A recente associação da GIRA ao evento Comic Con Portugal, com promoção do mesmo nas bicicletas e estações, levantou questões sobre se trataria da primeira venda de espaço publicitário no sistema público de bicicletas de Lisboa. EMEL diz que não, e refere que “esta é uma questão que não está a ser equacionada neste momento”. Mas…

Não é a primeira vez que a GIRA se associa a eventos, mas é a primeira vez que se veste a rigor para um. Várias bicicletas da rede pública de Lisboa, assim como algumas das estações mais utilizadas, foram decoradas com as cores da Comic Con Portugal, o maior evento de cultura pop do país que se realiza de 8 a 11 de Dezembro no Parque das Nações.
É esta a primeira venda de espaço publicitário na infraestrutura da GIRA? A EMEL diz que não, e refere que não está “de momento” a equacionar este modelo. No entanto, o futuro da GIRA em termos de sustentabilidade económica pode passar por “um patrocínio de montante relevante”.
EMEL não equaciona venda de espaço publicitário
Como a própria EMEL reconhece, em resposta a questões colocadas pelo Lisboa Para Pessoas, “em vários sistemas de grandes cidades, a venda de espaço publicitário disponível nos equipamentos, como estações e bicicletas, gera receitas consideráveis que ajudam a equilibrar a conta de exploração”. “Mas esta é uma questão que não está a ser equacionada neste momento”, acrescenta a empresa detida pela Câmara de Lisboa. “Desde o lançamento da GIRA, a EMEL nunca vendeu publicidade nas bicicletas ou estações.”
Note-se que a venda de espaço publicitário é um modelo seguido por outros operadores de transporte público, como a Carris e o Metro de Lisboa; no caso deste, a empresa pública consegue angariar cerca de 1,4 milhões de euros por ano com anúncios nas estações e carruagens. No entanto, importa ressalvar que não só a GIRA chega a menos pessoas que o Metro ou mesmo a Carris, como também está numa fase de maturidade diferente.
Em 2022, a GIRA começou a associar-se de modo mais saliente a alguns eventos da cidade. No final de Agosto, foi o “transporte oficial” da última edição da Feira do Livro de Lisboa, o que significou apenas a promoção do serviço de mobilidade partilhada no evento. Já em Setembro, a GIRA a marca associou-se à Semana Europeia da Mobilidade com a decoração de algumas bicicletas, que receberam autocolantes amarelos junto à roda traseira e frases como “Eu escolho chegar primeiro” ou “Eu escolho menos trânsito”. Ao mesmo tempo, a GIRA tem vindo a apoiar ao longo dos últimos anos outros eventos, seja com a oferta de passes aos participantes, seja com a disponibilização de bicicletas.

A Comic Con Portugal é o primeiro evento ao qual a GIRA se junta e que é comunicado, de forma bem visível, nas bicicletas e estações. No entanto, a EMEL garante que se trata de uma “campanha de sensibilização alusiva às boas praticas ambientais e de promoção da mobilidade suave”, e que está enquadrada no facto de ser parceira da edição deste ano daquela grande feira de cultura pop. “A GIRA é o Transporte Oficial Sustentável do evento, pelo que faz todo o sentido incentivar os visitantes a utilizarem a GIRA para se deslocarem à Comic Con”, explica fonte da empresa ao Lisboa Para Pessoas. “A filosofia na base desta parceria é promover o uso da bicicleta como meio de mobilidade na cidade. Aliás, a campanha é bastante semelhante à lançada na Semana Europeia da Mobilidade.”
Além da decoração de algumas estações com cores e informações do evento, várias bicicletas passaram a ter uma mensagem criada a partir da assinatura desta edição da Comic Con Portugal – “We can be heroes” (“Nós podemos ser heróis”, na tradução para português). Em algumas bicicletas, foi adicionada a mensagem “Os heróis protegem o ambiente” e noutras a frase “Os heróis escolhem a bicicleta”.
GIRA aberta a “um patrocínio de montante relevante”
Mesmo não sendo fruto de uma relação publicitária, a campanha entre a GIRA e a Comic Con não deixa de dar visibilidade ao evento nas ruas, principalmente junto de uma faixa etária que estará mais interessada no mesmo (de acordo com dados revelados recentemente numa conferência, a maioria dos utilizadores da GIRA tem entre 16 e 34 anos). Esta parceria pode ser uma pista sobre o futuro da GIRA – não sobre a venda de espaço publicitário, mas sobre o estabelecimento de uma parceria de patrocínio que ajude no equilíbrio económico do sistema de bicicletas partilhadas. Ao Lisboa Para Pessoas, a empresa “admite encontrar um parceiro que se reveja na ambição do projecto e o avalie de acordo com a cada vez mais valorizada dimensão de sustentabilidade que o sistema materializa”.

Esta intenção está também traduzida no Plano de Actividades e Orçamento da EMEL para 2022, que deverá ser aprovado nesta quarta-feira e ao qual o Lisboa Para Pessoas teve acesso. Com a expansão prevista da rede para 300 estações e 3000 bicicletas até 2026 – um investimento que, “considerando apenas equipamentos, ultrapassa os 9,5 milhões de euros“ –, a EMEL diz que, dada a dimensão desse montante (que será acompanhado “de outros de dimensão semelhante em despesas operacionais”), é preciso encontrar “fontes de financiamento alternativas”, até porque “o tarifário definido visa maximizar a adesão e utilização do sistema, afastando-se de qualquer perspectiva de equilíbrio económico”.
No entanto, “para que seja possível atrair interessados para um patrocínio de montante relevante, a confiança no sistema e na sua disponibilidade precisa de ser consolidada”, escreve a EMEL. A empresa municipal reconhece “sobressaltos nesta matéria” e aponta contrariedades na gestão de stocks (“fortemente impactada pelas dificuldades que se estão a manifestar nas cadeias de abastecimento”) e na grelha salarial nas oficinas (que levar “a uma rotação elevada no seio da equipa que assegura as operações de suporte ao sistema”). Em suma, “a EMEL terá de encontrar forma de garantir, ao nível das operações de manutenção e balanceamento, a eficácia que já atingiu na implementação de estações, viabilizando o máximo de frota em disponibilidade para uso”.
Em Setembro, recorde-se que, numa entrevista ao DN, o Presidente da EMEL, Carlos Silva, já tinha referido ser preciso repensar o modelo financeiro da GIRA. Noutras cidades, existem exemplos de patrocínios aos sistemas de bicicletas partilhados. É o caso de Londres, onde o banco Santander empresta o nome à rede pública de bicicletas da capital britânica – são as Santander Cycles, geridas, no entanto, pela Transport for London. Lá por fora, também é possível encontrar o modelo de venda de espaço publicitário em estações e bicicletas – o modelo que a EMEL diz não estar a considerar “de momento”.