Carlos Moedas apresentou a sua proposta de requalificação da Almirante Reis: um eixo verde com um corredor BUS contínuo do Martim Moniz para o Areeiro, duas a três vias de trânsito, uma ciclovia segregada, e ainda passeios confortáveis e acessíveis. Mais do que numa requalificação, o autarca fala numa “nova Almirante Reis”. A intervenção, que custará 21,5 milhões de euros, divide-se em duas fases e só ficará concluída lá para 2030.
Foi apresentada, esta terça-feira, 26 de Novembro, o resultado do processo participativo que a Câmara de Lisboa promoveu, no ano passado, sobre o Eixo da Almirante Reis. Esse resultado é uma proposta de requalificação não apenas da avenida ou da ciclovia, mas de todo o eixo entre o Areeiro e o Martim Moniz. A proposta, que se divide em dois troços e em duas fases de requalificação, deverá custar mais de 20,3 milhões de euros e só ficar totalmente pronta depois de 2030.
A proposta de requalificação, apresentada aos jornalistas pelo Presidente da Câmara, Carlos Moedas, na manhã desta terça-feira, procura implementar uma estrutura verde contínua desde o futuro jardim do Martim Moniz até à praça do Areeiro, integrar os vários modos de transporte viário, e garantir a segurança e o conforto na circulação a pé e de bicicleta. A intervenção, que abrangerá um eixo com cerca de 2,7 km de comprimento, envolve não apenas a Avenida Almirante Reis, mas todo o eixo desta artéria, incluindo a Rua da Palma e parte da envolvente, como a Alameda ou a Praça do Chile.
Carlos Moedas, Presidente da Câmara de Lisboa, lembrou que a ciclovia da Avenida Almirante Reis “foi uma questão que bipolarizou a sociedade” e que, “em vez de partidarizar esta questão”, “era necessário ouvir quem vivia na Almirante Reis e quem a usava, não só a ciclovia, mas também o fazia de carro, a pé, de transportes públicos”.
A Avenida Almirante Reis “não podia ficar como estava, esta foi a primeira conclusão da participação pública”, mas uma requalificação de fundo também “não podia passar por uma imposição partidária”, nem se podia “cometer os erros do passado, que foi colocar uma ciclovia pop-up de um dia para o outro”. “A Almirante Reis não é uma avenida qualquer, é uma avenida estrutural para a cidade”, realçou o autarca, referindo que a proposta de requalificação em cima da mesa é um “projecto bem pensado” e que vai arrancar com “medidas de mitigação” já em 2025. “Vamos mudar completamente. É uma nova Almirante Reis”, disse Moedas. “A Almirante Reis vai ficar como nunca viram. Vai ser algo absolutamente único.”
Dois troços, duas fases
No geral, entre o Martim Moniz e a Alameda, o Eixo passa de duas para três vias, sendo com uma via descendente (em direcção ao Martim Moniz) e duas ascendentes (em direcção ao Areeiro), sendo que a via ascendente mais à direita é exclusiva a transporte público (faixa BUS). Já entre a Alameda e o Areeiro, a Almirante Reis ganha quatro vias, duas das quais exclusivas a transporte público.
O canal ciclável passa do corredor central, que é eliminado, para os passeios, aproximando-o das fachadas e do comércio. Entre o Martim Moniz e a Praça do Chile, são propostas duas ciclovias unidireccionais, uma de cada lado da avenida, e a partir da Praça do Chile, a ciclovia muda para a configuração bidireccional, ligando-se ao troço já existente junto à rotunda do Areeiro. A pista ciclável é separada do passeio com a ajuda de mobiliário urbano e das esplanadas dos estabelecimentos, que deixam de estar próximas das fachadas. Ao longo de toda a avenida, são introduzidos passeios contínuos na maioria dos cruzamentos, e um corredor de pavimento pedonal confortável e acessível.
Olhando com mais detalhe, a requalificação proposta pela Câmara de Lisboa, na sequência do processo participativo realizado, divide o Eixo da Almirante Reis em dois troços:
Troço | Perfil | Ciclovia |
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Troço 1 – entre o Martim Moniz e a Praça do Chile | Um perfil composto por três vias: duas ascendentes, “para viabilizar a fluidez do trânsito”, sendo que uma das vias é um corredor BUS; e uma via descendente “para restringir o trânsito de acesso ao centro da cidade”, sendo essa via partilhada entre o transporte público e individual. Este perfil está “alinhado com a ZER (Zona de Emissões Reduzidas) para a Baixa Pombalina”, que a autarquia pretende implementar. | A pista ciclável é unidirecional e localiza-se em cada um dos passeios laterais, “respondendo às questões de segurança e permitindo uma melhor eficácia dos ciclos de semaforização (viária-ciclável-pedonal)”, indica a Câmara. “Esta opção também facilita o acesso às paragens de bicicletas e a ligação à rede ciclável envolvente e transversal ao eixo”; este primeiro troço |
Troço 2 – entre a Praça do Chile e o Areeiro (Praça Francisco de Sá Carneiro) | A proposta tem dois perfis distintos: as mesmas três vias entre a Praça do Chile e a Alameda; e quatro vias entre a Alameda e o Areeiro. Segundo a Câmara, “neste último troço revelou-se fundamental face aos volumes de tráfego entre a Alameda e o Areeiro, expressos no estudo de mobilidade efectuado em 2023”. | Entre a Praça do Chile e o Areeiro, a pista ciclável é bidireccional e acompanhará o passeio no lado nascente, juntamente com um novo alinhamento arbóreo. |
Por seu lado, a Vereadora do Urbanismo, Joana Almeida, destacou que a proposta agora apresentada resulta de um “trabalho minucioso” feito pela Direcção Municipal de Urbanismo e por outros serviços da Câmara de Lisboa, que responde a “todos os desejos da participação pública” e também à realidade da avenida, como o “grande volume de tráfego” que no Eixo da Almirante Reis se verifica sobretudo entre a Praça do Chile ou o Areeiro. Joana Almeida referiu a preocupação com a acessibilidade pedonal universal, que “hoje não está garantida”, ou com a arborização, sendo que “foram encontrados os locais onde é possível as árvores crescerem de forma saudável”, sem ficarem estranguladas pelo subsolo”. “Há toda uma nova preocupação também com a forma como as pessoas circulam no passeio, com pavimento confortável.”
Na apresentação do projecto, o Vereadora do Urbanismo referiu que “foi tudo planeado de metro a metro” e que os desenhos revelados têm já uma complexidade tal, fruto de o canal do Eixo da Almirante Reis ser “desafiante e complexo”. As imagens do antes e do depois mostram uma “vivência completamente diferente”. “Quando se investe em qualificação de espaço público há aqui um efeito posterior na reabilitação de edifícios e da cidade; por isso, o investimento neste eixo é muito importante”, observou Joana Almeida. “Garantimos que, passo a passo, a rede ciclável da cidade se vai estruturando.” “Conseguimos ter esta proposta de espaço público porque conseguimos retirar lugares de estacionamento”, criando novas opções em parques ao longo do eixo e também nos arruamentos laterais, “com toda uma nova organização”, disse ainda.
O Vice-Presidente da Câmara de Lisboa, Filipe Anacoreta Correia, acrescentou que “a forma como entendemos a mobilidade neste eixo” vai estar ligada ao “novo plano de mobilidade para a Baixa”, que deverá ser “anunciado no próximo ano”. Anacoreta Correia acrescentou que esse plano irá completar o “puzzle” que já tem o projecto do Martim Moniz e a nova proposta do Eixo da Almirante Reis.
Árvores em todo o eixo, sem estacionamento
Em todo o eixo será removido o separador central para acomodar os vários modos de transporte – viário, ciclável e pedonal. As áreas pedonais são alargadas, e uma estrutura contínua de árvores e arbustos será implantada ao longo da Almirante Reis. Serão plantadas cerca de 370 árvores, um aumento de 25% em relação ao número actual. “A plantação de árvores nas zonas pedonais promoverá um ambiente de sombra natural, especialmente numa área onde a ilha de calor é acentuada em comparação com as zonas circundantes”, indica a Câmara. “Esta sombra acolherá zonas de estar e esplanadas.”
Uma estrutura arbórea contínua torna-se possível porque é implantada fora dos limites dos actuais passeios, evitando assim o complexo sistema de infraestruturas subterrâneas existentes. Contudo, pontualmente, algumas destas infraestruturas impedem a plantação de árvores, como é o caso do passeio poente/sul da Rua da Palma. Nas áreas onde não for possível plantar árvores, serão plantados arbustos de médio porte, garantindo um sistema vegetal contínuo ao longo de todo o Eixo. Entre o Martim Moniz e a Praça do Chile, existirão árvores de cada lado do passeio; entre a Praça do Chile a o Areeiro, a arborização será mais reforçada do lado nascente.
As 295 tílias existentes hoje no corredor central da Almirante Reis serão transplantadas: 65 exemplares para um novo “Parque das Tílias” na Alameda, 20 para a envolvente da avenida, 30 para outras zonas da cidade (como o Bairro Padre Cruz, o Rio Seco e o Bairro da Boavista) e até 180 (nem todas poderão sobreviver à transplatação) ficarão na nova configuração do Eixo. Mas os novos alinhamentos arbóreos da Almirante Reis não irão incluir apenas parte das tílias transplantadas do separador central, mas também novas árvores, nomeadamente Pereiras de Jardim e Olaias, que prometem “criar variação ao longo do eixo, contribuindo para a identificação dos vários quarteirões”.
Para ser possível colocar mais árvores, criar mais zonas verdes e mais espaço pedonal, será eliminado o estacionamento automóvel ainda existente na Avenida Almirante Reis e Rua da Palma. No Eixo, vão manter-se apenas cerca de 180 lugares para cargas e descargas, tomada e largada de passageiros, e pessoas com mobilidade condicionada, bem como estacionamento para motas e bicicletas. Os 170 lugares de estacionamento automóvel que ainda existem hoje no Eixo da Almirante Reis vão ser transferidos para parques e para vias públicas na envolvente, sendo que vão ser criados mais 105 lugares. No total, serão criados na zona 275 lugares de estacionamento tarifado, onde residentes e comerciantes com dístico poderão estacionar, promete a autarquia.
A acessibilidade pedonal universal será garantida ao longo de todo o eixo. Junto às fachadas e nos dois passeios, será integrada uma faixa confortável para peões. Será aumentado o número de passadeiras, promovendo o atravessamento mais frequente da via. Ao longo de todo o eixo, serão criadas cinco áreas de acalmia de tráfego: o início da Rua da Palma, o Chafariz do Intendente, a Igreja dos Anjos, a Praça do Chile e a Alameda Afonso Henriques. Segundo a autarquia, “estas áreas constituem zonas pedonais de atravessamento importantes e abrigam equipamentos socialmente relevantes nas suas imediações, estabelecendo novas micro-centralidades que imprimem um novo ritmo espacial ao longo da avenida”.
No troço entre o Martim Moniz e a Praça do Chile, o novo perfil inclui de ambos os lados uma área pedonal com largura entre 3,50 e 4,00 metros, onde se implanta um corredor de circulação confortável com 1,70 metros e um espaço destinado a esplanadas e zonas de estar. Adjacente à área pedonal, localiza-se a ciclovia unidirecional com 1,40 metros de largura. Segue-se uma faixa verde de 2,20 metros com árvores e arbustos, intercalada com abrigos de transportes públicos e com lugares para cargas e descargas, tomadas de passageiros e pessoas com mobilidade condicionada.
Em todos os troços, as vias dedicadas ao transporte público são revestidas a pavimentação pétrea com calçada mista de cubos de calcário e granito. Esta medida estende-se às áreas de acalmia (início da Rua da Palma, Chafariz do Intendente, Igreja dos Anjos, Praça do Chile e Alameda Afonso Henriques), nas quais a pavimentação pétrea abrange toda a largura do eixo. O betuminoso a utilizar na restante parte da rodovia terá um grau de permeabilidade elevado e a uma caixa de drenagem que permitirá a retenção de água, arrefecendo a superfície em períodos de maior calor.
Para todo o eixo da Almirante Reis, propõe-se a substituição dos candeeiros de iluminação pública por um sistema de iluminação viária suspenso em cabos de aço fixos aos postes. Nestes postes, também serão colocadas luminárias pedonais orientadas para os passeios e para a pista ciclável, aumentando consideravelmente a segurança para os vários modos: viário, pedonal e ciclável.
20,3 milhões e só lá para 2030
A proposta agora apresentada foi desenvolvida depois de um extenso processo de participação pública, realizado em 2023 e no qual a Câmara de Lisboa ouviu as sugestões e preocupações da comunidade local. Mais de 2 200 pessoas responderam a um inquérito online, e 74 participaram por meio de caixas de participação, colocadas em locais estratégicos como as Juntas de Freguesia de Arroios e do Areeiro. Foram ainda promovidos seis “focus groups” com diferentes sectores sociais e profissionais, quatro “World Cafes” e uma actividade intitulada “Urbanista por um Dia”, onde cerca de 90 crianças e jovens das escolas da proximidade contribuíram com ideias para a zona.
No geral, os participantes destacaram várias prioridades, como o aumento de áreas verdes, a melhoria da higiene urbana e a segurança na ciclovia, sendo que muitos sugeriram a instalação de barreiras físicas para separar as ciclovias das vias de trânsito, além de iluminação adicional para os percursos cicláveis. A inclusão de áreas de descanso e de socialização ao longo da avenida também foi enfatizada, visando transformar a Almirante Reis numa zona mais acessível e agradável para a convivência social.
A segurança e a fluidez do trânsito foram também temas centrais nas preocupações expressas pela comunidade. Os cidadãos recomendaram uma gestão optimizada do tráfego para reduzir congestionamentos e melhorar a compatibilidade entre os diferentes modos de transporte, promovendo uma integração mais fluída entre transporte público, veículos particulares e bicicletas. Além disso, muitos propuseram alargar os passeios, criando espaços mais amplos para peões.
“Curto prazo” em 2025
No total, a obra deverá custar 20,3 milhões de euros, sendo que o primeiro troço está estimado em 12,6 milhões e o segundo troço em 7,6 milhões. A estes valores, é preciso somar 1,2 milhões para a elaboração do projecto de execução, de estudos mais detalhados e revisão do projecto. Por agora, existe apenas um estudo prévio. Recorde-se que o estudo prévio é um elemento que antecede a elaboração do projecto de execução, sendo, por isso, um desenho mais simples e ainda sujeito a aprofundamentos e afinações.
É expectativa da Câmara elaborar o projecto e estudos da primeira fase (troço entre o Martim Moniz e a Praça do Chile) entre 2025 e 2026, para lançar o concurso público no terceiro trimestre de 2026. A obra deverá arrancar só no início de 2027 e ficar concluída no final de 2028. A segunda fase (troço entre a Praça do Chile e o Areeiro) só deverá ir para obra no início de 2029, quando estiver concluída a primeira fase, e deverá ficar pronta por volta de 2030. Mais detalhes sobre o futuro do Eixo da Almirante Reis podem ser encontrados ici. Em 2025, vão ser introduzidas algumas “medidas mitigadoras” de “curto prazo” no Eixo da Almirante Reis, conforme podes ler aqui.