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Proposta de Moedas para a ciclovia da Almirante Reis é uma pop-up bidireccional no lado descendente

Na segunda sessão pública, o arquitecto e assessor João Castro, do gabinete de Moedas, apresentou a proposta do executivo para a ciclovia da Almirante Reis: uma ciclovia bidireccional no sentido descendente, semelhante à que Medina tinha apresentado aquando da ZER na Baixa-Chiado.

Fotografia de Lisboa Para Pessoas

A 24 de Abril de 2021, em contexto eleitoral, Carlos Moedas tinha deixado bem claro: “se eu for presidente, não há ciclovia na Almirante Reis”, disse em entrevista ao jornal Público. A posição do candidato foi sendo repetida ao longo da campanha, mas o discurso do Presidente mudou: Moedas deixou de prometer a remoção da ciclovia da Avenida Almirante Reis como fizera várias vezes para falar no estudo e apresentação de alternativas à população. O arquitecto João Castro, com mais de 30 anos de experiência de Câmara de Lisboa, foi colocado a liderar um processo de requalificação da Almirante Reis – estão em cima da mesa duas fases, uma a curto prazo e outra a longo prazo; mas na segunda sessão pública, que se realizou esta quarta-feira no Fórum Lisboa, falou-se apenas de proposta para o imediato.

No início da sessão, foi apresentada a proposta em que o gabinete do Presidente Moedas tem estado a trabalhar para resolver os problemas que João Castro diz existirem na solução implementada actualmente: uma ciclovia provisória no lado descendente e com um perfil bidireccional, que possa libertar duas vias de trânsito no sentido ascendente para escoar a acumulação de veículos automóveis que hoje, principalmente a horas de ponta de tarde, se verifica, segundo referiu arquitecto. “A maior preocupação é libertar o lado ascendente da avenida.”

A proposta passa ainda por tornar a via descendente com limite 30 km/h e a via mais à direita no sentido ascendente também com esse limite de velocidade. Com a ciclovia a passar para o lado descendente, a Almirante Reis ficará nesse sentido com uma única via para o transporte individual e o transporte público, mas João Castro espera conseguir com a nova limitação de velocidade e uma gestão inteligente dos semáforos um tráfego em bloco e de modo constante ao longo da avenida.

A segregação da ciclovia proposta será feita com os actuais segregadores Zipper, da empresa Zicla, mas em dupla. Com esta estratégia, pretende-se que veículos de emergência possam usar a ciclovia como corredor de acesso ao Hospital de São José, como acontece actualmente e que o arquitecto de Moedas disse, na última sessão, estar a funcionar muito bem. A ciclovia deverá ter uma largura de 2,40 metros em toda a sua extensão.

Resolve o congestionamento

Com esta solução de curto prazo, João Castro acredita que vai conseguir resolver problemas imediatos de poluição atmosférica, de ruído e de escoamento de tráfego que diz que a ciclovia actual provoca. O arquitecto e assessor do Presidente Moedas levou à sessão dados que indicavam que, depois de implementada a primeira ciclovia na Almirante Reis em Junho de 2020, o comprimento médio das filas de trânsito aumentou mais naquela avenida do que no global da cidade (em que se registou uma diminuição das filas).

O trânsito aumentou também em ruas paralelas, nomeadamente na Rua António Pedro e na Rua de Arroios, mas em particular na primeira – a Rua António Pedro é uma paralela à Almirante Reis com um único sentido ascendente, que começa na zona do Banco de Portugal e que vai até à Alameda. Terá começado a ser usada pelos automobilistas para fugir à Almirante Reis. João Castro levou ainda dados de ruído, poluição atmosférica e as contagens de ciclistas realizadas pelo Instituto Superior Técnico desde Maio de 2017 e até Maio de 2021, que mostram um aumento do número de ciclistas na avenida após a implementação da pista ciclável.

Evolução semanal do comprimento das filas de trânsito na Avenida Almirante Reis, Rua António Pedro e Rua de Arroios, e no global da cidade de Lisboa segundo dados do Waze (fotografias de Lisboa Para Pessoas)

Paralelas descartadas

Defensor de trajectos directos e de uma ciclovia em toda a Avenida Almirante Reis – que numa requalificação de fundo possa ir até ao Areeiro “para levar tráfego para a Gago Coutinho” e criar um percurso em que possa “ser possível evitar o automóvel” –, João Castro levou à sessão duas soluções que já tinham sido estudadas previamente pela Câmara de Lisboa.

Uma delas envolvia ciclovia desde o Martim Moniz até ao cruzamento da Avenida Almirante Reis com a Rua Pascoal de Melo, onde seguiria pela Rua António Pedro em formato bidireccional – “iam perder-se uns 40 lugares de estacionamento” nessa rua, realçou, “numa zona com muita pressão de estacionamento”. A outra – talvez a primeira solução estudada e que chegou a ter projecto desenhado – envolvia contra-fluxos cicláveis e vias partilhadas tanto na Rua de Arroios como na Rua António Pedro, à custa de actuais áreas pedonais e também de estacionamento; no eixo da Almirante Reis, só existiria ciclovia na Rua da Palma entre o Martim Moniz e o início/final da Rua de Arroios.

João Castro reconhece a importância de existir uma ciclovia em toda a Almirante Reis e de não direccionar a bicicleta para ruas paralelas a meio do percurso, por exemplo; disse que isso poderia levar a um “efeito surpresa” tanto para ciclistas como para automobilistas, que encontrariam uma avenida com desenhos e configurações diferentes – alguns ciclistas, como os que já usavam a Almirante Reis antes da ciclovia, iriam simplesmente continuar em frente pela avenida quando a pista ciclável terminasse em vez de utilizarem o percurso.

No Martim Moniz, a vontade de João Castro é colocar o canal ciclável a seguir pelo lado da praça oposto àquele onde está actualmente para criar uma ligação mais directa à Baixa, mas admitiu que “a solução no Martim Moniz depende do que promovermos para a Baixa”, cujo acesso ficará mais condicionado com uma só via de trânsito descendente na Almirante Reis.

Durante a apresentação no Fórum Lisboa, João Castro apresentou o seguinte resumo da solução que está a propor, em vantagens e desvantagens:

VantagensDesvantagens
Permite repor duas vias de circulação no sentido da saída, Martim Moniz/Areeiro,
promovendo maior escoamento do tráfego e diminuição dos níveis de poluição.
Não é uma solução urbana estruturante, linear e simétrica e esteticamente consistente.
Permite assegurar o canal de socorro, de acesso ao Hospital de S. José, à custa da utilização excepcional e integral do canal ciclável. É a única grande vantagem da solução actualmente implementada.Não resolve as viragens à esquerda ao longo da Avenida, que evita um traçado linear.
Mantém apenas uma via no sentido sul, da entrada da cidade para o centro,
condicionando assim o acesso à baixa de tráfego excessivo. No sentido descendente e na direita ascendente a via será zona 30.
Pista ciclável adaptada à geometria existente, salientando o mau desenho da Avenida, dadas as inúmeras alterações pontuais das últimas décadas.
Gestão semafórica inteligente, permitindo conduzir o tráfego, em bloco, em contínuo ao longo da Avenida criando o efeito de pelotão.Manutenção de um separador central supérfluo, irregular, com um alinhamento de tílias “raquíticas” que não têm hipóteses de se desenvolver, comprometendo a qualidade de todo o espaço canal existente como uma AVENIDA!
Manutenção de todo o estacionamento, de todos os lugares de cargas e descargas.Canal de transporte individual é o mesmo que o transporte público no sentido da descida.
Mudança rápida com um impacte urbano reduzido. Sem alteração de geometria.
Apenas envolve raspagem de pintura, remoção e localização de balizadores e alteração da localização de “ilhas em lancil realizadas recentemente para localização dos semáforos.

Uma terceira pop-up

João Castro realçou que a estratégia do novo executivo camarário passa por “oferecer aos munícipes condições para que possam não usar o automóvel”“a nossa estratégia é oferecer, não é obrigar por decreto” – e que é importante não queimar etapas, nem “nos precipitarmos no desenho” do espaço público. Ainda assim, reconheceu que a proposta que o gabinete de Moedas coloca em cima da mesa é “uma terceira pop-up”, que permitirá ensaiar a solução definitiva. “Se correr bem esta configuração”, pode ser mantida na prometida requalificação de fundo da Avenida Almirante Reis, sobre a qual pouco se falou nesta sessão. O arquitecto voltou a referir que nessa fase pretende eliminar as viragens à esquerda para melhor ordenar e gerir o tráfego, e criar linhas paralelas de movimento ao longo da avenida. Admitiu que não se vai conseguir “aumentar muito o espaço pedonal”, mas lançou a ideia de “durante o fim-de-semana secar um dos lados da avenida”, fechando-a aos carros e abrindo-a às pessoas.

Recorde-se que a primeira ciclovia na Avenida Almirante Reis foi implementada em Junho de 2020 pelo então executivo de Fernando Medina no âmbito de um programa de ciclovias pop-up, isto é, de ciclovias de baixo custo e de rápida implementação fruto do contexto pandémico. As críticas recebidas levaram à reconfiguração do perfil ciclável da avenida em 2021 para o actual desenho: duas unidireccionais, uma em cada sentido, junto ao corredor central. Nessa mesma altura, a ciclovia que só ligava o Martim Moniz à Praça do Chile foi prolongada até à Alameda, ligando aí à ciclovia da Avenida Guerra Junqueiro, e pelo Martim Moniz até à “porta” da Praça da Figueira. A actual solução é uma terceira pop-up que procura servir de “penso rápido” e que poderá ser executada ainda este ano, em “seis, sete meses”, “até ao Verão”.

É a 1ª proposta de Medina?

Olhando exclusivamente para o perfil da proposta apresentada, esta é precisamente a primeira ideia de Fernando Medina para a Almirante Reis, que tinha sido apresentada em Janeiro de 2020 pelo então Presidente da Câmara no âmbito do projecto ZER ABC. Essa mesma ciclovia acabou por ser executada em Junho desse ano não com o aspecto definitivo que a ZER pretendia mas como a tal solução temporária (pop-up), mas em vez do lado descendente que inicialmente tinha sido pensado a ciclovia foi implementada no lado ascendente. Esta mudança terá tido como base preocupações no acesso de veículos de emergência ao Hospital de São José, uma vez que inicialmente não foi previsto que a ciclovia na Almirante Reis – definitiva ou pop-up – pudesse servir de canal de emergência.

A primeira proposta de Medina para a Almirante Reis (imagem via CML)
Ciclovia pop-up de Moedas1ª ciclovia de Medina
Perfil bidireccionalPerfil bidireccional
Lado descendenteLado descendente
Na Rua da Palma e em toda a Avenida Almirante Reis até à Alameda, como hojeNa Rua da Palma e na Avenida Almirante Reis até à Rua Febo Moniz
Os mesmos segregadores Zipper, da empresa Zicla, que estão na solução actualSegregadores do tipo pilaretes
Possibilidade de a ciclovia funcionar como corredor de emergênciaCorredor de emergência na ciclovia não previsto, uma vez que seria restringido o trânsito na Baixa, libertando o canal viário
Intervenção pop-up na actual avenida, sem obra complicada e sem mexer em lancisIntervenção de fundo com mudanças no desenho da avenida e um novo piso elevado em relação à via descendente ao lado

A sessão pública que decorreu esta quarta-feira, 24 de Março, no Fórum Lisboa foi a segunda aberta a toda a população. Participaram sobretudo membros da comunidade ciclista da cidade, reforçando algumas das posições que já tinham deixado na sessão anterior. Representantes políticos de vários partidos também marcaram presença, assim como pessoas da própria Câmara de Lisboa. Além de João Castro, participou ainda na sessão o arquitecto Paulo Ferreira, que desenhou os primeiros ensaios da nova ciclovia. Ambos escutaram as 30 pessoas que puderam inscrever-se para falar. A sessão começou às 21 horas e durou para lá da uma da manhã, mas quando por essa hora o Fórum Lisboa fechou portas a conversa continuou em ambiente informal à porta do edifício.

Espera-se agora que a proposta final da nova ciclovia venha a ser apresentada publicamente e que estas sessões de participação continuem, uma vez que resolvida a questão de curto prazo a conversa deverá centrar-se na solução de longo prazo.