A ciclovia da Alameda das Linhas de Torres faz parte de um dos eixos estruturantes da rede ciclável da cidade. Menos de um ano depois de ter sido concluída, foi cortada e assim vai ficar durante tempo indeterminado.

Numa terça de manhã, é difícil contar os ciclistas que utilizam o troço final da ciclovia da Alameda das Linhas de Torres já na zona do Campo Grande. Com mais de 41 mil habitantes, a freguesia do Lumiar é das mais populosas da cidade e aquele eixo ciclável, segregado, deu a muitos uma oportunidade de passar a usar a bicicleta como meio de transporte utilitário. O prolongamento do eixo ciclável pelas Linhas de Torres terá mesmo contribuído para um maior volume de ciclistas a atravessar o Campo Grande nas horas de ponta de manhã e de tarde.
Menos de um ano depois de ter sido terminada, a ciclovia da Alameda das Linhas de Torres na zona do Campo Grande (Rua Cipriano Dourado) foi cortada. Em causa, estão as obras de construção da Linha Circular do Metro, mais concretamente o prolongamento da estação do Campo Grande. Na zona ocupada pela ciclovia e pelo passeio, vão ser colocados novos pilares para sustentar a expansão da infraestrutura, como contámos aqui. Seria difícil manter a ciclovia e realizar a obra ao mesmo tempo, mas a solução poderia ser outra.

As mesmas obras do Metro na zona do Campo Grande já tinham levado a constrangimentos na mobilidade pedonal e ciclável, em concreto na ciclovia que faz a conexão a Telheiras. Nesse caso, no entanto, foi criada uma alternativa – uma ciclovia pop-up ao lado para garantir o trânsito de ciclistas e mesmo os peões continuaram a ter um trajecto directo. Mas, nesta situação, a mobilidade suave não foi tida em conta, com o Metro de Lisboa a cortar um troço substancial desta ciclovia – que representa um dos eixos cicláveis estruturantes da cidade – e a sugerir aos ciclistas que levem a bicicleta pela mão pelo passeio do outro lado.
Vários blocos de plástico impedem a utilização da ciclovia mesmo fora da zona onde a obra será realizada. Os semáforos no cruzamento em frente à NOS foram desligados, forçando os utilizadores da bicicleta a guiarem-se pela semaforização dos peões, e foi colocada sinalética a indicar o fim da ciclovia, sem qualquer indicação, no local, de um desvio – de um trajecto que os ciclistas possam tomar. Também não existe qualquer informação sobre o corte. Para os peões, a sinalização também é escassa e vemos várias pessoas a preferirem seguir em frente, encostadas à berma, do que a passar a rua duas vezes para circularem no passeio do lado de lá, como é recomendado pelo Metro de Lisboa no seu site.

Rúben, estudante universitário, é “utilizador diário daquele percurso” como ciclista, mas é a situação pedonal que mais o preocupa. “Acho que as bicicletas foram as menos afectadas, vejo os ciclistas a ir pela estrada. Apesar de não ser o ideal, ainda conseguem fazer o percurso sem grande interferência”, conta. “Os peões é que foram tratados como inexistentes sem mais nem menos. Vi idosos a ir pela estrada enquanto autocarros tentavam passar e vi uma senhora com um carrinho de bebé aflita a ver como iria atravessar aquela parte pela estrada.” E remata:“Acho vergonhoso pois esta obra vai demorar meses ou mesmo anos.”

Construída no Verão do ano passado, a ciclovia da Alameda das Linhas de Torres tem nesta zona do Campo Grande – Rua Cipriano Dourado – um dos seus piores troços; um desenho que propicia inúmeros conflitos com peões, principalmente às horas de ponta em que há um enorme fluxo de passageiros das carreiras suburbanas – afinal, estamos a falar de uma das principais e maiores interfaces rodoviárias da cidade. Em contexto de obras, os conflitos podem ser ainda mais recorrentes, com peões e ciclistas a partilharem os mesmos espaços e na mesma azáfama de chegar ao seu destino laboral enquanto se desviam das obras.

“Isto em hora de ponta só cria mais tensão entre utilizadores de bicicleta e peões, desnecessariamente.” A ciclovia da Alameda das Linhas de Torres faz parte do commute diário de Luís, que agora tem se fazer mais manobras e ir com atenção redobrada para não chocar com os peões que estão também no seu commute e obrigados a desvios. “Tenho de ir com a bicicleta pela mão para depois conseguir entrar na estrada e fazer o troço fechado até encontrar de novo a ciclovia.” Luís não tem dúvidas: não se pensou nos modos suaves. “Teria sido muito mais justo um reajustamento das vias” para evitar conflitos. “Com o regresso aos escritórios mais de forma mais regular”, teme que essas situações de disputa entre peões e ciclistas se agravem. “Pelo menos no sentido Campo Grande-Alameda, poderia ser encontrada uma solução para a bicicleta não estar em contra-mão.”
Miguel, 38 anos, também passa naquela zona a pedalar, mas especialmente “por lazer”. “Fico essencialmente barrado de ir para o Lumiar de bicicleta a partir do Campo Grande”, conta. “A alternativa mais viável seria ir pela Avenida do Brasil, Rua das Murtas, Alta de Lisboa e depois atravessar a Quinta das Conchas. É um desvio de vários quilómetros, com bastante mais subidas e descidas, e a Quintas das Conchas não é bom para bicicletas de cidade.”
O Metro de Lisboa sugere que peões e ciclistas utilizem o passeio do lado oposto da obra para as suas deslocações, e pede que a bicicleta seja levada pela mão. Na manhã desta terça-feira, vimos algumas pessoas a seguirem o trajecto sinalizado, apesar da parca sinalização. A maioria dos ciclistas em direcção ao Campo Grande seguiu pela estrada, os que vinham no sentido oposto, em direcção ao Lumiar, optavam por fazer o trajecto pela estrada até encontrarem a primeira passadeira, apanhando aí a ciclovia numa zona onde esta já está desimpedida. A interrupção da ciclovia e do passeio deverá durar dois anos, até à conclusão da empreitada. De acordo com dados públicos dos contadores da EMEL, a ciclovia da Alameda das Linhas de Torres conta com cerca de 600-650 utilizadores diários. Não existem dados públicos sobre o fluxo pedonal, mas é substancial nesta zona.

No Porto, onde também decorrem obras de expansão do Metro, têm sido criadas alternativas cómodas e directas para peões e mesmo para ciclistas. Por exemplo, a expansão da rede na zona da Casa da Música levou à criação de uma alternativa à Avenida de França, feita de raiz ao lado do eixo original, com paragens de autocarro dignas, passeios confortáveis, saneamento e iluminação feitos de propósito e nem mesmo a ciclovia que existia naquela avenida foi esquecida – um dos passeios da avenida alternativa foi feito com mais largura para permitir a partilha entre peões e ciclistas. Em Lisboa, o Metro de Lisboa já tinha causado um grande embaraço à mobilidade pedonal na zona da Estrela, forçando os peões a dar uma grande volta para poucos metros, como contámos em Agosto.