Ao contrário de todas as hortas comunitárias da cidade, onde cada talhão pertence a uma pessoa, nesta horta que vai nascer no Alto da Eira, na freguesia da Penha de França, tudo o que será plantado vai ser decidido por todos e as colheitas também serão partilhadas. E à volta da horta, promete-se muito convívio…
Estimular comunidades de vizinhos na cidade é um dos objectivos da associação Regador, que tem vindo a fazê-lo com as mãos na terra, convidando ao cultivo de pequenos jardins ou pomares dos quais todas as pessoas possam usufruir. Uma horta comunitária é o maior projecto desta associação e está a nascer no Alto da Eira, na Penha de França.
A apresentação do projecto decorreu este sábado, 11 de Dezembro, e contou com a presença de vários moradores da zona, bem como de amigos e amigas do Regador e da Junta de Freguesia da Penha de França. “O palco é vosso, é dos moradores e da comunidade”, disse a Presidente, Sofia Oliveira Dias, deixando claro o apoio da Junta ao projecto, não querendo tomar propriedade do mesmo. A Associação de Moradores das Torres do Alto da Eira também esteve na apresentação, prometendo continuar a divulgar a iniciativa junto da vizinhança.
“Queremos muito agradecer aos moradores por nos receberem tão bem”, disse Maria Freitas, do Regador. O bom acolhimento da associação por parte da comunidade local é fundamental para o sucesso do projecto que para aquele sítio está a ser proposto. É preciso evitar conflitos e, por isso, o diálogo inicial, o conhecer as pessoas, torna-se essencial antes de começar a mexer na terra. Maria não é do Alto da Eira, mas diz-se vizinha de todas as pessoas do bairro que se juntaram para ouvir sobre a futura horta comunitária.“É deixar passar o Natal e a passagem de ano, e depois toca a pegar nas enxadas”, disse o senhor João, um dos moradores, já conhecido de toda a gente. A horta do Alto da Eira é uma iniciativa financiada com mais de 47 mil euros pela edição 2021 do programa BIP/ZIP da Câmara de Lisboa, que procura activar os bairros mais esquecidos da cidade e que, nesta candidatura, conta com a associação Renovar A Mouraria e com a Junta da Penha de França, além do Regador.
A horta que hoje começou formalmente a nascer no Alto da Eira vai desenvolve-se ao longo de um pequeno talude ao lado das duas torres amarelas que marcam o bairro. Serão criados sete talhões de cultivo em socalcos para vencer o desnível do terreno, onde se pretende plantar produtos hortícolas e arbustos de frutos silvestres. Os talhões serão rodeados por um passadiço que fará ligação ao terreno debaixo, este plano e onde será instalada uma canalização para haver água para a rega, uma casinha com ferramentas, um compostor, uma cozinha para crianças e um espaço aberto para acolher eventos da mais variada espécie. Haverá também plantação de ervas aromáticas e de árvores de fruto de pequeno porte. “A ideia é dar utilidade a todo o espaço”, comentou Paulo Torres, do Regador. A primeira grande tarefa vai ser nivelar o terreno o mais possível: “Será necessária muita ajuda aqui.”
Para dar sombra no Verão e sol no Inverno, o espaço vai ser rodeado com uma vinha – durante o tempo quente, esta terá folhas e assim protegerá as pessoas das temperaturas mais alturas, e na época fria a queda da folhagem irá deixar passar o sol tão precisoso. “E podemos fazer o nosso vinho, quem sabe”, atirou Maria. Na parte alta, será criada uma porta para facilitar o acesso, mas a entrada principal será na parte debaixo, junto a um pequeno largo ali existente. Será nessa zona também que vai ser instalado um placard para que a população, a par dos meios online, possa acompanhar o desenvolvimento do projecto, sabendo quando são as colheitas, que workshops vão haver e os convívios nos quais podem participar.
A horta será verdadeiramente comunitária, ou seja, tudo será de todos. “O maior desafio vai ser trabalharmos em sintonia. As pessoas estão habituadas a talhões individuais em hortas comunitárias, mas aqui não vão ser individuais. Vão ser colectivos”, referiu Paulo. É isso mesmo: todas as pessoas que se juntarem ao projecto vão poder plantar nos diferentes talhões e dividir entre si colheitas. O mesmo se aplica às árvores de fruto, às videiras e aos arbustos. Em conjunto também vão decidir o que plantar em cada talhão, por exemplo, tomates ou cebolas. Haverá convívios para fortalecer os laços comunitários, cozinhar e provar o que cresceu na horta, ver filmes e conversar sobre eles, jogar jogos tradicionais, etc.
Vão também ser promovidas formações em agricultura biológica, compostagem ou como cozinhar sem desperdiçar comida, que serão gratuitas porque “felizmente, o programa é financiado”. O Regador quer também envolver a comunidade escolar no projecto para trazer as crianças para a horta. Todo o projecto – que dá pelo nome de Regar o Alto da Eira – terá uma equipa de gestão própria, constituída por elementos do Regador e da comunidade, e está a ser documentado num filme por “duas irmãs muito simpáticas” e que “pretenderá registar os desafios e as vitórias, retratar a comunidade que nela vai trabalhar, e a construção de um bonito projecto colectivo feito de raiz, por todos e para todos”.
Com o projecto e o filme, Maria espera poder “contagiar depois outros locais” a também aproveitarem espaços mortos da cidade, transformando-os sem zonas de comunidade que façam desacelerar o ritmo de vida urbano e aproximar as pessoas. “Vamos fazê-lo juntos. Vamos fazê-lo num território que já tinha hortas antes.” A iniciativa Regar o Alto da Eira está aberta a todas as pessoas que nela queiram participar, sejam elas do bairro, da freguesia ou de outra parte de Lisboa. Para tal, é enviar um e-mail para [email protected].