 deverá decorrer sem problemas, não só porque antecede um período eleitoral, mas também porque a oposição não tem (ainda?) nenhum nome forte para enfrentar Moedas na disputa autárquica do próximo ano. Além disso, a equipa de Moedas apresenta um documento de continuidade, com aumentos de investimento em todas as áreas destacadas e com contas certas. “Acreditamos que este é um bom orçamento, que serve a cidade, a nossa expectativa é que possa ser aprovado”, disse Anacoreta Correia, referindo que, ao longo do mandato, “tivemos capacidade de execução da despesa, mantivemos as contas equilibradas e investimos na cidade de Lisboa de forma muito significativa” – mesmo com a devolução de cerca de 267 milhões de euros do IRS pago pelos residentes na cidade.
A reacção dos partidos
Os partidos políticos com assento na Câmara de Lisboa não pouparam críticas à proposta de Orçamento Municipal para 2025, que representa o quarto e último orçamento do actual mandato de Carlos Moedas. Entre acusações de manipulação de dados, ausência de visão estratégica e favorecimento das elites, as reacções dos diferentes quadrantes políticos mostram um consenso na reprovação das opções do Executivo PSD/CDS. Ainda assim, a aprovação deverá estar garantida, devendo o PS abster-se para que, com os votos a favor da ala de Moedas e os votos contra da ala mais à esquerda (PCP, BE, Livre e Cidadãos Por Lisboa), o documento conheça luz verde.
O PS questionou a veracidade dos números apresentados pela Câmara, apontando incoerências evidentes, como uma discrepância no investimento em habitação durante o mandato anterior. “Esta disparidade de números não é séria, não tem qualquer adesão à realidade e demonstra uma falta de honestidade intelectual que não é compatível com a gestão de uma instituição como a maior Câmara Municipal do país”, lê-se no comunicado socialista. Os socialistas também criticaram a forma como se apresenta o aumento das transferências para as juntas de freguesia, destacando que a subida de 13% não compensa o impacto dos aumentos salariais dos funcionários municipais.
O PCP foi mais incisivo, descrevendo a proposta como “errática, perdulária e classista”. Os comunistas destacaram cortes no orçamento destinado à habitação, incluindo o travão em projectos como o PRA Restelo, e a perda de receitas municipais devido à devolução do IRS. Segundo os vereadores comunistas, mais de metade dos 267 milhões de euros devolvidos ao longo do mandato beneficiaram os 10% mais ricos da cidade. “Para beneficiar as camadas de maiores rendimentos, a Câmara desperdiça recursos que podiam e deviam ser usados a favor de todos”, criticaram, apontando ainda insuficiências em áreas como educação, mobilidade, higiene urbana e apoios sociais.
Já o BE acusou Carlos Moedas de chegar ao último ano de mandato “esgotado e sem novas ideias para resolver os problemas de Lisboa”. O partido sublinhou a subida de 40% nas rendas e de 20% no preço das casas durante o mandato, a incapacidade de enfrentar a crise na higiene urbana e o agravamento da situação de pessoas em situação de sem abrigo, que quase duplicaram em número no último ano. O Bloco apontou ainda a desigualdade como a marca distintiva do mandato, reiterando que mais de 50% do benefício da devolução do IRS vai para os 10% mais ricos. Durante o debate orçamental, o partido promete defender propostas que vão desde mais habitação pública a preços acessíveis, até à gratuitidade dos transportes públicos para pessoas desempregadas e com deficiência.
Após a apresentação das linhas gerais do Orçamento Municipal aos jornalistas, feita esta semana, o Executivo liderado por Carlos Moedas dedicará os próximos 15 dias à sua apresentação detalhada nas comissões da Assembleia Municipal. A votação deverá acontecer no final deste mês.