A primeira experiência de Zona 30 em Lisboa foi realizada entre 2009 e 2011 no Bairro Azul, perto do El Corte Inglés. A oportunidade surgiu com a extensão do Metro de Lisboa; foram redesenhadas as ruas daquele bairro de forma a retirar tráfego de atravessamento, criar novas zonas de estadia, regular o estacionamento abusivo e aumentar a área pedonal. Esta experiência está detalhada neste artigo científico, co-autorado pelo então vereador de mobilidade da Câmara de Lisboa e investigador do Técnico, Fernando Nunes da Silva.
Seguiram-se outras Zonas 30 na cidade, nomeadamente no Bairro do Charquinho, em Benfica, e no Bairro das Estacas, em Alvalade. No artigo supra referido, Fernando Nunes da Silva, que foi vereador com António Costa na Câmara de Lisboa, defende que:
A realização de projectos de acalmia de tráfego em zonas residenciais, nomeadamente através da implementação do conceito de “Zona 30”, visa não só melhorar as condições de segurança de circulação dos peões e bicicletas nesses bairros e ordenar aí o estacionamento de residentes (aumentando igualmente o número de lugares disponíveis para esse fim), mas também potenciar as condições de qualificação do espaço público e do seu usufruto pela população. Acresce ainda um outro objectivo que, face às estatísticas de sinistralidade rodoviária (onde o número de acidentes nas zonas urbanas não tem diminuído com a mesma intensidade que nas estradas do país) não deve ser minimizado. Trata-se de criar as condições objectivas para que a circulação automóvel se faça de modo mais atento e com maior respeito pelo peão, induzindo assim um novo tipo de comportamento no automobilista. A promoção de uma forma de conduzir mais respeitadora das pessoas e do ambiente, será um importante contributo para a redução dessa sinistralidade e uma aprendizagem no que se refere à condução em meio urbano.
O entendimento da autarquia em relação às Zonas 30 não é hoje muito diferente. A Câmara tem vindo a aliar esse conceito à promoção da bicicleta como meio de transporte (através do conceito de 30+bici, que implica também a pintura de uma risca verde na estrada), apostando em ciclovias segregadas que conectam bairros e acalmando o tráfego rodoviário dentro dos bairros, de modo a permitir a convivência dos diferentes modos de transporte.
Segundo o site da autarquia, a estratégia em relação às Zonas 30 passa por implementá-las em zonas residenciais, áreas com elevada actividade comercial e na proximidade de escolas. Nestas zonas a velocidade de circulação é reduzida para 30 km/h, um limiar que, dizem os teóricos, reduz a ocorrência e gravidade de sinistros rodoviários.
Alvalade tem sido das freguesias onde mais Zonas 30/30+bici têm sido implementadas recentemente. Em três actos, fazemos uma visita a uma Alvalade e algumas das suas ruas que ficaram ou estão a ficar mais seguras e inclusivas:
1 – quando o automóvel pede estacionamento e o peão até fica a ganhar
O estacionamento ilegal em cima do passeio, muito comum em Alvalade, pode levar ao recorte de lugares regulados nesses locais. No final do dia, o peão também pode ganhar, pois com o estacionamento organizado pode ficar com o seu caminho livre. Foi o que aconteceu na Rua Afonso Lopes Vieira e é o que está a acontecer na Rua Silva e Albuquerque.
Na Rua Afonso Lopes Vieira, próximo à Avenida do Brasil, os peões contam agora com um canal desimpedido de circulação, sem carros estacionados em transversal no passeio. Foram recortados quatro lugares de estacionamento longitudinal e um para cargas e descargas, que não interferem com a deslocação pedonal e com a passadeira.
Já, Rua Silva e Albuquerque, perto do INATEL, o passeio vai passar a ficar livre para peões depois das obras em curso de reorganização do estacionamento naquela zona. Este passeio que mostramos na fotografia estava constante e ilegalmente ocupado por carros, um obstáculo ao peão; com o recorte e legalização desses lugares, passa a ser possível conciliar duas necessidades: o estacionamento automóvel e a circulação pedonal.
2 – quando se tira espaço a carro para aumentar a segurança de todos
A Rua Alberto de Oliveira, onde pode ser encontrada a bonita Biblioteca dos Coruchéus, está a ser transformada numa rua 30+bici, isto é, numa artéria calma onde peões, bicicletas e outros veículos poderão coexistir em segurança. A obra inclui a diminuição dos raios de curvatura no acesso à rua, obrigando o carro a abrandar e impedindo simultaneamente uma eventual paragem em cima da passadeira. Já junto à biblioteca e ao seu jardim, o estacionamento automóvel em perfil transversal foi redesenhado para passar a ser feito longitudinalmente, possibilitando, assim, um aumento substancial da área pedonal.
3 – quando se troca asfalto por árvores
Uma série de intervenções em redor do Mercado de Alvalade e da Avenida da Igreja fizeram nascer uma ampla Zona 30, com várias medidas de acalmia. Apesar de a largura da via não ter sido reduzida em vários pontos para impedir paragens em 2ª fila, foram feitas várias alterações que importam realçar, entre elas:
- a sobre-elevação da via na entrada da Rua Luís Augusto Palmeirim para obrigar os veículos vindos da Avenida de Roma a abrandar e a prestar atenção ao atravessamento pedonal;
- a redução dos raios de curvatura das ruas nos cruzamentos com a plantação de árvores para criar mais sobra e dar algum verde à zona;
- a criação de ilhas e o seu aproveitamento para a plantação de árvores que transmitam a perceção de redução da largura da via aos automobilistas;
- a instalação de estacionamento para bicicletas nas zonas antes das passadeiras de forma a aproveitar aquele espaço, onde o estacionamento de um carro tiraria aos condutores visibilidade da passadeira e dos peões que nela atravessam.