Ao detalhe: a proposta do Livre para colocar “a rolar” o debate sobre o futuro da Almirante Reis

O Livre antecipou-se a Carlos Moedas e avançou para a tão adiada discussão de fundo sobre a Almirante Reis, apresentando a sua proposta para a Avenida e que vai muito além da tão badalada ciclovia.

Imagens cortesia de Livre/DR

O Livre discorda de uma terceira solução pop-up para a ciclovia da Almirante Reis e entende que é tempo de começar o tão adiado debate sobre uma requalificação de fundo daquele eixo. Nesta terça-feira, ao final do dia, no espaço LACS nos Anjos, deu o primeiro passo, apresentando em maior detalhe a sua proposta para aquela avenida e envolvente – uma proposta que inclui a ciclovia mas que vai muito além disso.

A sessão contou com a presença de Rui Tavares, da vereadora substituta Patrícia Gonçalves e do arquitecto Francisco Costa, o autor principal da proposta. Várias dezenas de participantes juntaram-se no LACS, entre eles, dois vereadores socialistas: Miguel Gaspar, que teve no executivo anterior a pasta da mobilidade, e João Paulo Saraiva. Após um apanhado histórico sobre a avenida, feito por Rui Tavares, seguiu-se um momento de diagnóstico da actual situação, em particular do contexto gerado pela ciclovia, pela vereadora Patrícia Gonçalves. Por fim, Francisco Costa apresentou referências internacionais de avenidas com uma dimensão semelhante à da Almirante Reis e explicou ao detalhe a ideia do partido para aquele eixo.

Fotografia de Lisboa Para Pessoas

Durante o encontro, que teve cerca de duas horas de duração, Rui Tavares não poupou críticas ao executivo de Carlos Moedas, referindo que o Livre quer “fazer um debate de forma realmente aberta” e que esta proposta que apresenta é uma forma de pôr a discussão sobre o futuro da Almirante Reis “a rolar”. O líder do Livre acusou Moedas de comprar uma “guerra cultural entre automobilistas e ciclistas” e que acabou por não cumprir nenhuma das suas promessas sobre o tema: “nem se acabou com a ciclovia, nem se ouviu toda a gente”, nem se promoveu um “processo de consulta pública que não desse o resultado pré-determinado” de criar uma terceira versão da ciclovia no lado descendente da avenida.

Tendo Lisboa uma avenida da Liberdade e outra da República, o Livre propõe criar na Almirante Reis a “Avenida da Igualdade” – não se trata de uma mudança na toponímia, mas de uma estratégia para aquele eixo, que comece com uma reformulação do espaço público. A ideia é equilibrar as percentagens modais: reduzir a presença do automóvel de 63% para 24%, dar ao transporte público 24% de espaço dedicado, dar 36% ao peão e ainda 16% à bicicleta. “Os grandes privilegiados desta proposta são os transportes públicos e o peão. Os ciclistas não ganham assim muito”, resumiu Rui Tavares.

Fotomontagem geral da proposta (imagem cortesia de Livre/DR)

Como te contámos aqui, o Livre propõe uma Avenida Almirante Reis com passeios largos, acessíveis e contínuos, mais passadeiras e todas as passadeiras sobrelevadas para acalmar o tráfego, criar zonas partilhadas em todos os cruzamentos, uma ciclovia undireccional em cada sentido, corredores BUS com paragens acessíveis e seguras em relação à ciclovia, remover o separador central e passar a arborização para as lateriais, uma nova iluminação pública pensada para as pessoas e não para os veículos, e a remoção de todo o estacionamento à superfície, com a deslocalização de lugares de cargas e descargas para as perpendiculares em todas as intersecções junto à avenida.

No que toca ao perfil da Avenida, o Livre está a sugerir duas vias de trânsito com 3 metros, uma em cada sentido, acompanhadas por uma via BUS em cada sentido também (também com 3 metros), duas ciclovias unidireccionais com 1,5 metros e passeios mais largos (3 a 4,5 metros, com 1 metro para a plantação de árvores onde não há bocas de Metro).

Imagem cortesia de Livre/DR
Imagem cortesia de Livre/DR

Na sessão desta terça-feira, foram apresentados mais algumas particularidades da proposta que não tinham sido reveladas na reunião pública da Câmara:

  • possibilidade de o corredor BUS ter outras funções noutros horários, de menor circulação do transporte público: por exemplo, poder ser utilizado para cargas e descargas de manhã cedo e durante a noite (23 – 7 horas);
  • fazer um levantamento de toda a oferta de estacionamento no eixo e envolvente da Almirante Reis – de hotéis, superfícies comerciais, edifícios de escritórios, etc – para que essas infraestruturas possam ser utilizadas, quando não estiverem a sê-lo pelos respectivo proprietários, para estacionamento por parte dos residentes da zona;
  • avaliar a possibilidade de os lugares de cargas e descargas criados nas perpendiculares à avenida puderem ser utilizados como estacionamento para residentes no período nocturno, em mais uma estratégia de usos híbridos;
  • estudar a construção de um parque em silo ou estrutura subterrânea no quarteirão da Portugália e negociar avenças mais acessíveis nos parques já existentes. No entanto, Rui Tavares disse que “se se tem de sacrificar em algum lado, na nossa proposta tem de ser no estacionamento e há que ser evidente nisso”;
  • possibilidade de ocupações temporárias na Avenida, como feiras e festivais de rua (de gastronomia ou alimentação, literários ou de música), que levem ao corte parcial ou total da circulação rodoviária. Estas ocupações podem ser feitas num ou dois quarteirões apenas, e podem também ser feitas só numa das quatro vias;
  • a proposta implica deslocar em cerca de meio metro, para o interior da Avenida, os actuais carris do eléctrico, de modo a que seja possível inserir o canal ciclável sem deslocar as bocas do Metro nem prejudicar a mobilidade pedonal;

Para a Alameda Dom Afonso Henriques, o arquitecto Francisco Costa sugere ligar as duas partes daquela área verde, tornando a parte central exclusiva para transportes públicos, peões e bicicletas. Os restantes veículos teriam de dar a volta à Alameda, o que poderia reduzir o tráfego de atravessamento na zona. Com esta ideia, o atravessamento pedonal de uma parte para a outra da Alameda ficaria mais facilitado do que é hoje em dia, em que as pessoas que estejam na área relvada são levadas a passar a estrada pelo menos três vezes.

Proposta para a Alameda (fotomontagem cortesia de Livre/DR)

A proposta do Livre pode ser feita de modo faseado e evolutivo, isto é, pode ser implementada em cinco passos. A saber:

  1. primeiro e sem mexer em nada (nem mesmo na ciclovia), criar percursos pedonais acessíveis e confortáveis, contínuos e seguros com pelo menos 2 metros de largura, livres de quaisquer obstáculos ou obstruções ao longo de toda a Avenida Almirante Reis, incluindo na Rua da Palma. Francisco Costa referiu que este passo “pode ser feito já amanhã”, por representar um esforço financeiro pequeno;
  2. depois, criar passadeiras elevadas acessíveis entre os cruzamentos existentes, a cada 100 metros. Segundo Francisco Costa, a Avenida Almirante Reis tem uma largura que impõe atravessamentos pedonais menos distantes dos que existem hoje em dia;
  3. um terceiro passo para redesenhar e acalmar os cruzamentos existentes, elevando-os e multiplicando as possibilidades de atravessamento pedonal. As pessoas passariam a poder atravessar na diagonal se quisessem;
  4. num quarto passo, seria feita a eliminação do separador central, o alargamento de passeios, a criação das ciclovias junto ao passeio, e a implementação dos corredores BUS e das paragens acessíveis;
  5. o último passo, em simultâneo com a etapa anterior, consistira na criação dos dois novos alinhamentos arbóreos, um em cada lado da Avenida, com arborização de grande escala.
Passo 1 – percursos acessíveis (imagem cortesia de Livre/DR)
Passo 2 – passadeiras intermédias sobrelevadas (imagem cortesia de Livre/DR)
Passo 3 – cruzamentos partilhados e sobrelevados (imagem cortesia de Livre/DR)
Passo 4 – ciclovias, corredores BUS e eliminação do corredor central (imagem cortesia de Livre/DR)
Passo 5 – arborização (imagem cortesia de Livre/DR)

O arquitecto Francisco Costa admitiu que se possa estudar a sua proposta num quarteirão ou dois antes de se avançar para toda a Avenida. Rui Tavares, por seu lado, acredita que esta planificação do Livre “não está nas dezenas de milhões de euros” ao contrário do que diz que Moedas pretende gastar na Almirante Reis; poupando numa terceira ciclovia pop-up, Tavares diz que haverá mais orçamento disponível para investir noutras artérias necessitadas daquela zona ou de outras partes da cidade, como é o caso, por exemplo, da Rua de Arroios ou da Avenida Almirante Gago Coutinho, duas requalificações muito aguardadas.

A proposta do Livre poderá ser redesenhada com uma restrição da circulação do trânsito automóvel no centro da cidade. Nesse cenário, “podemos ser mais ambiciosos”, disse Francisco, propondo aumentar os passeios para três metros de largura no mínimo e tornar a avenida exclusiva para trânsito local e transporte público. Com uma ZER na Baixa-Chiado, seria possível dar 60% ao peão e não seriam precisos corredores de transporte público dedicados, uma vez que, havendo menos trânsito automóvel, a Avenida poderia ter apenas duas vias.

Proposta com ZER (imagem cortesia de Livre/DR)


O Livre quer pedir ao LNEC um estudo de tráfego detalhado, com uma contagem de todos os veículos que circulam pela Avenida Almirante Reis – com a possibilidade de os moradores participarem activamente no mesmo e, assim, ajudarem a autarquia – que detalhe a origem e destino dos veículos. Assim, acredita o partido, poderá aferir-se a real percentagem de trânsito local da Almirante Reis e envolventes, de moradores e clientes do comércio, e a percentagem de tráfego de atravessamento. No entender do Livre, o tráfego de atravessamento corresponde a veículos que podem e devem ter “escoamento” por outras vias, em vez de atravessar a cidade por um eixo com a vivência desta Avenida, a bem dos interesses locais.

Depois de uma primeira apresentação pública e debate no LACS – que o Livre fez questão de gravar e de transmitir online, ao contrário do que sucedeu com as sessões participadas promovidas pela Câmara de Lisboa –, o partido pretende continuar a trabalhar nesta proposta com todas as pessoas, partidos e entidades que queiram fazer parte dela, “na procura por construir uma avenida que seja segura, despoluída, arborizada e para todos”. “A nossa questão não é a ciclovia mas a avenida e a cidade”, disse Rui Tavares. “Somos um partido que quer colocar esta ideia a discussão” e que “quer fazê-lo com as pessoas e não contra as pessoas”.

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