Junta de Arroios recua e esplanadas podem ficar até final do ano. Câmara analisa continuidade

Depois de querer apressar a retirada das esplanadas para devolver o espaço aos carros, a Junta de Freguesia de Arroios deu um passo atrás: os comerciantes podem respirar até ao final do ano. Até lá, vai ser feita uma avaliação “caso a caso” em “estreita colaboração” com a Câmara de Lisboa.

Fotografia de Lisboa Para Pessoas

Afinal, as esplanadas que foram autorizadas em lugares de estacionamento durante a pandemia podem ficar até ao final do ano. A Junta de Freguesia de Arroios recuou na decisão de devolver o espaço aos carros perante a pressão dos comerciantes, que tinham lançado uma petição e que participaram em peso na mais recente sessão da Assembleia de Freguesia, que decorreu nesta segunda-feira, 27 de Junho. “Esta freguesia não é contra as esplanadas”, garantiu Madalena Natividade.

A Presidente da Junta de Freguesia de Arroios acrescentou que é preciso “encontrar um equilíbrio” e “estudar caso a caso”, “em estreita colaboração com a Câmara de Lisboa”. Segundo Madalena Natividade, “todos nós sabemos que as esplanadas em locais de estacionamento é uma questão complexa. Por um lado, temos os moradores com direito ao seu descanso. Por outro, temos os comerciantes que têm necessidade de rentabilidade e até de sobrevivência do seu negócio”.

Na sua intervenção na Assembleia, Madalena Natividade (Independente/Novos Tempos) nunca referiu a preocupação com o estacionamento automóvel, apesar de este ter sido o argumento anteriormente apresentado para apressar a retirada das esplanadas temporárias. A Junta de Arroios dizia há um mês, ao jornal Público, que a freguesia “se situa numa zona de alta densidade populacional da cidade de Lisboa, que contém inúmeras ruas e arruamentos estreitos e onde a dificuldade de estacionar, de moradores e trabalhadores, é uma realidade diária”.

No final de Maio, vários comerciantes começaram uma petição contra o fim das esplanadas que, no contexto de pandemia de Covid-19, tinham sido autorizadas em lugares de estacionamento na freguesia de Arroios e por toda a cidade de Lisboa. Em Março de 2022, existiam pelo menos 365 esplanadas autorizadas em lugares de estacionamento por toda a cidade; só na freguesia de Arroios, registavam-se 68. Este número já terá sido mais alto, pois houve estabelecimentos que entretanto desactivaram as suas esplanadas.

Os comerciantes sempre souberam que a autorização tinha um carácter temporário, mas tinham a expectativa que, pelo menos, viesse a tornar-se definitiva com uma avaliação caso a caso, de cada situação, de cada esplanada. A Câmara de Lisboa tinha empurrado uma decisão em torno das esplanadas para o final do ano, permitindo até aí a permanência das autorizações temporárias, desde que as respectivas Juntas de Freguesia concordassem. Ora, o Lisboa Para Pessoas contou a história da “Praça Sem Nome”, um pequeno largo dividido entre duas freguesias: de um lado, é freguesia de Penha de França; do outro, é Arroios. De um lado, as esplanadas podiam ficar até Dezembro. Do outro, a Junta queria tirá-las até ao final de Setembro para aumentar a oferta de estacionamento.

Os testemunhos dos comerciantes

Ricardo Maneira, dono do bar A Viagem das Horas, foi uma das pessoas que interveio na Assembleia de Freguesia (captura de ecrã por Lisboa Para Pessoas)

O artigo do Lisboa Para Pessoas, juntamente com a reportagem do Público que tinha saído antes e a da Mensagem que saiu pouco depois, terão contribuído para dar voz ao protesto dos comerciantes e colocar pressão na Junta de Freguesia de Arroios, levando ao recuo agora anunciado.

Ricardo Maneira, dono do bar A Viagem das Horas e uma das pessoas com conversámos em Maio, apresentou na Assembleia de Freguesia os mesmos argumentos que nos tinha dado: que as esplanadas foram incentivadas pela Câmara de Lisboa com apoios públicos, que geraram novos empregos, que dão vida aos bairros e à cidade em geral, e que é possível encontrar soluções para aumentar a oferta de estacionamento que não custem a retirada das esplanadas.

Já Miguel, dono do Maria Food Hub, disse que as esplanadas são “uma maneira de encontro, de as pessoas poderem sair de casa” e referiu que “desde Março que tentamos falar com alguém do executivo, para expor o problema”. Já a proprietária de um bar de vinhos disse que, enquanto tal, conseguiu “tirar um dístico [de estacionamento] para um carro que não vai utilizar”. Eu prefiro, como muita gente também, ter uma esplanada em vez de um carro”, acrescentando que muitos dos clientes que recebe “são pessoas do bairro que preferem ocupar o espaço público com uma esplanada do que um carro”. Guilherme Pereira, por sua vez, referiu que “o Covid não acabou. A percepção das pessoas não acabou, que continuam a procurar sítios confortáveis onde conseguem socializar, sem estar preocupadas com a pessoa que espirrou ao lado e com outras circunstâncias que estão ainda atrás da nossa cabeça”.

Fotografia de Lisboa Para Pessoas

De uma forma geral, os comerciantes presentes reiteraram que as esplanadas permitiram contratar mais pessoas e expandir e sustentar os seus negócios, referindo terem espaços interiores pequenos, onde conseguem sentar poucas pessoas. Argumentaram também que os seus clientes são maioritariamente locais e que não está em causa o não pagamento das taxas de ocupação de espaço público das quais estão ainda isentos (cidades como o Porto já começaram a cobrá-las). “Nós queremos poder pagar a esplanada, a questão não é essa”, garantiu Francisco Nuno Bernardo, proprietário d’O Primo do Queijo. “Queremos perceber o que vos levou a querer terminar no dia 30 de Setembro e poder contra-argumentar. Em toda a nossa rua não temos uma pessoa que nos diga que seja a favor do fim da esplanada.”

Já Mariana Góis, “co-proprietária de um pequeno café de bairro situada na Praça das Novas Nações”, garantiu que vive na freguesia desde 2004 e que “já nessa altura o estacionamento era um problema, e continua a ser”. Mas “os lugares que este executivo quer retirar aos pequenos comerciantes representam menos de 0,5% da totalidade dos lugares de estacionamento desta freguesia”, que diz serem cerca de 5 mil.

Luís Castro, da associação Vizinhos de Arroios, fez questão de “mostrar outra perspectiva” das esplanadas na freguesia, apresentando uma preocupação com o ruído nocturno. “O direito ao descanso é fundamental” e tem “prevalência sob o direito ao exercício de actividade económica”, argumentou, acrescentando que “não queremos substituir esplanadas por lugares de estacionamento, queremos é que estes estabelecimentos que são geradores de ruído para além das 21 horas não o possam fazer”. Referiu também que as esplanadas “são um cancro para a freguesia, especialmente quando são extensões de estabelecimentos que não têm a capacidade para, dentro do seu espaço, exercerem a sua actividade”, pois “têm espaços muito pequenos, onde não conseguem exercer a actividade de forma lucrativa”.

A Junta de Freguesia de Arroios garantiu que as esplanadas podem ficar até pelo menos 31 de Dezembro como está a acontecer nas restantes freguesias da cidade (Arroios foi a única a querer terminar as licenças mais cedo). A Junta presidida por Madalena Natividade quer estudar as esplanadas uma a uma para decidir a continuação ou não do seu licenciamento, em articulação com a Câmara de Lisboa. A autarquia disse ao Público recentemente estar a analisar o tema das esplanadas para decidir o que fazer depois de o regime excepcional terminar no final do ano.

Árvores na envolvente do Mercado de Arroios

Fotografia de Lisboa Para Pessoas

Na mesma Assembleia de Freguesia falou-se da envolvente do Mercado de Arroios. Agora com o projecto para uma nova ciclovia na Almirante Reis cancelado, que implicaria mexidas na circulação e estacionamento nessa zona comercial, a Junta de Freguesia fala na transformação do eixo entre a Rua Carlos Mardel, o Mercado de Arroios e a Alameda com a “plantação de árvores”, a “criação de espaços verdes” e o “embelezamento de ruas e fachadas de prédios”, conforme explicou o tesoureiro da Junta, Rui Vilela Dionísio. A intervenção será feita em articulação com a Câmara de Lisboa no âmbito do projecto europeu Conexus. A ideia é dar àquele eixo uma nova importância e centralidade que venha a reforçar a atractividade do Mercado de Arroios, que reconheceu ter “muitas bancas vazias”.

A proposta de drive-in no Mercado de Arroios de Luís Castela (captura de ecrã por Lisboa Para Pessoas)

O tesoureiro da Junta de Freguesia de Arroios, com a pasta do comércio e do espaço público, entre outras, respondia a um freguês preocupado com o “grande problema de estacionamento” no Mercado de Arroios, que diz desmotivar os comerciantes daquele espaço. Luís Castela apontou a existência de muitas bancas vazias no Mercado e apresentou “uma ideia a longo prazo”: a criação de um corredor de circulação automóvel – “carros eléctricos”, disse – que permitisse aos comerciantes descarregarem “para o elevador de acesso à cave” e aos clientes “carregarem as suas compras”, ao estilo drive-in. Na perspectiva daquele freguês, poderia até existir bancas de exposição junto à zona de circulação dos veículos.

Rui Vilela referiu que vai ser aberto em breve um “concurso para bancas e lojas que estão disponíveis nos três mercados da freguesia” – o de Arroios, o do Forno de Tijolo e o de 31 de Janeiro. Por outro lado, o projecto de embelezamento e de criação de espaços verdes na envolvente do Mercado de Arroios poderá trazer a sombra muito necessária àquela zona e torná-la mais atractiva para a estadia por parte de moradores e visitantes, o que poderá levar ao aumento da frequência do comércio local. Será feita também uma “revisão de lugares de estacionamento”; e, na praça do Mercado em particular, pretende-se “revigorar as cunhas” que no ano passado foram intervencionadas com arte urbana com “espaços verdes e de lazer para os fregueses”.

Gostaste deste artigo? Foi-te útil de alguma forma?

Considera fazer-nos um donativo pontual.

IBAN: PT50 0010 0000 5341 9550 0011 3

MB Way: 933 140 217 (indicar “LPP”)

Ou clica aqui.

Podes escrever-nos para mail@lisboaparapessoas.pt.

PUB

Junta-te à Comunidade LPP

A newsletter é o ponto de encontro de quase 3 mil pessoas.