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Uma mini-floresta no Areeiro, porque não?

Um grupo de pessoas está a criar uma pequena floresta no Parque Urbano do Casal Vistoso, no Areeiro. Por agora, prepara-se o terreno para que, em Janeiro, possa arrancar a plantação. Estas mini-florestas urbanas podem ajudar as cidades na resposta à crise climática.

Fotografia de Lisboa Para Pessoas

Num sábado de manhã de Dezembro, um grupo de voluntários abre pequenas trincheiras para onde as águas da chuva poderão escorrer e se infiltrar no subsolo, alimentando um futuro ecossistema de fauna e flora. Estamos no Parque Urbano do Casal Vistoso, no Areeiro. Aqui está a nascer uma mini-floresta urbana. Sim, uma pequena floresta em plena cidade. A preparação desses caminhos para a água é apenas um primeiro passo.

“Estamos a preparar o terreno para em Janeiro fazer a florestação”, explica-nos António Alexandre. “Temos estado a abrir valas para promover a infiltração da água.” Se no mês de Dezembro água é algo que não tem faltado por Lisboa, devido à precipitação intensa que se tem feito sentir, “a gente sabe que não vai haver muita água no Verão e é importante que se desenhe os espaços para potenciar que a água se infiltre no subsolo”.

António sabe bem do que fala. É biólogo de formação, mas trabalha a educar pela sustentabilidade e pela permacultura, isto é, a arte de conciliar a Natureza com o desenvolvimento urbano. Em 2021, foi uma das pessoas responsáveis pela FCULresta, uma mini-floresta criada no campus da Faculdade de Ciências. Já neste ano de 2022 associou-se à Urbem, uma organização sem fins lucrativos, criada e sediada em Lisboa por uma gestora de negócios, Sasi Kandasamy, e que tem como intuito reconectar as pessoas com a Natureza nas grandes cidades. “Existe muita vontade de as pessoas mexerem na terra”, aponta António. No início de 2022, a Urbem criou a sua primeira mini-floresta numa encosta do Parque Urbano do Vale da Montanha. Agora, a poucos metros, no Parque Urbano do Casal Vistoso, inicia a plantação de outra floresta.

António (fotografia de Lisboa Para Pessoas)

Estas mini-florestas urbanas podem ajudar as cidades na sua resiliência às alterações climáticas – são uma resposta a problemas de que muito vamos ouvindo falar como as ondas de calor, a desflorestação, a perda de habitat e a impermeabilização dos solos. Na verdade, apesar de pequenas e de localizadas, estas florestas podem ser a casa de inúmeras plantas nativas e de várias espécies de fauna local, fortalecendo a biodiversidade nos centros urbanos, refrescando as nossas ruas e praças, e contribuindo para a infiltração da água.

Tanto a FCULresta como estas duas florestas da Urbem são criadas recorrendo a um método concebido pelo botânico japonês Akira Miyawaki e que permite crescer florestas naturais em espaços relativamente pequenos, como é o caso de parques urbanos. Seguindo esta técnica, propõe-se uma plantação muito densa de espécies nativas, sabendo-se de antemão que uma parte delas não vai sobreviver. “Aposta-se muito na diversidade das espécies que se planta, mesmo que no futuro só fiquem metade das espécies”, explica António.

O método Miyawaki é interessante porque um dos maiores problemas com a florestação convencional prende-se com o tempo que o crescimento destas árvores demora, e esse tempo não é compatível com a urgência de muitos dos desafios climáticos com que temos e teremos de lidar nas nossas cidades (e não só). Com este tipo de plantação de elevada densidade, consegue-se não só acelerar o crescimento de pequenas florestas mas também criar ecossistemas que serão auto-sustentáveis (isto é, sem necessidade de manutenção humana) em apenas três anos. Por outro lado, estima-se que uma floresta Miyawaki seja capaz de absorver quantidades maiores de carbono que uma floresta convencional.

Mas, “as florestas demoram sempre tempo a crescer, por mais que o método utilizado seja de criação de florestas rápidas”, aponta António. A primeira mini-floresta da Urbem, no Parque Urbano do Vale da Montanha, bem perto do sítio onde estamos, está ainda a crescer. A plantação decorreu entre Novembro de 2021 e o início de Fevereiro de 2022 numa área de cerca de 300 metros quadrados, semi-inclinada. Após a plantação, fez-se uma manutenção semanal do espaço com a renovação das ervas daninhas e a colocação de cobertura vegetal para manter o mais possível a humidade do solo. De três em três meses, é feita uma monitorização do terreno. É Filipe Gomes, biólogo e especialista em gestão ambiental, que está encarregue desta tarefa na Urbem. “É sempre expectável uma diminuição das plantas inicialmente colocadas, mas espera-se também uma estabilização ao fim de 2-3 anos”, aponta; ali, a sobrevivência terá sido na ordem dos 40-50% até agora.

A pequena floresta do Vale da Montanha está a precisar de nova manutenção, porque as ervas daninhas que cresceram com as últimas chuvadas tomaram conta do espaço. É para esse género de tarefas que a Urbem espera contar com a comunidade de pessoas da cidade. Em todas as fases de criação de uma mini-floresta, seja de preparação do terreno, de florestação ou de manutenção, a associação procura chamar voluntários. “Procuramos envolver as pessoas e envolvê-las o máximo tempo de possível, para que elas sintam estes espaços como delas”, explica António. “Quantas mais pessoas conseguirmos chamar, mais vamos conseguir reter como voluntários regulares”, acrescenta Filipe.

O intuito da Urbem não é só plantar florestas, mas que promover simultaneamente momentos educacionais e de encontro, onde as pessoas se possam envolver com a Natureza, aprender sobre biodiversidade e conhecer novas pessoas. A ideia é reunir comunidades em torno de cada floresta para que possam ser as pessoas locais, daquela zona ou daquele bairro, a cuidar desses espaços, que, por si só, precisam de pouca manutenção. António e Filipe reconhecem alguma dificuldade em mobilizar a cidade. Tem sido através da plataforma Meetup que a Urbem tem lançado os convites à população. Em dois fins-de-semana consecutivos de Dezembro, lançou-se o repto para ajuda na criação da mini-floresta no Casal Vistoso. Uma dezena de pessoas respondeu afirmativamente.

No sábado de manhã em que o Lisboa Para Pessoas acompanhou a Urbem, António ajudava e guiava duas voluntárias, de pá e enxada na mão, na abertura de caminhos para a água e em pequenas modelações de terreno. O plano para aquele terreno prevê diferentes secções de plantação, atravessados por canais onde a água se pode acumular e infiltrar-se. Estão previstos caminhos pedonais pelo meio da floresta porque a ideia é também permitir que as pessoas possam entrar e descobri-la por dentro. Haverá ainda pelo menos dois charcos temporários.

A proposta para a mini-floresta no Casal Vistoso (via Urbem)

A parcela de terreno no Parque Urbano do Casal Visto para a criação desta mini-floresta foi cedida à Urbem pela Câmara de Lisboa, no âmbito do projecto europeu Life Lungs Lisboa. “O plano é começar a plantação em Janeiro”, reforça António; e, por isso, ali a um canto já aguardam os sacos com a cobertura vegetal espalhada pelo terreno para preservar o máximo de humidade possível no solo para o crescimento das plantas. Depois da plantação, seguem-se fase de manutenção mais intensiva, de levantamento e mapeamento de todas as espécies e de monitorização trimestral.

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