O PCP voltou a colocar um grande cartaz político na rotunda de Entrecampos, depois de a Câmara de Lisboa ter retirado toda a propaganda de grandes dimensões do Eixo Central. Os comunistas nunca concordaram com essa decisão e criticam, ao mesmo tempo, o uso que Carlos Moedas tem feito dos mupis da cidade.

Depois de em Maio a Câmara de Lisboa ter removido os grandes outdoors políticos que durante anos marcaram a paisagem urbana no Eixo Central da cidade, o PCP desafiou a decisão do Executivo de Carlos Moedas e voltou a afixar um grande cartaz político na rotunda de Entrecampos. O mesmo antecipa as eleições autárquicas de Outubro, uma vez que nele aparece João Ferreira, o candidato da CDU, coligação que integra o PCP. Os comunistas não foram os únicos a voltar a colocar outdoors no Eixo Central da cidade. O PAN já tinha reposto o cartaz que a autarquia havia retirado no Campo Pequeno.
Desde 2022 que a autarquia liderada por Carlos Moedas (PSD) tem vindo a retirar a colocar alguma ordem no espaço público de Lisboa com a retirada dos grandes cartazes de propaganda política que durante décadas marcaram a capital em zonas nobres. Primeiro, interveio no Marquês de Pombal, uma rotunda que durante muitos anos ficou marcada pela poluição visual da propaganda política de largo formato. Depois, em Dezembro de 2024, na Alameda D. Afonso Henriques, também muito fustigada por estas estruturas de grande porte. A última intervenção foi feita em Maio deste ano, no Eixo Central, entre a rotunda de Entrecampos e a do Saldanha.
Em todos estes locais, a estratégia da Câmara de Lisboa foi a mesma: classificá-los como Conjuntos de Interesse Municipal, isto é, como sendo áreas onde, segundo uma alínea da Lei nº 97/88, que regula a propaganda política, esta não pode “prejudicar a beleza ou o enquadramento de monumentos nacionais, de edifícios de interesse público ou outros susceptíveis de ser classificados pelas entidades públicas”. Se para muitos a retirada dos grandes outdoors políticos de zonas emblemáticas é vista com bons olhos, dizendo até que deveria ser feito por toda a cidade, para outros é entendida como um ataque à liberdade de expressão. Certo é que em mais nenhuma capital europeia existe este género de propaganda política, sendo utilizados formatos de pequena-média dimensão, que não são intrusivos no espaço público da cidade.

Moedas: a propaganda política “em qualquer país da Europa não é feita desta maneira”
Na reunião pública de Câmara de 30 de Julho, uma das últimas do mandato, Carlos Moedas reiterou que a propaganda política “em qualquer país da Europa não é feita desta maneira”, explicando que, em frente às autarquias, há “um painel com páginas de um tamanho A4 com cada candidato”. “Isso não é poluição, é informação. Agora cartazes deste tamanho no centro da cidade não pode continuar. Vou continuar a trabalhar para que isso acabe de uma vez por todas”, assegurou o Presidente e recandidato à presidência da autarquia.
Moedas respondia a João Ferreira, vereador pelo PCP e recandidato à Câmara de Lisboa. O comunista tinha falado não da propaganda partidária, mas da propaganda institucional que diz estar a ser feita pelo Município em cima do período eleitoral, pelo que acusou o Presidente de fazer “um exercício pouco sério – uma habilidade, se quiser –, que visa responder com bugalhos aos alhos de que eu lhe falei”.
Segundo João Ferreira, que escudou na Lei nº 72-A/2015, que regula a propaganda eleitoral, “a cidade esta examinada de propaganda institucional da Câmara Municipal de Lisboa, em violação da lei”. Ferreira diz que Moedas conhece esta lei, “porque ja foi advertido pela Comissão Nacional de Eleições e recorreu para o Tribunal Constitucional, que não deu razão”.
O vereador comunista entende que se trata de “uma muita fraca demonstração de respeito pela lei, do que são os deveres institucionais de um Presidente de Câmara”, falando em “milhares de estruturas publicitárias”. Na sequência desta discussão, Carlos Moedas defendeu-se, referindo tratar-se de “informação, por exemplo, para uma pessoa que queira saber onde pode ir para ter o plano de saúde gratuito”, mas disse que ia “analisar com muita atenção” a situação e que a mesma “não invalida” o que tinha dito sobre os grandes outdoors.
“Todos temos de pensar muito bem à volta desta mesa que tipo de propaganda política hoje faz sentido numa cidade”, sublinhou, dizendo ainda que a maneira que temos hoje de respeitar a cidade “não pode admitir que essa cidade tenha cartazes com três metros com quatro metros; é um atentado às pessoas e nenhuma democracia desenvolvida o tem”.


Ainda sobre a propaganda institucional, Pedro Anastácio, vereador do PS, saiu em defesa de João Ferreira, dando “um exemplo de cartazes que são necessários ter”: “Sabe quando abre um concurso de renda acessível, pode por nos mupis a dizer que o concurso está aberto. Isso amplia as possibilidades de as pessoas se candidatarem”, explicou. “Sabe o que não amplia? Meter a propaganda com o numero de chaves que o Senhor Presidente entregou. Isso, sim, é uma utilização da propaganda com cariz elogioso da sua acção e sem interesse nenhum para a cidade de Lisboa”, disse, referindo-se a um dos cartazes que o departamento de comunicação da Câmara de Lisboa tem colocado nas ruas.
PCP move nova queixa
O PCP tem sido dos partidos mais críticos da actuação de Carlos Moedas em relação à propaganda na cidade. A 24 de Maio, depois de o Município lisboeta ter removido os outdoors políticos do Eixo Central, os comunistas anunciavam ter feito nova queixa à Comissão Nacional de Eleições (CNE).
Queixa que, quinze dias depois, teve resposta da parte da CNE com razão para o PCP. Num parecer partilhado com o PCP e citado pelo partido, a CNE afirma que “as entidades públicas apenas podem remover meios amovíveis de propaganda que conflituem com o disposto no nº 1 do Artigo 4º da Lei nº 97/88, de 17 de Agosto, quando tal for determinado por tribunal competente, sem prejuízo de poder ser acordado com o promotor outra solução. Anota-se que a presente situação já teve lugar no passado e mereceu deliberação por parte da Comissão Nacional de Eleições que oportunamente foi notificada à Câmara Municipal de Lisboa”.
O PCP conclui, a partir desta posição da CNE, que “a remoção de propaganda por parte da Câmara Municipal de Lisboa não encontra cobertura nas disposições legais aplicáveis”, reiterando que “a propaganda, nas situações descritas, é legítima à luz da lei vigente, cuja alteração é da competência exclusiva da Assembleia da República”. “Fica mais uma vez à vista uma conduta por parte de Carlos Moedas, revelando um profundo desprezo pela legalidade democrática, de reiterado desrespeito pela lei e pela liberdade de expressão, de propaganda e de ação política nela consagrada. Sublinhe-se que no mesmo eixo existem vários cartazes de publicidade comercial e de propaganda institucional da CML (Câmara Municipal de Lisboa)”, conclui.
Certo é que a legislação em vigor em relação à propaganda política tem omissões e contradições que basicamente dão “via verde” aos partidos políticos para afixarem grandes cartazes de propaganda no meio da cidade. Na verdade, a Lei nº 97/88 também indica que a afixação de propaganda política deve ser feita “nos espaços e lugares públicos necessariamente disponibilizados para o efeito pelas câmaras municipais” e sem “provocar obstrução de perspectivas panorâmicas ou afectar a estética ou o ambiente dos lugares ou da paisagem”. Ao mesmo tempo há questões relacionadas com a liberdade de expressão, e as autarquias não querem chocar com os partidos neste território.

Na verdade, a “afixação de mensagens de propaganda em lugares ou espaços públicos, seja qual for o meio utilizado, é livre no sentido de não depender de obtenção de licença camarária”, entende a Comissão Nacional de Eleições (CNE) num parecer mais antigo, que se encontra publicado no respectivo site. No documento, a mesma entidade refere ainda que a propaganda “não tem que confinar-se aos espaços e lugares públicos” facultados pela autarquia “desde que em observância dos critérios estabelecidos” na referida Lei nº 97/88.
No início de Agosto, o PCP, que se apresenta a eleições novamente coligado ao PEV como CDU, voltou a colocar uma estrutura de propaganda de grandes dimensões no Eixo Central da cidade. A mesma, apresenta em cada face uma mensagem distinta relacionada com a campanha autárquica em curso. Num dos pilares da estrutura, está afixado um papel A4 no qual se pode ler que se trata de uma “estrutura outdoor” para a “campanha eleitoral autárquica da CDU”.
Em Junho, o PAN já tinha reposto um dos cartazes que Moedas tinha removido junto ao Campo Pequeno. “Touradas só na cama”, pode ler-se na mensagem que voltou a estar afixada numa grande estrutura perto da antiga praça de touros da capital, agora transformada em sala de espectáculos mas onde ainda se fazem, algumas vezes, touradas. O cartaz voltou a ser afixado no mesmo local e não foi removido, desde então, pela Câmara de Lisboa. PAN e PCP abrem um precedente para o regresso de estruturas partidárias ao Eixo Central de Lisboa. Em pleno período eleitoral, fica a dúvida se a zona entre Entrecampos e o Saldanha vai ou não voltar a ter campanha política de grandes dimensões.