A principal artéria do bairro de Campo de Ourique, em Lisboa, vai ganhar passeios confortáveis e acessíveis, passadeiras mais seguras e bancos para sentar. Mas, numa rua onde passam seis mil carros por dia, nada será feito para reduzir este tráfego.
Segundo estimativas da Câmara de Lisboa, circulam diariamente cerca de seis mil carros na Rua Ferreira Borges, a principal artéria rodoviária do bairro de Campo de Ourique. Não se sabe quantos desses veículos são tráfego local e quantos representam tráfego de atravessamento (isto é, que apenas estão a utilizar a rua para entrar e sair da cidade, não pertencendo ao bairro). De qualquer modo, a autarquia não pretende alterar o paradigma: a Rua Ferreira Borges vai continuar a ter o perfil maioritariamente automóvel que tem hoje, na requalificação apresentada agora à população e que está prevista para 2024/25.
A revitalização da principal rua de Campo de Ourique vai envolver o arrancar dos carris de eléctrico, actualmente desactivados e degradados, bem como do piso de cubos de granito. Na sua vez, será colocado um piso liso de asfalto, que tornará a circulação mais confortável para automóveis mas essencialmente para motas e bicicletas. O piso empedrado que tão bem caracteriza a rua será mantido apenas na área de estacionamento.
De resto, a intervenção na Rua Ferreira Borges vai concentrar-se na mobilidade pedonal: os passeios passarão a ter um pavimento nivelado em lajes de pedra lioz, que dará mais conforto ao caminhar e que ajudará a evitar quedas; esse pavimento confortável será acompanhado por pedra de calçada nas áreas mortas ou de menor utilização, mantendo assim parte da identidade da cidade. A calçada terá elementos decorativos, conferindo à Ferreira Borges um design próprio. Por outro lado, todos os atravessamentos pedonais (passadeiras) passarão a ser acessíveis, com rebaixamentos e a colocação de guias tácteis, e mais seguros, com o prolongamento do espaço pedonal para a zona viária de modo a reduzir a distância de atravessamento (e, por isso, o tempo de exposição ao tráfego rodoviário).
A autarquia vai também rever a semaforização para, segundo diz, facilitar o atravessamento dos peões, vai requalificar as caldeiras das árvores, colocar de bancos ao longo da rua de modo a oferecer zonas de descanso, optimizar as cargas e descargas com o objectivo de evitar a paragem na rodovia, e vai ainda aproveitar a obra para mexer na rede pública de saneamento e nas infraestruturas de telecomunicações, tirando os fios dos edifícios.
Após a requalificação, circular a pé na principal artéria da freguesia de Campo de Ourique ficará melhor para caminhar, conviver e ir às compras. A Câmara de Lisboa promete, com esta obra, aumentar a circulação de pessoas a pé e, desse modo, dinamizar o comércio local da Ferreira Borges, onde existem cerca de 80 estabelecimentos e três quiosques; promete também melhorar a segurança pedonal e rodoviária e oferecer melhor qualidade de vida dos moradores através da disponibilização de um espaço público mais agradável e confortável. Por outro lado, com a colocação do novo piso de asfalto em substituição do empedrado, promete-se uma diminuição do ruído.
Podes consultar, de seguida, a apresentação e o projecto de requalificação da Rua Ferreira Borges, conforme apresentado à população:
O diagnóstico da Câmara e da Junta
No diagnóstico feito, a Câmara aponta uma Ferreira Borges com passeios desnivelados, com pavimentos pedonais e rodoviários degrados, sem acessos rebaixados às passadeiras na maioria dos cruzamentos, com vários obstáculos físicos à mobilidade pedonal, e ainda com patologias na rede de saneamento.
Uma parte deste diagnóstico já havia sido feito pela Junta de Freguesia de Campo de Ourique entre 2020 e 2021. O seu Presidente, Pedro Costa, tinha feito da Ferreira Borges uma das suas prioridades e promoveu junto da população uma discussão sobre o futuro daquele eixo. O resultado foi um relatório com os problemas da rua e algumas sugestões, bem como um estudo prévio (proposta) de requalificação.
Aspectos como a “necessidade de substituir o piso da rua” ou a “reparação dos passeios com a inclusão de piso confortável” tinham feito parte também do diagnóstico elaborado pela Junta de Freguesia em conjunto com a população. Sobre o carril, existiu neste processo participativo “uma grande maioria” a pedir a sua retirada e, ao mesmo tempo, uma “uma pequena, mas relativamente bem estruturada, minoria” a pedir não só a manutenção do mesmo, mas também a “reactivação da carreira que permitiria a ligação circular das linhas do 24 e 28 que circulam em perpendiculares ao eixo da Rua Ferreira Borges”.
No processo participativo promovido pela Junta de Campo de Ourique ficou registada ainda “uma posição minoritária acerca da retirada de um sentido de trânsito para a instalação de uma ciclovia”, algo que, no relatório, é logo empurrado para o “longo prazo” e para uma outra eventual intervenção.
A apresentação da proposta de requalificação da Rua Ferreira Borges decorreu no passado dia 7 de Setembro, no Cinema Europa, sem transmissão online. Aberta à população, a sessão serviu também como momento de auscultação, sendo que os comentários feitos pelos presentes serão agora considerados pelos Serviços Municipais em eventuais melhorias ao projecto. A expectativa é que esse projecto possa ser finalizado ainda neste ano, para que, em 2024, se possa lançar o concurso público para encontrar um empreiteiro. O início da obra está previsto para 2024/25. A requalificação da Rua Ferreira Borges está a cargo da equipa do Centro Histórico da Unidade de Coordenação Territorial (UCT) da autarquia – isto é, pela Unidade municipal responsável pelas pequenas grandes obras do território.
Na referida sessão, as primeiras três intervenções destacaram a ausência da bicicleta na proposta de requalificação. “Queria saber se em todo este projecto ninguém pensou na bicicleta. Campo de Ourique é dos poucos bairros planos de Lisboa e fico surpresa com o pouco de bicicleta que circula no bairro. Penso que a requalificação da Ferreira Borges sem a bicicleta tem pouco sentido“, lamentou uma munícipe. “Temos muito trânsito na Ferreira Borges. Não estão a salvaguardar as duas saídas, a das Amoreiras e a da saída de Lisboa”, apontou outra pessoa, destacando que “o estacionamento é uma coisa que podia sair da Ferreira Borges”. “Moro em Campo de Ourique e sou lojista aqui também. Não temos estacionamento em Campo de Ourique, infelizmente não temos estacionamento. Meter uma via para bicicletas dinamizaria a rua de outra forma”, apontou. Por seu lado, outro munícipe disse haver “uma priorização aos automóveis” e que é “um desleixo” não ter sido pensada uma ciclovia naquela rua “que permita chegar, por exemplo, às Amoreiras”.
Carlos Gaivoto, técnico da Carris há mais de 45 anos, criticou o projecto por “transformar a Rua Ferreira Borges num eixo unimodal – no fundo, só puseram lá o carro –, ao contrário do que se faz em várias cidades europeias, em que a prioridade é dada ao transporte colectivo em sítio próprio. Muitas dessas cidades europeias, não só capitais, têm manifestado através do transporte colectivo em sítio próprio um meio para requalificar o eixo”. “Há conceitos contraditórios com os objectivos estratégicos da cidade, que precisa de reduzir o tráfego automóvel e de dar prioridade ao transporte colectivo. Dizer que o carril estar obsoleto ou que é uma redundância é errado”, acrescentou, referindo que a Ferreira Borges não deveria ter estacionamento e que nas contagens de tráfego realizadas “nem sequer perceberam” quanto desse tráfego é gerado pelo bairro de Campo de Ourique e quanto é atravessamento.
A população interessada poderá entrar em contacto com os responsáveis por este projecto obra através do e-mail [email protected]. Para falar com a Junta de Freguesia de Campo de Ourique, o e-mail mais indicado é o [email protected].