
Cerca de 50 pessoas que utilizam a bicicleta nas suas deslocações diárias em Lisboa vão passar a circular pela cidade com sensores portáteis de monitorização da qualidade do ar. O projecto chama-se Open-Seneca e foi desenvolvido por uma investigadora do Reino Unido; vai estar em teste em Lisboa juntamente com Estocolmo, na Suécia.
A história da Open-Seneca inicia-se em 2018 quando Lorena Gordillo Dagallier, aluna de doutoramento na área da engenharia e sustentabilidade na Universidade de Cambridge, queria aproximar a ciência e a cidadania no caso particular da qualidade do ar.
Lorena juntamente com alguns colegas da universidade procuravam uma forma relativamente barata, acessível e móvel de monitorizar a poluição atmosférica – um conjunto de sensores “embrulhados” num pequeno dispositivo que pudesse se colocado numa mochila ou numa bicicleta, registando ao segundo dados sobre a concentração de partículas poluentes na atmosfera e centralizando essa informação numa nuvem, juntamente com registos de outros voluntários.
A Open-Seneca é a concretização dessa ambição. O projecto foi um dos vencedores da competição tecnológica Women4Climate no ano passado, iniciativa à qual Lisboa esteve ligada. Foi assim que a cidade conheceu Lorena e o seu Open-Seneca e que Lorena e o Open-Seneca conheceram Lisboa. Contactando quase em simultâneo a Câmara de Lisboa e o FabLab Lisboa, a investigadora de Cambridge acabou por chegar ao ponto em que estamos hoje: a sua ideia está a ser lançada na capital portuguesa com o apoio local da autarquia e do seu laboratório municipal de experimentação e fabricação digital, o FabLab Lisboa.

O FabLab Lisboa recebeu cerca de 50 dispositivos Open-Seneca que vai distribuir, de forma gratuita, por 50 voluntários que utilizem a bicicleta como meio de transporte na cidade. Foi feita uma chamada a todos os interessados, tendo sido recebidas uma centena de respostas, segundo nos diz Rafael Calado, coordenador do FabLab Lisboa. A selecção dos candidatos está a ser feita com base no seu perfil de ciclista urbano – procura-se um grupo de voluntários que pedale todos ou quase todos os dia e que circule por diferentes zonas da cidade, de modo a se obter a melhor cobertura possível do território.
Os seleccionados vão ter, entre o próximo domingo e segunda-feira, dependendo do dia que marcaram, uma breve formação nas instalações do FabLab Lisboa no Mercado do Tijolo, na qual irão aprender a montar o seu dispositivo Open-Seneca (ele vai chegar-lhes às peças), a colocá-lo na bicicleta e a usá-lo no quotidiano. Ainda não será nesse dia que levarão o kit de monitorização para casa – esse momento acontecerá mais tarde, idealmente num mesmo momento, para que todos os sensores entrem em funcionamento ao mesmo tempo.
No entanto, esses detalhes ainda não estão fechados e até lá é preciso que todos os dispositivos Open-Seneca sejam calibrados com as duas estações de referência de monitorização do ar existentes em Lisboa. Esse processo é fundamental para corrigir eventuais discrepâncias e erros nos registos por parte de cada sensor.
O kit da Open-Seneca é constituído por uma “carapaça” de plástico resistente e por um pequeno visor, onde é possível saber em tempo real (ao segundo) não só a concentração de partículas poluentes na atmosfera (PM 2.5), mas também a humidade e a temperatura. O ar entra pela parte debaixo do conjunto, onde se encontra todo o circuito electrónico. É aqui que está o “cérebro” da Open-Seneca, os três sensores (ar, humidade e temperatura), um módulo de GPS e outro de Bluetooth para geolocalização e transmissão dos dados sem fios, e um cartão SD para armazenamento da informação como backup.
O dispositivo pode ser emparelhado com o telemóvel e respectiva aplicação (iOS e Android); a partir desta, os dados recolhidos serão enviados de forma anónima para processamento e criação de um mapa da qualidade do ar em Lisboa. Cada voluntário deverá ficar com o seu dispositivo durante pelo menos seis meses mas pode devolvê-lo a qualquer momento e o FabLab Lisboa tratará de encontrar outro voluntário na lista de suplentes.
Os sensores móveis Open-Seneca irão reforçar a rede fixa de monitorização da qualidade do ar e de outros parâmetros de Lisboa, que cresceu recentemente com novos pontos de avaliação e novos tipos de sensores. Contudo, ao colocar um dispositivo de monitorização nas mãos das pessoas está-se a também a aproximá-las de uma realidade invisível da cidade: a sua poluição. É que uma coisa é saber que existe, outra completamente diferente é vê-la, em tempo real, na forma de medições. Num breve teste em torno do Mercado do Forno do Tijolo, em Arroios, constatámos a flutuação rápida dos valores detectados pelo Open-Seneca ao segundo; bastava a passagem de um automóvel, por exemplo, para os números das pequenas partículas poluentes (PM 2.5) subirem – o ideal é que os valores sejam o mais próximos de zero possível.