Árvores trocadas por estacionamento em requalificação de rua em Massamá

A Rua Coronel Melo Antunes, em Massamá, está a ser requalificada para melhorar a acessibilidade pedonal e a segurança rodoviária, mas a obra reduzirá o número de árvores em 30%. Abates são justificados com as “necessidades do projecto” e a criação de mais estacionamento, mas também com uma avaliação fitossanitária.

Uma das árvores abatidas (fotografia LPP)

A Rua Coronel Melo Antunes, em Massamá, está a ser requalificada. A obra promete diversas melhorias na acessibilidade e segurança pedonal, mas também vai aumentar a oferta de estacionamento e, com isso, diminuir a arborização. Após a requalificação, em vez de 47 caldeiras para árvores, a rua passará a ter apenas 32 – uma parte destas caldeiras serão alteradas a favor de novos lugares para carros. Serão 30% menos árvores na rua e, a alteração nas caldeiras, implicará também a replantação de vários exemplares – mais de metade das árvores depois da obra serão novas.

O abate das árvores despertou a atenção de Ricardo, 33 anos. Residente na rua há dois anos, começou a ver da janela o trabalho das serras para deitar abaixo de duas centenas de árvores que costumavam oferecer sombra e frescura à sua rua. Foi ao site da Câmara de Sintra, onde encontrou informação sobre a obra de requalificação e uma suposta “substituição de espécies arbóreas em mau estado fitossanitário”, ou seja, das árvores doentes. Mas desconfiou: “A saúde das árvores não está a ser avaliada, porque estão a remover todas, mesmo as que ainda resistem, nas áreas onde os trabalhos não começaram”, relatou ao LPP, por e-mail. No site da autarquia não foi publicado o projecto de requalificação, estando o mesmo disponível no portal Base, uma plataforma não tão acessível.

Árvores resistentes na Rua Coronel Melo Antunes (fotografia LPP)

O site da autarquia diz apenas que a obra de requalificação visa “assegurar o incremento da mobilidade pedonal e da segurança rodoviária”, fala na introdução de uma ilha de ecopontos subterrados e também no “aumento da oferta de lugares de estacionamento”, além da já referida substituição das árvores “em mau estado fitossanitário”. A memória descritiva da empreitada, disponível no Base, é mais detalhada. Diz que a reformulação da Rua Coronel Melo Antunes é motivada por vários problemas, como a inadequação dos espaços de estacionamento e a degradação dos passeios. A rua apresentava “múltiplos desníveis nos percursos pedonais, em degrau ou com inclinação acentuada, em zonas de acesso às garagens dos edifícios, que anulam a continuidade dos passeios e a sua utilização pelas pessoas em geral e, particularmente, as com mobilidade condicionada”, lê-se.

Com a requalificação, que custará cerca de 333 mil euros e tem uma duração prevista de sete meses, os passeios vão ganhar um pavimento confortável e contínuo de 1,5 metros de largura, além da tradicional calçada; as passadeiras passarão a ser acessíveis com guias tácteis e ressalto zero, sendo que serão mantidos os três atravessamentos que existem hoje; e todo o arruamento ficará com velocidade limitada a 30 km/h, com a colocação de sinalização vertical.

A mudança de estacionamento longitudinal para perpendicular resultará no aumento de 97 para 105 lugares, mas vai impactar a largura dos passeios e 12 caldeiras de árvores. Esta abate é justificado tanto pelas “necessidades do projecto” como por uma avaliação fitossanitária realizada em de 2022 e que detectou alguns exemplares doentes ou secos. Ao longo de toda a rua, estão a ser abatidas 25 árvores e outras 14 serão mantidas. A obra envolverá a plantação de 18 novas árvores e, no troço onde o estacionamento será alterado, a recuperação de sete das 12 caldeiras retiradas. No total da rua, as caldeiras existirão mais 10 caldeiras removidas, no total de 15. “Há espaços onde antes havia árvores e agora há apenas calçada”, observa já Ricardo, lamentando que “serão precisos anos para que as novas árvores cresçam como as que foram abatidas”.

A arborização da Rua Coronel Melo Antunes, antes da intervenção, em 2023 (via Google Street View)

Ou seja, se inicialmente existiam 47 locais destinados a árvores na Rua Coronel Melo Antunes, após a requalificação passarão a ser apenas 32. O número de árvores, que antes era de 39, será reduzido para 32, das quais 18 serão novas plantações. Morador da rua há pouco mais de dois anos, Ricardo, engenheiro informático a trabalhar remotamente a partir de casa, viu as árvores desaparecerem sem entender bem o motivo. “Massamá, infelizmente, oferece pouco aos moradores além das suas habitações”, afirma, criticando a prioridade dada ao estacionamento. “Quem mora aqui acaba por viver de carro, e isso deve-se ao desenho urbano que é oferecido às pessoas”, aponta. “Privilegia-se muito o estacionamento, o que pode ser visto em qualquer rua de Massamá, e esquece-se de se fazer passeios que realmente apeteçam ser usados por pessoas.”

Ricardo sente-se um “morador desapontado” e impotente, e enviar um e-mail a denunciar a situação à comunicação social e publicar a mesma história no Reddit foram as poucas acções que tomou. “Sinto que culturalmente existe um grande sentimento de incapacidade por parte dos moradores porque sentem sempre que não vale a pena reclamar, que nada acontece”, aponta. “Agora é tarde, pelo menos para estas árvores.” Enquanto a obra avança, Ricardo espera que a requalificação traga algumas melhorias, mas não esquece a importância das árvores. “São essenciais na captura de carbono, filtragem do ar e diminuição do ruído, principalmente em ruas movimentadas. Criam sombras no verão, reduzem a temperatura e protegem os prédios do vento no inverno, além de oferecerem privacidade e tornarem as ruas visualmente mais agradáveis”, exemplifica o jovem de 33 anos.

Este caso em Massamá não é único; o abate de árvores em requalificações urbanas é comum, justificado pela adaptação a novos desenhos urbanos. Muitas vezes, as árvores são sacrificadas para dar lugar a a alargamento de passeios ou, como aconteceu neste caso, a criação de mais estacionamentos, mas continuam a ser essenciais para o conforto e a qualidade de vida urbana, pelo que importa também conciliar a sua preservação com novas necessidades. O LPP contactou a Câmara de Sintra e actualizará este artigo se e quando receber uma resposta.

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