Conhece a ideia dos arquitectos que ficaram em segundo lugar no concurso da futura Praça do Martim Moniz.
Já tínhamos ficado a conhecer a proposta vencedora para a futura Praça do Martim Moniz. Trazemos-te agora a ideia do segundo classificado do concurso lançado pela Câmara de Lisboa, em que arquitectos foram desafiados a repensarem aquela praça e a transformá-la num jardim aberto a todos. O projecto que ficou em segundo lugar tem, naturalmente, semelhanças com aquele que foi premiado em primeiro – uma vez que seguiu os mesmos pré-requisitos do concurso – mas várias diferenças na abordagem seguida.
Em primeiro lugar, parece existir uma maior densificação da arborização, disfarçando o canal rodoviário que se mantém nesta praça, que, à primeira vista, pode parecer exclusivamente pedonal. Há zonas de bosque onde se pode apanhar sombra, mas também áreas de relvado para apanhar sol. E várias zonas de estadia viradas para o bairro da Mouraria. A circulação rodoviária acontece apenas num dos lados da praça, através de um prolongamento da Rua da Palma, que, nesta proposta, tem apenas uma via por sentido em vez de duas.
Também neste projecto é sugerida uma rotunda para solucionar a ligação entre o final da Avenida Almirante Reis/Rua da Palma e os demais arruamentos, só que situada no topo norte da praça e não a sul. As linhas do 28 mantém-se no mesmo sítio, promovendo a circulação do icónico eléctrico amarelo pelo meio da praça, em coexistência com os peões. Por seu lado, o canal ciclável acompanha o prolongamento da Rua da Palma, seguindo quase em linha recta até à Praça da Figueira (no projecto vencedora a ciclovia vai pela Rua João das Regras como acontece hoje e tem algumas descontinuidades ao longo do seu percurso).
Em relação à proposta vencedora, o segundo classificado é mais ambicioso na redução da área para carros e outros transportes rodoviários. Na verdade, o projecto sugere uma diminuição de aproximadamente 34% de área rodoviária para apenas 17%.
Ao nível da estrutura verde, a proposta sugere técnicas para permitir o assentamento e desenvolvimento de árvores de porte considerável sobre o parque subterrâneo do Martim Moniz, e também a acumulação de água numa pequena bacia de retenção que, na praça, ganha uma função lúdica de “espelho de água”. Sugere-se um pinhal onde pinheiros, choupos e freixos possam conviver e ajudar a desenhar a encosta, um prado de sequeiro biodiverso que possa ser ele também um promotor de mais biodiversidade, e uma floresta urbana que ajude a mitigar o efeito das ilhas de calor através da sombra e evapotranspiração. De resto, a proposta substancia um quiosque e várias zonas de estadia, bem como uma relação de proximidade e de fusão entre a praça e a sua envolvente, nomeadamente a Torre de Pêla, as Escadinhas da Saúde e o Castelo de São Jorge, fomentando um corredor verde.
Esta proposta resulta de um pequeno consórcio entre ateliês de arquitectura: por um lado, o atelier de Adriano Niel; por outro, o Cossement_Cardoso, dos arquitectos Charles Cossement e Gil Menezes Cardoso. A arquitectura paisagista foi tratada pelas arquitectas Sílvia Basílio, do estúdio In-loco, e Raquel Soares, do Pátio Atelier. O projecto contou ainda com a colaboração de uma equipa multidisciplinar composta por Rita Castel’Branco (Mobilidade), Pedro George (Urbanista), Jorge Gaspar (Geógrafo), Rosanna Helena Bach (Artista), Miguel Mourão (Visualizações 3D) e ainda os engenheiros Marco Caixa, Gina Rolim, Maria de Fátima Leal, José Duarte, João Berlenga e João Carlos Sousa.”
De seguida, podes ler a memória descritiva do projecto e consultar mais informação.
Do passado retém-se a memória de um vale entre colinas e de um curso de água que rumava ao Tejo, aos quais se seguiram camadas de terra produtiva, onde amálgamas sociais desde há muito se fizeram aqui paisagem. Do líquido ao sólido, a Praça do Martim Moniz é atração que emana da desordem, do caos, da permissibilidade. Confluências, conflitos e harmonias são quotidiano deste lugar – um palco social de riqueza ímpar, onde o desconforto de um ambiente artificial prevalece.
Mantendo este palco como património, recupera-se a origem do lugar num processo de renaturalização. Sobre esta tela vazia abrem-se rasgos para que a natureza volte a emergir e contamine a cidade. Rasgos que são nascente, guelras que se integram no sistema respiratório da cidade. Linhas que antes eram limite, agora apontam, sugerem, mas nunca confinam – uma desconstrução do limite que a praça impunha, convidando à permeabilidade e liberdade.
O jardim reflete uma composição de três rasgos que criam distintas topografias e massas vegetais – pinhal, choupal e floresta. Os dois primeiros marcam a entrada a norte. Sob o pinhal, a poente, abre-se uma clareira virada à Mouraria e ao Castelo. A nascente, o choupal sombreia um terreiro onde um anfiteatro fresco dinamiza a vida social e comercial. A sul, uma densa floresta urbana e uma encosta protegem uma clareira que contempla a Graça e a Senhora do Monte. À paisagem introduz-se o conceito de mediterrâneo fusionado: vegetação mediterrânica como base maioritária funde-se e harmoniza-se com vegetação exótica, num diálogo expressivo com as culturas sociais que aqui povoam. Estes três momentos convergem para um centro: uma praça de água. Água encaminhada pela tensão do vale que aqui desagua e é retida numa suave barragem. Forma-se um plano espelhado, de limite indefinido, cujo nível se assume dinâmico ao longo do ano. Para aqui, tudo conflui – a topografia e a água, símbolo da vida, tornam-se chão comum, união entre culturas, memória do passado e espelho do presente. Com esta centralidade espacial e simbólica, o jardim abre-se à Mouraria.
Explorando as dinâmicas deste lugar de transição, as pessoas tornam-se elemento privilegiado de uma mobilidade fluida, garantindo-se livre circulação, expressão e apropriação, num jardim que comemora a identidade natural e a riqueza humana deste lugar. O Jardim da Mouraria é uma celebração às pessoas, às gentes da Mouraria, as de cá e as de lá, as de ontem e as de amanhã, as que passam e as que permanecem.
– memória descritiva