Em Lisboa, existem mais de 400 bebedouros públicos, mas não é fácil saber onde estão. Em Cascais, a autarquia disponibiliza um mapa online de todos os bebedouros do concelho. O acesso gratuito a água fresca e potável continua a ser um desafio nas cidades, especialmente em dias de calor.
Num dia quente de Agosto, numa paragem de autocarro em Alfragide, um senhor pergunta a outros passageiros se têm água. Eis que uma senhora explica que, ali perto, há um segurança que, por boa vontade, deixa utilizar a torneira do armazém industrial onde trabalha. O acesso a água fresca, potável e de qualidade é essencial principalmente durante o Verão, mas não é fácil encontrar bebedouros gratuitos, apesar dos esforços das autarquias e empresas de água em instalá-los.
Em Lisboa, existem, segundo a Câmara, mais de 400 bebedouros georreferenciados em espaços públicos da cidade, dos quais, 200 foram instalados recentemente no âmbito da “Rede de Bebedouros de Lisboa”, um projecto entre a autarquia e a EPAL. Concretizada entre 2020 e o ano passado, esta rede conta com uma nova geração de bebedouros: estão ligados à rede de água da EPAL, através de ramais curtos, de modo a garantir a manutenção estável da temperatura da água e a sua qualidade, em especial nas épocas de ondas de calor e temperaturas permanentemente elevadas. Quanto aos equipamentos, estes têm uma torneira para o enchimento de garrafas, com um repuxo para beber água com a boca, como habitualmente, e alguns possuem ainda um recipiente para cães.
A Câmara de Lisboa garante que monitoriza a água dos bebedouros da cidade e que, “para assegurar que a água fornecida cumpre todas as disposições regulamentares”, o Laboratório de Bromatologia e Águas da autarquia desenhou um plano de amostragem para realizar análises microbiológicas e físico-químicas da água. “Desta forma, garantimos que a água fornecida aos lisboetas e visitantes mantém todos os critérios de excelência em termos de qualidade”, explica o Município.
No entanto, não existe uma forma fácil e acessível de saber onde estão estes 200 bebedouros da nova “Rede de Bebedouros de Lisboa” – nem tão pouco os restantes 200 bebedouros, mais antigos. A EPAL chegou a ter uma aplicação para iOS e Android chamada “H2O Quality”, onde era possível saber o caminho até ao bebedouro mais próximo e aceder aos resultados da qualidade da água da torneira. Mas esta app, lançada apenas em 2019, já não está disponível na loja de aplicações para Android; e quanto à versão iOS, apesar de ainda dar para fazer download, ela não funciona, uma vez instalada.
Um mapa escondido
Não há, assim, forma prática de saber onde estão os 200 bebedouros em Lisboa. Apesar de haver georreferenciação destas infraestruturas, esses dados não estão disponíveis ao público de forma acessível, através de uma aplicação ou de um mapa online. Na plataforma de dados abertos através do site Lisboa Aberta, os bebedouros estão disponíveis como “elementos de água”. Pesquisando pela palavra mais óbvia, “bebedouro”, não se consegue chegar ao resultado desejado.
Segundo os dados abertos da autarquia, informação que pode ser visualizada através de um mapa interactivo, existem exactamente 411 bebedouros, dos quais cerca de metade (49%) estão aptos para mobilidade reduzida. Não existe informação disponível sobre os bebedouros avariados e em funcionamento, nem detalhes sobre os modelos que têm taça para animais ou que permitem o enchimento de garrafas. Apesar de dar para consultar um mapa destas infraestruturas através da plataforma de dados abertos da Câmara, como vimos, não é uma informação que está muito acessível, nem a interface é a mais amiga de utilizadores comuns.
Cascais tem mapa online acessível
Mais fácil é saber onde estão os bebedouros de Cascais. A Câmara de Cascais preparou um mapa online com a localização de todos os bebedouros, permitindo inclusive saber que tipo de bebedouro existe em cada local – se é um equipamento inclusivo, para pessoas em cadeira-de-rodas; se é um bebedouro simples, só com repuxo; se tem torneira para enchimento de garrafas; se tem taça para cães… Este mapa está em constante actualização e, se existir alguma informação incorrecta ou em falta, basta preencher um formulário para ajudar a autarquia cascalense a corrigir.
Cascais é o único município de toda a área metropolitana de Lisboa a disponibilizar a localização de todos os bebedouros existentes no concelho. Note-se que estas infraestruturas são uma responsabilidade partilhada entre a Câmara e a empresa Água de Cascais, e o objectivo é garantir o acesso da população a água potável de qualidade.
Bebedouros inclusivos
Tal como em Lisboa, existem várias gerações de bebedouros em Cascais, mas os equipamentos mais recentes reflectem uma preocupação crescente com a acessibilidade e a inclusão. Estes equipamentos são desenhados para oferecerem uma altura adequada para que pessoas com mobilidade reduzida possam aceder à água facilmente. Além disso, muitos deles estão equipados com taças especialmente concebidas para que cães e outros animais possam também saciar a sede, tornando os espaços públicos mais acolhedores para todos. Uma característica distintiva dos novos bebedouros é a presença de uma torneira alta, além do tradicional repuxo, o que permite o enchimento de garrafas reutilizáveis. Esta funcionalidade é cada vez mais valorizada pelos utilizadores, que procuram reduzir o consumo de plásticos descartáveis e adoptar práticas mais sustentáveis no seu dia-a-dia.
Na Amadora, a Câmara também investiu, em 2019, na modernização e acessibilidade dos bebedouros nos principais parques urbanos da cidade, garantindo que todas as pessoas possam desfrutar de água potável gratuita enquanto passeiam ou fazem exercício. Em Oeiras, por exemplo, os bebedouros mais recentes foram instalados ao longo do Passeio Marítimo e, tal como noutros municípios, oferecem dupla valência, servindo tanto as pessoas como os seus animais de estimação. Esta iniciativa é parte de um esforço contínuo para renovar e expandir a rede de bebedouros no concelho.
No Seixal, a Câmara Municipal adotou uma abordagem participativa, permitindo que os cidadãos solicitem a instalação de novos bebedouros através de um formulário online. Esta iniciativa garante que as necessidades e preferências da população sejam consideradas na expansão destas infraestruturas. Na Moita, os novos equipamentos são também mais acessíveis a pessoas e aos seus animais.
Sem água
Apesar destas melhorias, um dos desafios que ainda persiste em cidades como Lisboa é a manutenção contínua dos bebedouros. Frequentemente, os equipamentos estão avariados e, tal como não existe um mapa online dos bebedouros existentes, também não há forma de as pessoas saberem qual o bebedouro mais próximo que está a funcionar. A implementação de uma solução tecnológica que permitisse monitorizar o estado dos bebedouros poderia aumentar significativamente a sua utilização e contribuir para uma cidade melhor preparada para os dias de calor.
É frequente não só em Lisboa como noutras cidades e localidades da área metropolitana encontrar bebedouros sem água, quer seja por estarem desligados, quer por estarem avariados. Em 2020, a EPAL e a Câmara de Lisboa anunciavam a intenção de revitalizar alguns dos mais icónicos chafarizes da cidade, como o Chafariz das Garridas, em Benfica e o Chafariz do Intendente. A ideia seria estas estruturas voltarem a deitar água. Mas tal não chegou a acontecer até hoje. O colectivo Infraestrutura Pública chegou a fazer, recentemente, uma inauguração a fingir do Chafariz do Intendente para chamar à atenção para esta problemática.
A modernização e expansão das redes de bebedouros, chafarizes e fontes públicas não só facilita o acesso a água potável, como também promove a inclusão, a sustentabilidade e a qualidade de vida dos residentes e visitantes. A preocupação com a acessibilidade para todos os utilizadores, incluindo pessoas com mobilidade reduzida e animais, reflete um compromisso com a construção de espaços públicos mais acolhedores e saudáveis. Estes pontos de acesso à água são especialmente cruciais em dias de calor intenso, ajudando a prevenir a desidratação e oferecendo uma forma prática e gratuita de refrescar a população, contribuindo assim para o bem-estar geral e a resiliência das cidades face às alterações climáticas. Mas há ainda um trabalho a fazer pelas diferentes câmaras, e talvez também a nível metropolitano, para os bebedouros estarem mais acessíveis e a funcionar.
Actualização às 10h40 de 29/08/2024: adicionada informação sobre o mapa da Câmara de Lisboa